Descrição de chapéu Coronavírus

Com restrições, Anvisa concede aval para a importação das vacinas Sputnik V e Covaxin

Agência aprova pedidos feitos por estados e Ministério da Saúde, mas limita quantidade inicial e determina estudos de acompanhamento e controle de qualidade de lotes

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Brasília e São Paulo

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) decidiu nesta sexta-feira (4) aprovar, de forma condicional e com restrições, novos pedidos de aval à importação de doses das vacinas contra a Covid Covaxin, da Índia, e Sputnik V, da Rússia.

A votação ocorreu por quatro votos a um nos dois casos. A medida —que abre espaço para a utilização dessas vacinas— ficará sujeita, porém, ao cumprimento de condições específicas e a uma quantidade inicial limitada de doses.

Entre as condições, está a realização de estudos extras de efetividade, entrega de novos dados pelos fornecedores, aprovação de lotes pelo INCQS (instituto que atua no controle de qualidade de produtos de saúde) antes da distribuição e restrição de uso a alguns públicos e a determinados centros de saúde.

A Anvisa diz ainda que o uso de ambas as vacinas pode ser suspenso em caso de novas avaliações da agência ou da OMS (Organização Mundial de Saúde) contrárias ao parecer atual.

A posição segue recomendação da área técnica da agência, que analisou dados apresentados nos pedidos para os dois imunizantes —desenvolvidos pelas empresas Bharat Biotech (no caso da Covaxin) e Instituto Gamaleya (Sputnik V).

As solicitações foram feitas pelo Ministério da Saúde e por seis estados. Inicialmente, os pedidos envolviam até 26,5 milhões de doses da Sputnik V e 20 milhões da Covaxin. Foram autorizadas, porém, importações equivalentes a 1% da população dos estados e do país —o equivalente, assim, a 928 mil doses da primeira vacina e 4 milhões da segunda, considerando duas doses.

Essa é a segunda vez que a agência se reúne para avaliar pedidos de aval excepcional à importação dessas vacinas.

Em março, a Anvisa negou um pedido de importação da Covaxin feito pelo Ministério da Saúde. Entre os motivos, estava a falta de dados mínimos exigidos para análise e de certificado de boas práticas de fabricação.

Parecer negativo também foi dado no fim de abril a pedidos feitos por dez estados para importar a Sputnik V. Na ocasião, porém, além da falta de dados, a agência apontou falhas técnicas em estudos e na produção da vacina que podem trazer riscos à segurança e qualidade do imunizante.

A avaliação, assim, foi alterada em parte nesta sexta (4), a partir do parecer de técnicos da agência.

Segundo o gerente-geral de medicamentos da Anvisa, Gustavo Mendes, a recomendação de condições à aprovação ocorreu como alternativa diante de incertezas que ainda existem nos dados.

"Não estamos atestando qualidade, segurança e eficácia dessas vacinas. Existem pendências técnicas que precisam ser resolvidas", afirmou.

"Contudo, a lei [14.124/2021, que abre espaço para importação excepcional] existe e foi pensada no contexto da pandemia, por isso há recomendação de que esse uso seja controlado."

Ele e outros técnicos da agência apresentaram dados e análise sobre os pedidos.

No caso da Sputnik V, as solicitações foram feitas por seis estados: Bahia, Maranhão, Sergipe, Ceará, Pernambuco e Piauí.

A diferença em relação à tentativa anterior de importação ocorreu com apresentação de uma cópia de relatório técnico emitido pelo Ministério da Saúde da Rússia sobre a aprovação do registro condicional da vacina no país.

Mendes diz que o relatório trouxe novos dados, mas ainda não respondeu a todas as dúvidas que foram levantadas na última análise —daí recomendar condições.

A principal dessas dúvidas era em relação à possível presença de adenovírus replicante na vacina, o que indicaria riscos à segurança do imunizante.

No desenvolvimento dessa vacina, o adenovírus (um vírus de resfriado comum) é modificado para apresentar parte do material genético do coronavírus Sars-CoV-2 e “desligado”, ou seja, ele não pode ser capaz de se replicar. Ao entrar em contato com o coronavírus, o corpo produz anticorpos e responde à presença do patógeno.

Segundo o Instituto Gamaleya, a Sputnik V é feita sem que haja essa presença de partículas virais replicantes. Já a agência diz ter recebido, na primeira análise, dados do próprio fabricante que apontavam o problema.

De acordo com Mendes, nos novos documentos, a especificação sobre a presença de adenovírus foi alterada, com redução nos valores que tinham sido inicialmente informados.

O relatório técnico russo afirma que é aceitável a presença no organismo em humanos de 33 a mil partículas de adenovírus replicante competente (RCA, na sigla em inglês) por dose. Mendes, porém, diz que os parâmetros para essa determinação não ficaram claros no relatório.

As incertezas ocorreram em outros pontos de análise. Neste sentido, o relatório aponta que a vacina tem eficácia de 91,6% para casos sintomáticos e 100% para casos graves. Também diz que a vacina apresenta bom perfil de segurança.

Ao mesmo tempo, porém, também deixa pontos pendentes, aponta o gerente.

O documento não apresenta, por exemplo, informações sobre a frequência de reações adversas relatadas. Também faltam informações sobre o desenho do estudo e avaliação dos resultados de eficácia e segurança. E embora afirme que o produto não contém impurezas, o relatório não traz informações sobre como ocorre seu controle.

A ausência de alguns dados também foi apontada pela equipe técnica em relação à vacina indiana Covaxin.

O novo pedido de importação dessa outra vacina foi feito pelo Ministério da Saúde na última terça (25). O objetivo era obter aval para distribuição de 20 milhões de doses.

O avanço em relação à tentativa anterior da pasta em obter aval ocorreu com apresentação de dados da Bharat Biotech que permitiram comprovar as condições de boas práticas de fabricação, o que pesou na análise.

Por outro lado, a equipe técnica encontrou outros pontos de "incertezas" , como o fato de que o estudo clínico de fase 3 —que confirma dados de segurança e verifica a eficácia—ainda não teve todos os dados apresentados, e não há informações completas da estabilidade da vacina.

Segundo os dados, a Covaxin teve a sua eficácia estimada com base em uma análise preliminar de 78% para casos leves e moderados de Covid-19 e de 100% contra casos graves. Os participantes, no entanto, foram avaliados por apenas 45 dias, tempo inferior ao preconizado pela OMS, de pelo menos dois meses.

IMPORTAÇÃO, MAS COM CONDIÇÕES

Diante da situação, a área técnica recomendou que fossem adotadas condições e restrições para aprovação para as duas vacinas. No caso da Sputnik, a proposta foi de que a vacina seja distribuída e utilizada em condições controladas "com condução de estudo de efetividade".

Outra é que os lotes que venham para uso no Brasil sejam aprovados pelo INCQS (Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde), por meio de análise em laboratório que demonstre ausência de adenovírus replicante.

Já para a Covaxin, a área técnica agência sugeriu que sejam apresentados dados clínicos extras de segurança e imunogenicidade. A aprovação do INCQS também seria necessária, mas para verificar outros critérios, como potência e qualidade.

Outras condições valeriam para ambos os imunizantes. É o caso de restrições na oferta a alguns públicos. Entre outros grupos, as vacinas não poderiam ser usadas por gestantes, lactantes, mulheres que desejam engravidar nos próximos 12 meses, pessoas com doenças graves ou não controladas ou aquelas que tenham histórico de reações ou hipersensibilidade a componentes da vacina. A indicação também seria limitada a adultos menores de 60 anos.

Os interessados na importação também devem fornecer os rótulos e bulas em português da vacina e são responsáveis por emitir notificações à Anvisa sobre quaisquer eventos adversos verificados com seu uso.

Estados e Ministério da Saúde também devem informar que as vacinas “não possuem avaliação da Anvisa quanto aos critérios de qualidade, eficácia e segurança”, tendo sido aprovadas com base em dados de outros países.

As condições foram então acolhidas por quatro dos cinco diretores da Anvisa.

Relator das duas propostas, o diretor Alex Campos frisou o risco de nova onda da Covid e a necessidade de acelerar a vacinação no país para votar a favor da importação 'condicional'. Ele reconheceu que há lacunas em dados, mas defendeu que os condicionantes permitam o uso das vacinas com proteção da população.

Segundo ele, o critério de sugerir a aprovação de um volume menor de doses do que o pedido ocorreu como forma de permitir que os critérios apontados sejam seguidos. A proposta de separar doses para 1% da população, diz, veio da própria agência, sem que tenha base em regras atuais. "Se fosse fazer isso em larga escala, não tinha controle", diz.

Campos também sugeriu que estados e ministério assinem um termo de compromisso para uso das doses.

Já a diretora Cristiane Jourdan defendeu, em análise, a não aprovação. "Ainda que sejam estabelecidos condicionantes, penso que as incertezas superam quaisquer medidas que tenham intuito de mitigar riscos", disse.

Outros três diretores —Meiruze Freitas, Romison Mota e Antonio Barra Torres— votaram em conjunto com o relator.

O argumento foi de que outras vacinas aprovadas no mundo também foram alvo de condições e que a medida permite acesso a vacinas.

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