Descrição de chapéu The New York Times

Saiba o que é fibrilação atrial, problema cardíaco comum e fácil de ignorar

Doença pode ser tratada com remédios, com choques ao coração ou com ablação

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Jane E. Brody
The New York Times

​Ned Hallick, especialista em iluminação acostumado a carregar equipamento pesado, tinha 63 anos quando percebeu pela primeira vez que estava sofrendo acessos de tontura ocasionais. E um dia, me contou Hallick, que vive no Brooklyn (Nova York), “fiquei tão exausto que subir as escadarias do metrô se parecia com escalar uma montanha”.

O clínico geral que o atendeu, suspeitando de um problema cardíaco, pediu diversos exames, entre os quais um eletrocardiograma, e com base nos resultados o encaminhou a um cardiologista. O diagnóstico: fibrilação atrial (FA), a mais comum das arritmias cardíacas.

Na FA, os átrios, as duas câmaras superiores do coração, batem rápida e caoticamente, fora de sincronia com os ventrículos, as câmaras de bombeamento da parte inferior do coração, responsáveis por promover a circulação do sangue pelo corpo. Os ventrículos podem então ser incapazes de bombear sangue suficiente para atender às necessidades do corpo, resultando em circulação lenta, fadiga e falta de fôlego.

Médicos realizam uma cirurgia de correção de arritmia cardíaca - Leonardo Wen - 21.mar.2007/Folhapress

A FA afeta cerca de 3 milhões de adultos nos Estados Unidos, número que deve quadruplicar nos próximos dez anos à medida que a população envelhece e fatores de risco como obesidade, diabetes e pressão alta se tornam ainda mais comuns. O risco de desenvolver FA ao longo da vida é superior a 20%, e no entanto muita gente nem sabe que tem o problema.

Diagnóstico correto e tratamento imediato, porém, podem salvar vidas. Em um relatório publicado pelo The New England Journal of Medicine em janeiro, os médicos William Stevens e Gregory Michaud, cardiologistas do Centro Médico da Universidade Vanderbilt, escreveram que a FA sem tratamento pode elevar o risco de derrames em 400% nos homens e 600% nas mulheres, e pode elevar o risco de insuficiência cardíaca em 300% e 1.100%, respectivamente.

A FA também está associada à demência, provavelmente como resultado de derrames e de circulação prejudicada no cérebro causada pelo ritmo cardíaco anormal. A condição é direta ou indiretamente responsável por mais de 158 mil mortes por ano nos Estados Unidos.

Como determinar se você tem FA

As pessoas afetadas podem sentir o coração disparar ou seu batimento oscilar, periodicamente, por alguns minutos, ou sentir episódios ocasionais de falta de respiração, tontura ou fadiga exagerada em caso de esforço. Os sintomas podem ser deflagrados por consumo excessivo de álcool ou cafeína. Em algumas pessoas que têm FA, o ritmo cardíaco anormal é intermitente, e em outras ele é persistente e o coração é incapaz de restaurar um ritmo normal se não receber tratamento.

Infelizmente, muitas pessoas que têm FA, entre as quais Hallick, ignoram os sintomas, especialmente quando eles desaparecem sem intervenção.

Um médico pode realizar um eletrocardiograma ou um teste cardíaco em esteira rolante, ou a pessoa pode usar um monitor cardíaco portátil por algumas semanas a fim de procurar por ritmos cardíacos anormais, para confirmar um diagnóstico de FA. Testes como esses podem ajudar a distinguir a FA de outras condições menos sérias e igualmente capazes de causar oscilação do ritmo cardíaco, como ansiedade e estresse.

Como a FA é tratada?

Se a fibrilação atrial for confirmada, o médico pode tentar usar choques elétricos para recolocar o coração no ritmo normal, usando um procedimento conhecido como cardioversão elétrica, no qual uma corrente elétrica é aplicada no peito do paciente, que receberá anestesia para o procedimento e não sentirá os choques.

Em prazo mais longo, a maioria dos pacientes de FA podem ser tratados de forma efetiva e segura por meio de medicação, em geral remédios conhecidos como betabloqueadores e bloqueadores dos canais de cálcio, que ajudam o coração a sustentar um ritmo normal. Os pacientes também recebem um anticoagulante a fim de prevenir coágulos sanguíneos.

Médicos conduzem paciente com arritmia cardíaca para a UTI coronariana - Marlene Bergamo - 9.out.2009/Folhapress

Diversos anticoagulantes populares no momento, como o Xarelto (rivaroxabana), usado por Hallick, têm efeitos anticoagulantes persistentes mesmo que o paciente perca uma dose ou duas de medicação, o que pode ajudar a evitar derrames.

Esses anticoagulantes tampouco requerem monitoração atenta e constante de seus efeitos sobre a coagulação, ao contrário de seu predecessor, o Coumadin (varfarina), que foi por muitos anos o principal anticoagulante usado no tratamento de FA. O Coumadin tinha uma vantagem importante sobre os remédios mais novos, que era a reversão quase imediata de seus efeitos anticoagulantes quando um paciente precisava parar de usar o remédio para prevenir sangramento excessivo, por exemplo depois de uma cirurgia ou de uma ferida com sangramento.

Os remédios usados para a FA podem parar de funcionar?

Sim. Foi o que aconteceu com Hallick. Ele se saiu bem com os medicamentos por sete anos, até maio, quando um exame de rotina revelou que, sem que ele percebesse, a FA havia retornado e seu coração estava batendo 165 vezes por minuto, o dobro do ritmo normal.

“Eu vinha sofrendo de um pouco de falta de fôlego, e encontrando mais dificuldade para caminhar em subidas, mas não levei em conta”, ele disse. “Achei que fosse porque agora tenho 70 anos e estava bem fora de forma por causa da pandemia.”

Uma mudança de medicação e dois choques elétricos para tentar restaurar o ritmo cardíaco normal só ajudaram por pouco tempo, e Hallick acaba de passar por um procedimento que promete benefício mais duradouro: a destruição das células na parede traseira do átrio esquerdo de seu coração, que estavam transmitindo sinais errados aos ventrículos. O procedimento, chamado ablação, envolve inserir um cateter por uma veia até chegar ao átrio, e lá ou queimar ou congelar as células que estão funcionando mal.

Qual é a eficiência da ablação no tratamento da FA?

Testes controlados mostraram que, com o tempo, a ablação é significativamente mais efetiva do que o tratamento com medicamentos, para corrigir a FA. Em um estudo recente com 203 pacientes, a ablação preveniu com sucesso a fibrilação atrial em cerca de 75% dos participantes de um grupo, por um ano, enquanto a terapia com medicamentos só beneficiou 45% dos pacientes do segundo grupo. Em pessoas de outro modo saudáveis, como Hallick, a ablação pode muitas vezes ser realizada fora do hospital, e seguida por alguns dias de limitação de atividade enquanto o coração se cura da inflamação resultante.

Stevenson, da Universidade Vanderbilt (EUA), disse que alguns pacientes de FA persistente preferem passar por ablação do que tomar remédios continuamente, já que eles podem causar problemas de sangramento ou outros efeitos colaterais. Por outro lado, o benefício da ablação às vezes demora a se manifestar. Nos primeiros meses depois da ablação, ele disse, cerca de metade dos pacientes experimentam ritmos cardíacos anormais que podem requerer choque ou tratamento com remédios até que o coração se recupere plenamente do procedimento.

Há novos tratamentos para a FA no horizonte?

Hallick está participando de um teste clínico de um procedimento novo e presumivelmente mais seguro chamado ablação de campo pulsado, que destrói as células errantes usando impulsos elétricos para abrir buracos nelas. A ideia é de que o procedimento seja mais rápido do que outras técnicas de ablação como o congelamento ou a cauterização, e tenha menor probabilidade de causar danos ao esôfago, que fica ao lado do átrio.

A nova técnica, cujo nome comercial é Farapulse, foi aprovada para uso na Europa em janeiro mas ainda não foi licenciada pela Food and Drug Administration (FDA), a agência americana de fiscalização e regulamentação de alimentos e remédios. Está sendo avaliada em um teste clínico que envolve pelo menos 350 pacientes em mais de 30 centros médicos americanos, entre os quais o Mount Sinai Health System, de Nova York.

“Se vai haver uma mudança, precisamos provar que a ablação por campo pulsado é claramente melhor e mais segura do que os métodos que usamos agora”, disse Stevenson.

Mais detalhes sobre esse e outros estudos estão disponíveis em clinicaltrials.gov.

Tradução de Paulo Migliacci

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