Uma dose da vacina da Janssen pode ser ineficaz contra variante delta do coronavírus, diz estudo

Pesquisa, porém, ainda não foi publicada em jornal científico; empresa contesta dados

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Apoorva Mandavilli
The New York Times

A vacina contra a Covid-19 feita pela Janssen (braço farmacêutico da Johnson & Johnson) é muito menos eficaz contra as variantes delta e lambda do que contra a cepa original do vírus, segundo um novo estudo publicado online na terça-feira (20).

A conclusão tem base em experimentos que usam amostras de sangue em laboratório para medir a produção de anticorpos, mas podem não refletir a performance da vacina no mundo real.

As conclusões se acrescentam a evidências de que milhões de pessoas inoculadas com a vacina da Janssen talvez precisem receber uma segunda dosepreferivelmente de uma das vacinas de mRNA fabricadas pela Pfizer/BioNTech ou a Moderna, afirmam os autores da pesquisa.

As conclusões, porém, não confirmam as de estudos menores publicados pela Johnson & Johnson no início deste mês, que sugerem que uma única dose da vacina é eficaz contra a variante mesmo oito meses após a inoculação.

O novo estudo ainda não foi revisado por pares nem publicado em um jornal científico e se baseia em experimentos em laboratório. Mas é consistente com observações de que uma única dose da vacina AstraZeneca —que tem tecnologia semelhante à da Janssen— mostra eficácia de apenas 33% contra a doença sintomática causada pela variante delta.

"A mensagem que queríamos passar não é que as pessoas não devem tomar a vacina da Janssen, mas esperamos que no futuro ela seja reforçada com mais uma dose dela própria ou uma da Pfizer ou da Moderna", disse Nathaniel Landau, virologista na Escola de Medicina Grossman da Universidade de Nova York, que liderou o estudo.

Outros especialistas disseram que os resultados foram os esperados porque todas as vacinas parecem funcionar melhor quando dadas em duas doses. "Eu sempre pensei, e disse várias vezes, que a vacina da Janssen é uma vacina de duas doses", disse John Moore, especialista em vírus na Weill Cornell Medicine em Nova York.

Moore indicou vários estudos com macacos e pessoas que mostraram maior eficácia com duas doses da vacina, comparadas com uma só dose. Ele disse que o novo estudo tem credibilidade porque foi publicado por uma equipe sem ligações com os fabricantes de vacinas.

No entanto, os dados do novo estudo "não falam sobre a natureza completa da proteção imune", disse Seema Kumar, porta-voz da Johnson & Johnson. Estudos patrocinados pela empresa indicam que a vacina "gerou atividade forte e persistente contra a variante delta de rápida disseminação", disse.

A variante delta é a versão mais contagiosa até agora do coronavírus. Ela representa 83% das infecções nos Estados Unidos, segundo Rochelle Walensky, diretora do CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças), em audiência no Senado nesta semana.

A variante também pode ser a principal responsável pelo aumento recente das infecções. Embora ainda estejam relativamente baixos em comparação com o último inverno, os casos estão aumentando nos 50 estados americanos, e as internações sobem em quase todos. Nas duas semanas que terminaram na terça (20), o país teve em média 268 mortes por dia.

A delta pode causar mais infecções graves que formas anteriores do vírus, mas mais de 99% das internações e mortes estão ocorrendo entre pessoas não vacinadas. Os índices de imunização no país estacionaram nos EUA, com pouco menos de 60% dos adultos totalmente protegidos contra o vírus.

Diversos estudos sugeriram que as vacinas de mRNA feitas pela Pfizer/BioNTech e a Moderna manterão sua eficácia contra o coronavírus, incluindo todas as variantes identificadas até agora. Um estudo recente mostrou, por exemplo, que as vacinas provocam uma reação imune persistente no corpo, capaz de proteger contra o coronavírus durante anos.

Mas a evidência sobre a vacina da Janssen foi limitada, porque ela foi desenvolvida depois das vacinas de mRNA. A maioria dos estudos de eficácia das vacinas contra coronavírus foram conduzidos em centros médicos e hospitais que contaram com amostras de funcionários que receberam vacinas de mRNA.

A vacina da Janssen também foi criticada após relatos de coágulos sanguíneos e uma rara síndrome neurológica, assim como problemas de contaminação em uma fábrica em Baltimore.

Pequenos estudos publicados por pesquisadores afiliados à Johnson & Johnson sugeriram que a vacina era apenas ligeiramente menos eficaz contra a variante delta do que contra o vírus original, e que os anticorpos estimulados pela vacina se fortaleciam em oito meses.

A equipe de Landau provavelmente teria visto um aumento semelhante na potência da vacina se tivesse examinado os dados ao longo do tempo, disse Dan Barouch, virologista no Centro Médico Beth Israel Deaconess, em Boston. Os dados sobre a força da vacina da Janssen contra a variante delta no 29º dia não é muito diferente dos relatados em seu próprio estudo, disse Barouch.

"Não vejo qualquer discordância", disse ele. "A questão é de cinética, não apenas de magnitude, porque as reações imunes não são estáticas ao longo do tempo." O novo estudo também não considerou outros componentes da defesa imune, acrescentou ele.

Landau e seus colegas examinaram amostras de sangue de 17 pessoas que tinham sido imunizadas com duas doses da vacina de mRNA e dez pessoas com uma dose da vacina da Janssen.

A da Janssen começou com uma eficácia menor que as vacinas de mRNA e mostrou uma queda maior da eficácia contra as variantes delta e lambda. "A base mais baixa significa que o que resta para atacar a delta é muito fraco", disse Moore. "Essa é uma preocupação substancial."

Poucas vacinas são dadas em uma única dose, porque a segunda é necessária para ampliar os níveis de anticorpos, disse Akiko Iwasaki, imunologista na Universidade Yale. As pessoas que foram inoculadas com a vacina da Janssen "estão contando com a reação primária para manter altos níveis de anticorpos, o que é difícil, especialmente contra as variantes", disse ela.

Reforçar a imunidade com uma segunda dose deveria aumentar os níveis de anticorpos o suficiente para reagir às variantes, acrescentou.

Recorrer a uma vacina de mRNA para a segunda dose, e não a outra dose da Jassen, talvez seja melhor: vários estudos mostraram que combinar uma dose da AstraZeneca com uma dose da Pfizer-BioNTech ou Moderna aumenta a reação imune com maior eficácia do que duas doses da AstraZeneca.

A FDA (agência de alimentos e drogas dos EUA) disse que "os americanos que foram totalmente vacinados não precisam de dose de reforço neste momento", e a agência não deverá mudar sua recomendação com base em estudos de laboratório.

Para Landau, porém, os novos dados devem levar a FDA a rever suas recomendações. "Espero que eles leiam nosso trabalho e pensem a respeito."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.