Descrição de chapéu Coronavírus

Após fim de exigência, Duque de Caxias (RJ) está dividida sobre uso de máscara contra Covid

Parte dos moradores critica o decreto do prefeito que acabou com a obrigação, enquanto outros dizem que já não utilizavam o item

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Rio de Janeiro

Um dia após a Prefeitura de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, desobrigar o uso de máscaras de proteção contra a Covid-19, inclusive em espaços fechados, grande parte das pessoas que circulavam pelo centro da cidade nesta quarta-feira (6) ainda utilizava o equipamento.

A reportagem esteve na tarde desta quarta no calçadão de Caxias, um dos locais mais movimentados do município. Ao menos oito pessoas afirmaram que discordam da decisão do prefeito Washington Reis (MDB), por considerá-la precipitada.

A maioria dos que andavam sem máscara e foram abordados pela Folha disse que não a estava utilizando naquele momento por um descuido. Outros seis transeuntes contaram que já não usavam o equipamento, independentemente do decreto. À reportagem, diversos passantes disseram ainda que haviam acabado de saber da decisão da prefeitura.

Movimentação no calçadão de Duque de Caxias (RJ), um dia após a prefeitura desobrigar o uso de máscaras - Tércio Teixeira/Folhapress

A estudante Ana Cristina Silva, 21, afirmou que o decreto "é uma palhaçada". "[O prefeito] pensou só nele. É muito cedo, ainda tem gente morrendo", disse. Sua mãe, Creonice Silva, 62, afirmou que a prefeitura deveria, ao menos, ter esperado todos os idosos tomarem a dose de reforço.

Mesmo com a mudança na norma, o vendedor Valmir Silva, 52, usava nesta quarta não só uma máscara, mas também um face shield (espécie de viseira de material transparente, que faz um "escudo" em torno do rosto), por ainda ter medo de pegar o vírus. "Acho que o povo vai continuar usando porque a doença é muito séria, muito grave", disse.

Segundo o vacinômetro estadual, 55% da população de Caxias foram vacinados com uma dose ou com a dose única. Apenas 30% dos moradores já estão totalmente imunizados.

Em nota, a prefeitura afirmou que houve atraso no registro das vacinas aplicadas em razão de dificuldades como "número insuficiente de digitadores e falhas na internet". De acordo com a gestão, 71% da população foram vacinados com a primeira dose, e 47,5%, com a segunda.

A cobertura vacinal atingida na cidade e "os índices de casos em constante queda", como registram em nota, embasaram a decisão da prefeitura de desobrigar o uso de máscara. A liberação, no entanto, não vale para "pessoa que se encontre infectada ou com suspeita de estar contaminada com o coronavírus durante o período de transmissão", informam.

A dona de casa Solange Mariano, 61, que vestia uma camisa com os dizeres "Vacina sim", considerou absurda a decisão que tirou a obrigação do uso da máscara na cidade. "Ainda é cedo, se não a gente não se liberta dessa doença. Vai botar tudo a perder."

Edvaldo Rodrigues, 41, funcionário de uma banca de jornais na região, porém, diz não ter usado máscara desde o início da pandemia. Questionado se ficava desconfortável com o item, respondeu: "Quem não se sente?".

Rodrigues já foi contaminado, mas afirmou que só teve "perda do olfato e do paladar". Ele tomou a primeira dose da vacina. A segunda, no entanto, conta que não tomará —desrespeitando as orientações dos especialistas, uma vez que a proteção completa só existe após completar o esquema.

"Me deu bastante reação, fiquei pior do que quando peguei Covid. Se fosse só eu que faltasse, garanto que eu iria lá tomar", afirmou.

A vendedora Ana Cristina de Alcides, 26, também disse que ficou feliz com a determinação da prefeitura. "Para mim é ótimo, me sinto sufocada, não aguento mais. Graças a Deus. Sempre estive sem máscara e não peguei Covid."

Ela contou que seu marido, porém, não teve a mesma sorte —foi infectado e quase morreu. Questionada se não tem medo de adoecer, Ana Cristina disse: "Tenho medo, mas tenho mais medo de morrer sufocada com essa máscara".

O vendedor Francisco Graça, 70, é outro que não utiliza máscara, mas vende o item há alguns meses por R$ 1 a unidade. Ele afirmou que nesta quarta-feira o movimento estava mais lento. Evangélico, Graça disse que também não tomou a vacina porque não fica doente: "Jesus me protege".

Duque de Caxias foi uma das cidades do Rio de Janeiro mais atingidas pela pandemia no ano passado.

Logo após a confirmação do primeiro caso, o prefeito Washington Reis afirmou que as igrejas evangélicas ficariam abertas porque a cura do novo coronavírus viria de lá.

Contaminado duas vezes pelo vírus, Reis buscou a cura não nas igrejas, mas em hospitais particulares da zona sul do Rio de Janeiro, onde ficou internado. Bolsonarista, o prefeito pretende conquistar uma cadeira no Senado em 2022.

Em maio de 2020, a disseminação da Covid já havia explodido no município, que à época figurava como o segundo do estado com o maior número de casos e óbitos. Hoje a letalidade na cidade é de 6,5%, acima da média nacional, de 2,8%.

No início da pandemia, Caxias foi a última cidade da Baixada a fechar o comércio. Ainda assim, mesmo após o decreto da prefeitura, diversos estabelecimentos seguiram funcionando. Em alguns casos, sob ordens da milícia, que continuou a extorquir os comerciantes com a cobrança de suas “taxas de segurança”.

A vacinação na cidade foi marcada por longas filas, interrupções e intervenções do Ministério Público, que pedia a organização da imunização de acordo com os grupos prioritários do PNI (Plano Nacional de Imunização). O município chegou a determinar que profissionais da educação acima de 60 anos tivessem prioridade diante dos demais idosos.

Em março deste ano, a prefeitura provocou filas quilométricas após prometer vacinas a toda a população acima dos 60 anos. Sem doses suficientes, muitos voltaram para casa sem a injeção.

O prefeito admitiu que o município só tinha 6.100 doses, mas decidiu ofertar a aplicação para uma população que soma, segundo ele, 100 mil idosos —o último censo do IBGE, de 2010, fala em 86 mil pessoas acima de 60 anos, e 76 mil pessoas entre 60 e 79 anos. Ele, no entanto, não demonstrou ver problema nisso.

"Nós madrugamos, distribuímos as senhas, divulgamos bem. São nove pontos de vacinação aqui no quarto distrito para diminuir a aglomeração e nós vamos seguir para os bairros. O que eu não admito é a vacina ficar guardada na geladeira", respondeu à época quando questionado sobre o transtorno na logística pelo programa "Bom Dia Rio", da TV Globo.​

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