Terra Yanomami fica com auxílio médico limitado por atraso de pagamentos do Ministério da Saúde

Medida afeta 28 mil indígenas; empresa de transporte aéreo fazia voos diários com enfermeiros, médicos, pacientes e insumos

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Cuiabá

Por atrasos no pagamento do Ministério da Saúde, a empresa de transporte aéreo Voare suspendeu nesta segunda-feira (1º) todos os voos regulares para atender ao Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Yanomami. A interrupção coloca em risco a saúde de cerca de 28 mil indígenas entre os estados de Roraima e do Amazonas.

"A partir de hoje, estamos apenas atendendo casos de UTI aérea", afirma o proprietário da empresa, Renildo Lima.

Com 9,6 milhões de hectares (equivalente a Santa Catarina), a Terra Indígena Yanomami é a maior do país. Quase todas as comunidades só são acessíveis por via área. Em média, a Voare fazia 30 voos diários, de avião e de helicóptero, e transportava cerca de 95 pessoas, entre enfermeiros, médicos e pacientes, além de insumos, como vacinas. As operações são realizadas por meio de 120 pistas de pouso.

A Voare cobra uma dívida de R$ 3,9 milhões, referentes a 2019, e outra de R$ 2 milhões, de serviços prestados neste ano. No caso mais recente, o total de horas previsto para seis meses foi usado em três meses pelo Dsei, o que dificultaria ainda mais o pagamento, relata a empresa.

O Ministério da Saúde informou que pagará até sexta-feira (5) a dívida antiga de R$ 3,9 milhões e negou atraso no pagamento do contrato deste ano.

A interrupção dos voos ocorre no momento em que a saúde yanomami enfrenta uma grave crise, com aumento de casos de desnutrição infantil e de malária falciparum, a mais letal. Funcionários da saúde têm relatado falta de condições de trabalho, de medicamentos e problemas de saúde relacionados à explosão da presença de garimpeiros, estimulados pelo aumento no preço do ouro e pelas promessas de regularização do governo Jair Bolsonaro (sem partido).

Criança, com costelas aparentes, deitada em rede
Com quadro de verminose e malária, criança yanomami dorme em rede na aldeia Maimasi, perto da Missão Catrimani, na Terra Indígena Yanomami, em Roraima - Divulgação

"Desde 2018, acabaram os contratos com licitação pública e validade de cinco anos. Atendemos por meio de licitação emergencial de seis meses em seis meses. Como é emergencial, não tem a quantidade de recursos alocados para as empresas e para o Dsei", afirma o proprietário da Voare.

"Há seis meses, houve uma licitação em nível nacional, para todo os Dseis, mas as empresas nunca foram chamadas", disse. "A gente não entende por que as empresas não são chamadas para acabar com o problema de [contrato] emergencial", completou.

Lima afirma que enviou uma carta há 15 dias à Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) avisando de que a empresa deixaria de voar por falta de pagamento.

"Como não tem processo licitatório, temos de ficar nos humilhando para eles pagarem. Tem de ir para todos os órgãos fiscalizadores, passar por todos os critérios", afirma. "Não temos segurança jurídica para pagar."

Procurado pela Folha, o Dsei Yanomami informou, por meio da coordenação, que o serviço aéreo continua sendo prestado, "embora com alguns atrasos", e que irá se reunir com a Voare. A empresa, no entanto, disse à reportagem que só realizou dois voos emergenciais nesta segunda-feira. Funcionários do Dsei confirmaram a paralisação dos voos, e alguns não puderam voltar do trabalho de campo no dia previsto.

A reportagem foi atualizada na noite de terça-feira (2) com informações do Ministério da Saúde enviadas depois da publicação original.

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