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Risco de Covid sobe 6 meses após Coronavac, mesmo em jovens, mostra estudo

Nova pesquisa da Fiocruz reforça necessidade de dose adicional a partir dos 18 anos

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São Paulo

As duas doses da vacina Coronavac podem proteger contra hospitalização e óbito por Covid, mas, passados seis meses da imunização, o risco de contrair a doença aumenta consideravelmente em indivíduos mais jovens, com idades entre 18 e 39 anos.

A chance de ter Covid sintomática é quase três vezes maior nessa faixa etária, quando comparada a outras.

Tal risco começa a surgir já a partir de três meses da vacinação primária com o imunizante, isto é, após o recebimento da segunda dose.

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Frasco da vacina Coronavac - Karime Xavier - 24.jun.21/Folhapress

Esses são os principais resultados de um estudo conduzido por pesquisadores da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) em parceria com diversas instituições de pesquisa nacionais e do exterior, como o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e a Universidade da Flórida.

O artigo no formato pré-print, ou seja, ainda sem avaliação de pares, foi divulgado na última sexta (24) na plataforma medRxiv.

A pesquisa analisou 37.929 dados pareados de pessoas vacinadas e que realizaram exame de RT-PCR no estado de São Paulo de 17 de janeiro (quando teve início a vacinação no Brasil, com a Coronavac) a 30 de setembro de 2021.

Para cada par, um indivíduo apresentou exame RT-PCR positivo até dez dias após o início dos sintomas e o outro era um exame negativo (funcionando assim como controle).

Com os pares entre casos positivos e controles formados, os pesquisadores buscaram entender qual era a razão de risco (odds ratio, em inglês) de contrair Covid sintomática ao longo do tempo nas diferentes faixas etárias (18 a 39 anos, 40 a 64, 65 a 79 e 80 ou mais) e por risco de profissão (profissionais da área da saúde ou não).

O observado foi que, passados 40 dias após a segunda dose, o risco dos indivíduos com 18 a 39 anos ou dos trabalhadores da área da saúde aumentava com o tempo, e sobretudo após 182 dias.

Inicialmente, o risco era de 1,45 para indivíduos mais jovens, passando para 3,87 de cinco a seis meses após a segunda dose (aumento de 2,7 vezes).

No caso dos profissionais da área da saúde, em grande maioria formados por pessoas com idade abaixo de 65 anos, o risco de contrair a doença pelos mais velhos já era reduzido e, portanto, não foi significativo.

Nas outras faixas etárias, o risco passou de 1,49, em trabalhadores com idade entre 18 a 39 anos, para 4,48 seis meses após a segunda dose (ou 3 vezes mais); e de 1,26, no caso daqueles com 40 a 64 anos, para 3,53 após seis meses da segunda dose (2,8 vezes maior).

Para o pesquisador da Fiocruz Julio Croda, que coordenou o estudo, o trabalho indica que mesmo os jovens que não são trabalhadores da área da saúde possuem um risco elevado de adoecimento da Covid com o passar do tempo.

Há duas hipóteses levantadas para isso, explica o médico. A primeira seria de maior exposição desse grupo a eventos que causem aglomeração, como festas em bares e casas noturnas. Quanto maior exposição, maior o risco de contrair a doença, mesmo em indivíduos vacinados.

"A segunda hipótese para esse risco aumentado nos adultos pode ser porque a efetividade da Coronavac, e não só dela, como mostramos no nosso primeiro estudo, mas de todas as vacinas, é menor conforme aumenta a idade", diz.

"Portanto, nos idosos, por já possuírem uma proteção menor oferecida pelas vacinas, o risco observado de contraírem a doença em relação ao tempo não vai mudar tanto assim, diferente dos indivíduos mais jovens, em que esse aumento é mais acentuado", completa.

O estudo é o primeiro a dar embasamento científico para a necessidade de uma dose de reforço para todos os indivíduos com mais de 18 anos que tomaram as duas doses da Coronavac. Recentemente, a OMS recomendou uma dose extra em todos os indivíduos com mais de 60 anos que receberam o imunizante.

Esses novos dados com mais de 39 mil pacientes do Brasil indicam a necessidade de aplicar uma terceira dose do imunizante ou de qualquer outro passados quatro meses da vacinação primária, para diminuir a propagação da doença, afirma o pesquisador.

"A força de infecção, como nós chamamos, está condicionada à menor efetividade das vacinas para doença sintomática, observada em diversos estudos, inclusive nos ensaios clínicos [onde a Coronavac teve eficácia de 50,38%], então no contexto de uma nova variante como a ômicron, se torna ainda mais necessária a dose de reforço", afirma Croda.

Em termos de efetividade da vacina, o pesquisador explica que não foi possível calcular o nível de proteção do imunizante nos diferentes grupos com o passar do tempo porque para isso seria necessário incluir indivíduos não vacinados.

Em nota enviada à Folha para comentar o estudo, o Instituto Butantan afirmou que a queda dos anticorpos seis meses após concluído o esquema vacinal contra a Covid-19 é um fato cientificamente comprovado sobre a vacinação em todas as suas tecnologias (vírus inativado, vetor viral ou RNA mensageiro).

"Prova disso é que o mundo inteiro realiza a vacinação da dose de reforço após seis meses do esquema vacinal completo e em todas as faixas etárias", disse o texto.

"É importante ressaltar que a queda na imunidade não diz respeito à faixa etária ou à vacina utilizada, e sim à característica do vírus Sars-CoV-2, que exige um reforço vacinal. Vale lembrar ainda que o Projeto S, realizado em Serrana [interior de São Paulo], comprovou que a imunização com Coronavac foi mais eficiente na população acima de 60 anos, que é mais vulnerável dentre as demais faixas etárias", completa a nota.

Apesar de ter limitações, como não ter conseguido avaliar quais as variantes que causaram as infecções durante o período observado, o novo estudo da Fiocruz é importante por fornecer dados de como a Coronavac impede a hospitalização e óbito ao longo do tempo, mas não a infecção sintomática —o que serve de alerta não só ao Brasil.

"A Coronavac é a vacina mais utilizada no mundo, com mais de 2 bilhões de doses aplicadas. E apesar de no Brasil a antecipação da dose de reforço [de cinco para quatro meses] já ter sido implementada como política pública mesmo sem ter evidências suficientes à época, outros países ainda não adotaram essa medida, então é um dado que pode servir como embasamento para esta ação nestes locais", diz.

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