Responsável por liderar algumas das principais investidas do governo Jair Bolsonaro (PL) para disseminar o kit Covid, o médico Hélio Angotti foi exonerado nesta quarta-feira (16) do comando da Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos.
Como mostrou a Folha, a mudança foi uma forma de retirar Angotti da pasta do Ministério da Saúde que lida com diretrizes e protocolos de tratamento do SUS. Em janeiro, ele rejeitou orientações sobre a Covid que contraindicavam o uso de medicamentos sem eficácia para a doença, como a hidroxicloroquina.
Angotti segue no ministério, agora no comando da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, pasta que estava vaga desde a saída da médica Mayra Pinheiro, conhecida como "capitã cloroquina".
Mayra filiou-se ao PL e deve disputar uma vaga do Ceará na Câmara dos Deputados. Até o começo de abril, prazo exigido para deixar o governo caso se candidate, ela deve ocupar o cargo de subsecretária da Perícia Médica Federal no Ministério do Trabalho e Previdência, com remuneração adicional de R$ 8.170.
O governo ainda promoveu outras mudanças na cúpula da Saúde.
Servidora de carreira do Ministério da Saúde, Sandra de Castro Barros passou a ocupar o comando da secretaria que estava sob chefia de Angotti.
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, chegou a avaliar o nome do médico Sérgio Okane para este cargo, que rejeitou a oferta e ainda pediu para deixar o governo.
A exoneração de Okane da vaga de secretário de Atenção Especializada à Saúde também foi publicada no Diário Oficial da União desta quarta-feira (16). Mesmo sob reclamações de secretários de estados e municípios, a enfermeira e gestora em saúde pública Maíra Batista Botelho passou a ocupar este cargo.
As orientações de tratamento do novo coronavírus negadas por Angotti haviam sido elaboradas por especialistas e aprovadas na Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS).
Para justificar a decisão, o secretário ainda assinou nota defendendo a hidroxicloroquina e afirmando que vacinas não funcionam.
O secretário também encabeçou outras tentativas de promover o tratamento sem eficácia, como a ideia de inserir os medicamentos no programa Farmácia Popular.
Auxiliares de Queiroga afirmam que a defesa ferrenha de Angotti ao kit Covid se tornou uma dor de cabeça ao ministro. A Comissão de Direitos Humanos do Senado convocou Queiroga e Angotti para que expliquem a rejeição das diretrizes.
Além de avaliar tratamentos do SUS, a Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos é vista como estratégica no governo por lidar com o complexo industrial da saúde, coordenar parcerias entre laboratórios públicos e privados, entre outras funções.
Nova secretária desta pasta, Sandra comandava o Departamento de Assistência Farmacêutica, área que lida com a complexa distribuição de medicamentos ao SUS. O setor organizou a distribuição de cloroquina durante a pandemia.
Na nova secretaria, Angotti será responsável por formular políticas públicas sobre a formação em saúde. Ele já foi diretor dentro desta pasta.
As diretrizes sobre a Covid-19 vetadas por Angotti não teriam poder de proibir médicos de utilizarem medicamentos sem eficácia, mas representariam uma mancha às bandeiras negacionistas de Bolsonaro.
Isso porque o governo federal, por meio do Ministério da Saúde, passaria a reconhecer as orientações contrárias ao chamado tratamento precoce.
O ministro Queiroga deve avaliar o recurso final contra a decisão de Angotti de vetar estas diretrizes. Ele não tem prazo para responder.
Queiroga já fez tentativas anteriores de afastar Angotti da cúpula da Saúde, ainda que publicamente estivesse defendendo o médico.
Em janeiro, o ministrou apoiou discussões no governo sobre a indicação do secretário a uma vaga de diretor da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), mas a ideia esbarrou na resistência do Congresso ao médico bolsonarista.
Queiroga não concordou com a condução do debate sobre o tratamento da Covid-19 no SUS feita por Angotti, segundo aliados do ministro.
No começo de sua gestão, o ministro indicou o médico e professor da USP Carlos Carvalho, contrário aos fármacos ineficazes, para organizar grupo que iria elaborar os pareceres.
Porém, Angotti apontou possíveis conflitos de interesse neste grupo e pediu para a Comissão de Ética da Pública da Presidência investigar o parecer que contraindica o kit Covid.
Mesmo sem aval de Queiroga, o secretário ainda tenta exonerar a servidora Vania Canuto do comando da Conitec, pois ela votou a favor das diretrizes elaboradas por especialistas. Como mostrou a Folha, Angotti sugere a nomeação ao cargo do biólogo Regis Bruni Andriolo, um defensor do kit Covid.
Seguidor do escritor Olavo de Carvalho, Angotti tem boa relação com auxiliares do presidente e com o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).
Ambos participaram de viagem do governo à Israel, em 2021, para conhecer um spray nasa l anti-Covid. O secretário também esteve em transmissões nas redes sociais ao lado do presidente Bolsonaro.
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