As vacinas protegem contra a Covid longa?

Estudos divergem na eficácia das vacinas contra sequelas, mas reiteram que são essenciais para evitar casos graves

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Pam Belluck
The New York Times

Enquanto a pandemia entra em seu terceiro ano, a Covid longa se torna uma preocupação cada vez mais importante. E muitas pessoas se perguntam se tomar uma vacina contra Covid pode reduzir suas chances de desenvolver sintomas em longo prazo.

Pessoa toma uma dose de vacina na Tailândia
Pessoa toma uma dose de vacina contra a Covid na Tailândia - Rachen Sageamsak - 23.abr.2022/Xinhua

O que pesquisas mostram até agora?

Um número crescente de estudos sugere que tomar uma vacina contra Covid pode reduzir –embora não eliminar– o risco de sintomas duradouros.

A Agência de Segurança em Saúde do Reino Unido (UKHSA, na sigla em inglês) realizou uma análise de oito estudos publicados sobre o tema antes de meados de janeiro. Ela relatou que seis dos estudos descobriram que as pessoas vacinadas que foram infectadas com o coronavírus tinham menos propensão que os pacientes não vacinados a desenvolver sintomas de Covid longa.

Os dois estudos restantes descobriram que a vacinação não parecia reduzir conclusivamente as chances de desenvolver Covid longa.

Quanta proteção as vacinas podem oferecer, de acordo com os estudos que encontraram benefícios?

Alguns resultados de estudos sugerem uma proteção substancial, enquanto outros encontram apenas um pequeno benefício.

Um grande estudo de registros eletrônicos de pacientes na Administração de Saúde dos Veteranos de Guerra dos EUA descobriu que os pacientes vacinados contra Covid tinham um risco apenas 13% menor do que os pacientes não vacinados de apresentar sintomas seis meses depois.

Dois estudos na Grã-Bretanha encontraram um efeito maior. Um estudo com cerca de 1,2 milhão de pessoas, com base em relatos dos pacientes por meio de um aplicativo de celular, encontrou um risco 50% menor de sintomas persistentes entre os pacientes vacinados. Outro, que não foi revisado por pares e se baseou numa pesquisa com cerca de 6.000 pacientes, encontrou um risco 41% menor.

Uma pesquisa de pacientes dos EUA pela empresa de dados de saúde Arcadia e a Covid Patient Recovery Alliance, uma colaboração de líderes com experiência em saúde no governo e no setor privado, encontrou um benefício ainda maior.

O estudo, que não foi revisado por pares, analisou registros de cerca de 240 mil pacientes infectados com o coronavírus até maio de 2021 e descobriu que os que receberam uma dose da vacina contra Covid antes de sua infecção tinham de um sétimo a um décimo de probabilidade de relatar dois ou mais sintomas de Covid longa 12 a 20 semanas depois.

Esse estudo também descobriu que as pessoas que receberam a primeira dose de vacina após contrair o coronavírus tinham menor probabilidade de desenvolver Covid longa do que aquelas que permaneceram sem se vacinar, e quanto mais cedo foram vacinadas após a infecção menor o risco de sintomas em longo prazo.

Um estudo em Israel, que também não foi revisado por pares, descobriu por meio de pesquisas que as pessoas imunizadas com duas doses tinham entre 54% e 82% menor risco do que pacientes não vacinados de relatar 7 dos 10 sintomas mais comuns de longo prazo. Elas geralmente não tinham maior propensão a relatar sintomas como dor de cabeça, dores musculares e outros problemas do que as pessoas da população em geral que não tiveram Covid, disse o estudo.

(Os autores disseram que não podiam confirmar se os pacientes foram vacinados antes ou depois de terem contraído a Covid, mas que, devido à política de vacinação israelense, era provável que a maioria das pessoas que receberam duas doses da vacina estivesse infectada com o coronavírus algum tempo depois de terem recebido as injeções.)

No estudo dos veteranos, também ainda não veiculado em uma publicação revisada por pares, os pesquisadores compararam cerca de 48 mil pacientes que não foram vacinados quando tiveram Covid com cerca de 16 mil pacientes que foram imunizados.

Descobriu-se que os pacientes vacinados se beneficiaram principalmente por terem menor propensão a desenvolver problemas pulmonares e dificuldades de coagulação do sangue, disse um dos autores, Ziyad Al-Aly, chefe de pesquisa e desenvolvimento do Sistema de Saúde VA St. Louis e epidemiologista clínico na Universidade de Washington em St. Louis. Outros sintomas mostraram "muito pouca redução de risco" pelas vacinas, afirmou.

Um paciente que sofre de Covid longa é examinado
Um paciente que sofre de Covid longa é examinado em um hospital de Tel Aviv, em Israel - Amir Cohen - 21.fev.2022/Reuters

"A mensagem geral é que as vacinas reduzem, mas não eliminam, o risco de Covid longa", disse Al-Aly, acrescentando que "confiar na vacinação como única estratégia de mitigação é totalmente inadequado. É como lutar com um escudo que funciona apenas parcialmente".

E os estudos que não mostram nenhum benefício?

Em uma análise de registros médicos eletrônicos de pacientes nos Estados Unidos, pesquisadores da Grã-Bretanha compararam cerca de 10 mil pessoas vacinadas contra Covid com um número semelhante de pessoas que não foram vacinadas contra o coronavírus, mas sim contra a gripe –uma tentativa de limitar o número de pessoas no estudo que poderiam ser consideradas indecisas sobre vacinas ou que geralmente têm comportamentos menos saudáveis.

O estudo descobriu que tomar uma vacina contra o coronavírus antes de ser infectado não reduziu o risco da maioria dos sintomas de Covid longa. Pelos dados, houve certa sugestão de que as pessoas vacinadas podem estar em menor risco de apresentar sintomas em longo prazo, como respiração anormal e problemas cognitivos, escreveram os autores, mas esses resultados não foram estatisticamente conclusivos.

Os pesquisadores disseram que é possível que, como seus dados se baseiam em registros eletrônicos de saúde, o estudo tenha capturado apenas pacientes com os sintomas mais graves, em vez de uma gama maior de pacientes que não procuraram atendimento médico por seus sintomas.

Por que as pesquisas são conflitantes?

Uma das razões são as diferenças nos próprios estudos. Nem todos os pesquisadores definiram a Covid longa da mesma maneira, mediram os mesmos sintomas ou rastrearam pacientes pelo mesmo período de tempo. Por exemplo, alguns estudos registraram sintomas que permaneceram pelo menos 28 dias após a infecção, enquanto outros mediram os sintomas que as pessoas apresentavam seis meses depois.

Estudos baseados em pesquisas com pacientes podem produzir resultados muito diferentes daqueles baseados em registros médicos eletrônicos. E alguns estudos não tiveram populações muito diversas. Os pacientes do estudo dos veteranos, por exemplo, eram na maioria mais velhos, brancos e do sexo masculino.

Há algo que os cientistas possam concluir com certeza?

Sim. As vacinas são muito eficazes para evitar que as pessoas fiquem gravemente doentes devido à infecção por todas as variantes conhecidas até agora. E muitos estudos descobriram que pacientes com Covid doentes o suficiente para serem hospitalizados eram mais propensos a ter problemas de saúde duradouros. Portanto, ao manter as pessoas fora do hospital, as vacinas devem reduzir as probabilidades desse tipo de caso pós-Covid de longo prazo.

Ainda assim, muitas pessoas com Covid longa tiveram infecções iniciais leves ou até assintomáticas e, embora alguns estudos sugerem que as vacinas têm potencial para aliviar seus sintomas em longo prazo, as evidências ainda não são conclusivas.

As vacinas oferecem alguma proteção contra a infecção para começar –e evitar a infecção, é claro, é a maneira mais segura de prevenir a Covid longa.

A vacinação pode ajudar se você já tiver Covid longa?

Quando as vacinas foram lançadas pela primeira vez, alguns pacientes com Covid longa estavam descobrindo que sintomas como névoa cerebral, dor nas articulações, falta de ar e fadiga melhoraram depois de serem vacinados. Ainda assim, muitas pessoas não sentiram diferença em seus sintomas após a imunização, e uma pequena porcentagem disse que se sentiu pior.

Um estudo do Departamento Nacional de Estatísticas da Grã-Bretanha descobriu que, em pessoas de 18 a 69 anos que relataram seus sintomas entre fevereiro e setembro de 2021, uma primeira dose de uma vacina reduziu as chances de relatar sintomas de Covid longa em 13%. Uma segunda dose reduziu ainda mais as chances em 9%, segundo o estudo.

Uma análise recente da UKHSA avaliou esse estudo e sete outros que examinaram se a vacinação de pessoas com Covid longa afetou seus sintomas. Descobriu-se que, na maioria dessas pesquisas, mais pessoas com sequelas de Covid relataram melhora dos sintomas em algum momento após serem vacinadas. No entanto, outros indivíduos também relataram piora dos sintomas e, em vários estudos, a maioria disse que os sintomas não mudaram.

A agência observou que a definição de Covid longa variou amplamente entre os estudos e que, como todos os estudos eram observacionais, as mudanças nos sintomas podem ser atribuídas a outros fatores além da vacinação.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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