Descrição de chapéu The New York Times

O que sabemos sobre a Covid longa até agora

Entre 10% a 30% das pessoas relatam problemas médicos persistentes ou novos meses após suas infecções iniciais por coronavírus

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Knvul Sheikh Pam Belluck
Nova York

Entre os muitos aspectos confusos do coronavírus está o espectro de sintomas possíveis, bem como sua gravidade e duração. Algumas pessoas desenvolvem Covid-19 em grau leve e se recuperam rapidamente, sem efeitos duradouros. Mas alguns estudos avaliam que de 10% a 30% das pessoas relatam problemas médicos persistentes ou novos meses após suas infecções iniciais por coronavírus –uma série de sintomas conhecidos como Covid longa.

As pessoas que sofrem de doenças leves ou moderadas, bem como aquelas sem quaisquer condições médicas subjacentes, podem apresentar alguns sintomas debilitantes em longo prazo, tais como fadiga, falta de ar, frequência cardíaca irregular, dor de cabeça, tontura, depressão e problemas de memória e concentração.

Pedestres circulam pela Av Paulista com e sem mascaras. O governo do estado de Sao Paulo, anunciou a desobrigação do uso de máscara de proteção contra covid-19 em ambientes abertos em todo o estado em março deste ano
Pedestres circulam pela Av Paulista com e sem mascaras. O governo do estado de Sao Paulo, anunciou a desobrigação do uso de máscara de proteção contra covid-19 em ambientes abertos em todo o estado em março deste ano - Zanone Fraissat/Folhapress

Esses problemas médicos persistentes são tão variados que um estudo de um grupo de pesquisa liderado por pacientes avaliou 203 sintomas que podem flutuar ou até aparecer do nada depois que as pessoas pareciam recuperadas.

Como disse o doutor Ziyad Al-Aly, chefe de pesquisa e desenvolvimento do Sistema de Saúde VA St. Louis e pesquisador clínico em saúde pública na Universidade de Washington em St. Louis, cada caso de Covid longa é diferente do outro.

Como os médicos diagnosticam atualmente a Covid longa?

Há pouco consenso sobre a definição exata de Covid longa, também conhecida pelo termo médico PASC, sigla em inglês de "sequela pós-aguda da Covid-19". Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) diz que a Covid longa começa três meses após a crise original da doença ou o resultado positivo do teste, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) definem o período inicial logo depois de um mês.

Alguns pesquisadores e profissionais de saúde usam outros prazos, dificultando as tentativas de se estudar e quantificar a doença, disse Al-Aly, que realizou muitos estudos sobre problemas duradouros após a Covid.

Quando os pacientes com sintomas persistentes vão ao médico, exames como eletrocardiogramas, radiografias de tórax, tomografias computadorizadas e exames de sangue nem sempre identificam problemas fisiológicos, disse Al-Aly. Os pesquisadores estão trabalhando para identificar certos fatores biológicos, chamados biomarcadores, que são relacionados com os sintomas persistentes da Covid. Estes podem incluir sinais de inflamação ou certas moléculas produzidas pelo sistema imunológico que podem ser medidas em exames de sangue, por exemplo.

Por enquanto, os médicos precisam confiar na descrição dos sintomas de seus pacientes e descartar explicações ou causas alternativas. Algumas clínicas pós-Covid têm equipes multidisciplinares de especialistas que avaliam os pacientes para definir as melhores opções de tratamento.

O que causa a Covid longa?

Não está claro o que exatamente produz a Covid longa, mas pesquisas começaram a oferecer algumas pistas. Alguns especialistas teorizam que a resposta imune que se acelera quando a pessoa adoece pela primeira vez pode causar inflamação e danos em todo o corpo, podendo resultar em sintomas de Covid longa, disse o doutor Michael Peluso, médico de doenças infecciosas na Universidade da Califórnia em San Francisco.

"Sabemos que durante a Covid-19 aguda, algumas pessoas têm uma resposta imune realmente acelerada e outras têm a resposta imune reduzida, e essa resposta pode determinar a trajetória de como a pessoa se sairá", disse ele.

Outra explicação, dizem os especialistas, pode ser que seu sistema imunológico não desligue completamente após a infecção inicial.

Quem está em risco?

A pesquisa oferece algumas dicas sobre quais pacientes podem enfrentar um risco maior de sintomas duradouros. Em um estudo com 209 pacientes publicado em janeiro, os pesquisadores descobriram quatro fatores que puderam ser identificados no início da infecção por coronavírus que pareciam estar relacionados a um risco maior de a pessoa apresentar sintomas contínuos dois a três meses mais tarde.

Um fator foi o nível de RNA do coronavírus no sangue no início da infecção, um indicador de carga viral. Outro foi a presença de autoanticorpos —anticorpos que atacam erroneamente os tecidos do próprio corpo, como ocorre em doenças como lúpus e artrite reumatoide. Um terceiro fator foi a reativação do vírus Epstein-Barr, que pode causar mononucleose e infectar a maioria das pessoas, muitas vezes quando são jovens, e depois geralmente se torna dormente.

O quarto fator foi ter diabetes tipo 2, embora os especialistas digam que, em estudos envolvendo um número maior de pacientes, o diabetes pode ser apenas uma das várias condições médicas que aumentam o risco de Covid longa.

Estudos de clínicas pós-Covid também descobriram outras condições médicas preexistentes que podem colocar as pessoas em risco de Covid duradoura. Em um relatório sobre os primeiros cem pacientes tratados de sintomas neurológicos e cognitivos numa clínica pós-Covid no Northwestern Memorial Hospital, em Chicago, 42% relataram que tinham anteriormente depressão ou ansiedade, embora esses pacientes pudessem simplesmente se sentir mais confortáveis buscando tratamento neurológico, disseram os médicos. Outras condições preexistentes incluíam doenças autoimunes e dor de cabeça.

Estudos também sugerem que o risco de desenvolver Covid longa atinge o pico na meia-idade, disse Peluso. A idade média dos pacientes no estudo da Northwestern era 43 anos. Uma análise de 78.252 pedidos de seguro de saúde privado nos Estados Unidos revelou que pessoas entre 36 e 64 anos representavam cerca de dois terços dos pacientes com Covid longa. (Mas esse estudo não incluiu a maioria dos beneficiários do Medicare, portanto envolveu relativamente poucos pacientes mais velhos.)

As mulheres podem ser afetadas em maior proporção: 60% dos pacientes são do sexo feminino, segundo alguns estudos. Um padrão semelhante surgiu em outras condições duradouras, como ME/CFS (encefalomielite miálgica/síndrome da fadiga crônica), que apresenta vários sintomas semelhantes aos da Covid longa.

Como a pandemia teve um efeito significativo nas comunidades negras e latinas nos Estados Unidos, e esses grupos têm acesso mais limitado à atenção médica, eles também podem ter um alto número de casos de Covid longa, disse Peluso.

As vacinas podem proteger contra a Covid longa?

A imagem ainda está imprecisa, mas vários estudos sugerem que tomar uma vacina contra Covid pode reduzir –mas não eliminar– o risco de sintomas em longo prazo.

A Agência de Segurança da Saúde do Reino Unido realizou uma análise de oito estudos sobre vacinas e a Covid longa antes de meados de janeiro. Seis deles descobriram que as pessoas vacinadas que foram infectadas com o coronavírus eram menos propensas do que os pacientes não vacinados a desenvolver sintomas de Covid longa. Os dois estudos restantes descobriram que a vacinação não parecia reduzir conclusivamente as chances de desenvolver Covid longa.

Nessa análise, um estudo, que não foi revisado por pares, com cerca de 240 mil pacientes nos Estados Unidos descobriu que os que receberam até mesmo uma dose da vacina antes da infecção por Covid eram 7 a 10 vezes menos propensos do que os pacientes não vacinados a relatar sintomas de Covid longa 12 a 20 semanas depois.

Mas outro grande estudo de registros eletrônicos de pacientes na Administração de Saúde dos Veteranos dos EUA, também ainda não revisado por pares, descobriu que os que foram vacinados tiveram um risco apenas 13% menor do que os pacientes não vacinados de apresentar sintomas seis meses depois. Os pacientes vacinados se beneficiaram principalmente por terem menor tendência a desenvolver problemas pulmonares e dificuldades de coagulação do sangue, disse Al-Aly, um dos autores do estudo.

"A dependência da vacinação como única estratégia de mitigação é totalmente inadequada", disse Al-Aly. "É como lutar com um escudo que funciona apenas parcialmente."

Buscando atendimento médico

Se você estiver preocupado com algum sintoma persistente após uma infecção confirmada ou suspeita por coronavírus, não tenha medo de pedir ajuda. Verificar com seu provedor de cuidados básicos é um bom primeiro passo. Mais médicos estão se conscientizando dos sintomas duradouros de Covid e podem recomendar testes que podem pelo menos descartar outras causas de seus sintomas.

"Mesmo que digamos que a Covid longa é quando os sintomas duram um mês ou três meses após a infecção, você não precisa esperar tanto tempo para pedir ajuda", disse Al-Aly. "As pessoas devem realmente levar a sério seus sintomas".

Se você não estiver sendo atendido por um médico, pode procurar uma clínica de tratamento pós-Covid, embora Al-Aly reconheça que "é mais fácil falar do que fazer". # O acesso às clínicas pós-Covid pode ser difícil para as pessoas sem seguro médico adequado. E, em alguns estados americanos, as pessoas podem ter que viajar centenas de quilômetros para chegar à mais próxima. # Você pode procurar clínicas pós-Covid perto de sua casa no banco de dados do Survivor Corps.

Leve seus exames médicos se estiver visitando um novo provedor e faça uma lista dos seus sintomas, especialmente se tiver problemas cognitivos, pois provavelmente esquecerá alguns problemas de saúde quando for à consulta.

Alguns problemas de Covid longa podem ser tratados com medicamentos ou tratamentos existentes para sintomas como dor de cabeça ou problemas gastrointestinais. A fisioterapia e a "reabilitação cognitiva", que inclui abordagens usadas para pacientes que sofreram derrame ou lesão cerebral, também podem ser úteis ao longo do tempo. Algumas pessoas melhoram com serviços personalizados de reabilitação de saúde física e mental e exercícios respiratórios, que podem ajudar a recuperar lentamente a força e a resistência para atividades físicas.

Outras possíveis ferramentas contra a Covid longa, incluindo tratamentos antivirais, apenas começam a ser estudadas. Os Institutos Nacionais de Saúde dos EUA estão investindo mais de US$ 1 bilhão num grande esforço de pesquisa chamado Initiative Recover, mas o progresso tem sido lento. Os legisladores estão pressionando por um melhor financiamento para pesquisas e cuidados médicos sobre Covid de longa duração.

Vários grupos civis, como Body Politic, Long Covid Alliance e Survivor Corps, oferecem apoio psicológico, bem como recursos para buscar tratamento, benefícios por incapacidade e defesa jurídica de pacientes.

Pessoas com Covid longa também podem participar de estudos de pesquisa, disse Peluso. Você pode encontrar estudos clínicos contínuos em universidades e centros acadêmicos próximos a você ou se inscrever para fazer parte da Recover Initiative.

"Participar de pesquisas pode ser muito fortalecedor", disse Peluso.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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