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Uso de anti-inflamatório contra Covid reduz pela metade risco de morte um ano após alta, diz estudo

Pesquisa aponta relação de inflamação elevada durante a fase aguda da doença e maior risco de mortalidade nos 12 primeiros meses após alta hospitalar

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São Paulo

Uma pesquisa inédita encontrou uma associação entre ter um quadro inflamatório elevado durante a fase aguda da internação por Covid e maior risco de morte no primeiro ano depois de alta hospitalar.

Nos pacientes com quadro grave de Covid que tinham essa inflamação no organismo após infecção pelo coronavírus –conhecida como tempestade de citocinas— e que necessitaram de suporte de oxigênio ou de tratamento para reduzir a inflamação, o risco de morrer nos 12 meses subsequentes à infecção era 61% maior do que em pacientes que tiveram quadro moderado.

Porém, o estudo também encontrou que o tratamento com anti-inflamatórios nos primeiros 30 dias após a alta hospitalar em comparação com aqueles que não utilizaram o tratamento esteve associado a uma redução do risco de morte em até 51%.

Ampola de medicamento anti-inflamatório dexametasona - Yves Herman/Reuters

Os achados da pesquisa feita na Universidade da Flórida em Gainesville (EUA) foram publicados na edição desta quinta-feira (12) da revista especializada Frontiers in Medicine.

Para avaliar qual o risco de morte até 12 meses após alta hospitalar por Covid, os pesquisadores avaliaram 1.207 pacientes com mais de 18 anos que foram hospitalizados entre 1º de janeiro de 2020 até 31 de dezembro de 2021 com diagnóstico comprovado por exame RT-PCR para o Sars-CoV-2.

Como indicativo de inflamação durante a fase aguda de infecção os cientistas avaliaram a taxa de proteína C-reativa (CRP, na sigla em inglês) no sangue, que é um composto liberado naturalmente no organismo frente a uma resposta imune celular.

Os pacientes com o valor elevado de CRP durante a hospitalização tinham maior probabilidade de desenvolver inflamação em outros órgãos e morrer no longo prazo em comparação com aqueles com baixo índice CRP (razão de risco ou HR=1,61). Esse risco foi ajustado para outros fatores, como idade, gênero e presença de comorbidades, que podem influenciar também o desfecho da Covid.

No caso dos pacientes que foram atendidos ainda nos primeiros meses de 2020, antes de ser oficialmente decretada a pandemia, os cientistas consideraram que as internações correspondiam ao perfil da Covid e posteriormente tiveram confirmação por exame laboratorial.

Além disso, o uso de anti-inflamatórios para tratamento hospitalar, como a dexametasona intravenosa ou na forma oral nos primeiros dias depois de receber alta hospitalar, também foi avaliado e estava associado a uma razão de risco 46% maior para morte (HR=1,46). Como a dexametasona é utilizada no tratamento de Covid grave em hospital, os pacientes que receberam a droga possuíam, consequentemente, valores elevados de CRP.

Assim, os pesquisadores viram que a inflamação elevada na fase inicial estava associada com o risco de morrer até um ano depois da infecção por qualquer causa, incluindo com sequelas mais sérias em diversos órgãos do corpo, mas ao mesmo tempo o tratamento com o corticosteroide diminuiu essa probabilidade pela metade (HR=0,49).

Segundo Arch Mainous, pesquisador do departamento de Saúde da Família e da Comunidade da Universidade da Flórida e coordenador do estudo, a ideia de fazer essa comparação partiu primeiro da observação de como o risco de uma nova hospitalização até um ano após "se recuperar" da Covid era muito maior em pessoas que tiveram quadro grave da doença.

"Como já havíamos observado a internação como um fator determinante para ter Covid longa nas fases 1 e 2 do nosso estudo, nós procuramos avaliar as diferenças entre quem teve uma inflamação alta na fase de hospitalização, indicada pela taxa de CRP, em comparação com os pacientes de quadro moderado. E foi aí que vimos que é clara a associação de gravidade com resposta inflamatória elevada", disse à Folha.

Para Mainous, a dexametasona intravenosa tem um papel, durante a fase aguda de Covid, de ajudar na função pulmonar e, como efeito secundário, reduzir a inflamação, diferente do tratamento oral após a alta, que é apenas indicado como agente anti-inflamatório. "O que vimos é que pessoas que recebem prescrição para uso de corticosteroides orais nos primeiros dias após a saída hospitalar têm menor risco de morte", explicou.

Aos milhares de mortes diretamente ligadas à Covid, afirma o médico, podem ser ainda somadas todas aquelas que ocorreram um ano após a recuperação da fase aguda e que, segundo ele, não foram avaliadas como sendo um efeito longo da doença, mas sim outras causas não relacionadas à Covid. "Não estamos focando essas potenciais mortes, o foco é sempre a fase aguda, em tratar e recuperar as pessoas e tirá-las do hospital, mas o que vimos é que esse é o primeiro passo, há uma fase crônica da Covid a ser tratada também", disse.

De acordo com ele, contudo, a pesquisa não tem como objetivo dizer que todos devem receber a prescrição para o medicamento. "Não é para dizer que todos devem usar corticosteroides, mas com o nosso achado esperamos que outros ensaios sejam conduzidos para avaliar outras drogas e calcular os efeitos potenciais de uma inflamação crônica em pacientes após alta de Covid", ressaltou.

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