Preço de remédio usado para hormonização com testosterona aumenta 380%

Liminar obtida por farmacêutica resultou em reajuste de Deposteron

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São Paulo

Uma liminar do TRF1ª (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) permitiu à farmacêutica brasileira EMS aumentar em 380% o valor de comércio do medicamento Deposteron (cipionato de testosterona), de fabricação própria.

O remédio é utilizado por homens trans para terapia hormonal e também para hipogonadismo masculino, mau funcionamento dos testículos que causa deficiência de testosterona.

Para este ano, foi definido pela CMED (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos) o ajuste máximo de 10,89% nos preços de produtos farmacêuticos.

Porém, considerando a tabela de preços máximos ao consumidor divulgada em abril pelo grupo, o Deposteron deveria custar em torno de R$ 52,55 em estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, considerando o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias) de 18%.

A tabela de setembro, por sua vez, mostra R$ 252,49.

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Sede da farmacêutica EMS, em Hortolândia, no interior de São Paulo. - Divulgação EMS

Em nota, a EMS diz que o medicamento obteve registro sanitário em 1992, período anterior à criação da CMED. "Por causa disso, o Deposteron possuía um teto inicial de precificação que seguiu defasado por todo esse período. Somente em agosto de 2022, para estar de acordo com as condições e os mesmos critérios da atual legislação, o preço do Deposteron passou por uma adequação junto aos órgãos competentes", completa.

O reajuste foi solicitado pela própria empresa e, no fim de julho, o juiz Daniel Paes Ribeiro autorizou, em decisão liminar, que o preço do remédio fosse ajustado para R$ 151,23, com ICMS nulo.

O caso agora deve ser analisado pela sexta turma do TRF1ª.

Na ação, a EMS afirma que a União tem sido omissa com seus pedidos de correção do valor do produto.

Já a União argumenta não haver legislação que permita tamanho reajuste.

Procurado, o TRF1ª não respondeu aos questionamentos da reportagem.

A Anvisa, que exerce o papel de secretaria-executiva da CMED, diz que o órgão, ao tomar conhecimento da decisão judicial, "adotou providências no sentido de cumprir a ordem judicial e enviou as informações à AGU (Advocacia-Geral da União), que detém competência para efetuar os protocolos pertinentes às demandas judiciais e acompanhar o respectivo andamento processual".

Segundo a SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), o Deposteron é um dos dois medicamentos à base de testosterona com valores mais acessíveis no país. Outro que se encaixa nesse cenário é o Durateston, com preço máximo de R$ 15,04 para estados com ICMS de 18%, de acordo com a CMED.

Alternativas, como o Nebido (undecilato de testosterona), custam entre R$ 277 e R$ 630 no estado de São Paulo.

Alexandre Hohl, presidente do departamento de endocrinologia feminina, andrologia e transgeneridade da SBEM, diz que historicamente sempre há falta de um desses medicamentos.

"São medicamentos mais baratos. Na falta de um, há o outro para prescrever. Agora, havia. No Sul, por exemplo, já há falta do Durateston, que, com o preço exorbitante do Deposteron, seria a única opção acessível disponível."

O médico destaca que ambos os medicamentos são descritos como para tratamento de hipogonadismo masculino, apesar de também serem utilizados por homens trans para terapia hormonal, "mesmo com recomendação contrária do fabricante".

Na última semana, organizações trans, como a Liga Transmasculina João W. Nery, do Rio de Janeiro, manifestaram-se sobre o tema.

O ativista Gab Van, presidente da liga, diz que homens trans devem entrar com ações individuais para obter o custeio do Deposteron pelo Estado. Sobre a possibilidade de uso do Durateston, Van afirma que o produto é "mais agressivo".

A SBEM diz que pode haver uma preferência, mas inexiste comprovação de maior agressividade.

Desde 2008, o SUS oferece hormonização gratuita para mulheres trans e, a partir de 2013, também para homens trans e travestis. Entretanto, no caso da testosterona, não há padronização do medicamento a ser prescrito, dificultando o acesso.

A situação é a mesma para homens cis que necessitam da medicação.

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