ALEX SABINO
DE SÃO PAULO

De cabeça baixa, os jogadores da Argentina atravessaram o corredor do estádio Centenário, em Montevidéu. Ignoraram os jornalistas. Todos passaram batidos por grupo de quatro crianças que imploravam por uma foto.

Todos, menos um: Messi.

Com o mundo desabando em seus ombros, o atacante cinco vezes melhor do mundo tenta salvar uma seleção em que ninguém se entende e que corre o sério risco de não disputar o Mundial pela primeira vez desde 1970.

A Argentina precisa vencer o Equador na terça (10), em Quito, para pelo menos se garantir na repescagem contra a Nova Zelândia. O empate pode servir, desde que haja um ganhador na partida entre Peru e Colômbia e o Paraguai não vença a Venezuela.

Como a Argentina chegou a essa situação?

"Se você souber a resposta, me avise. É uma frustração grande. Talvez falte fazer o primeiro gol nos jogos. Sair na frente. Depois dos 15 minutos, com placar empatado, os jogadores ficam apavorados", disse à Folha Jorge Burruchaga, campeão mundial em 1986 e vice em 1990.

Em campo, nem o jeito reservado de Messi é capaz de esconder a irritação que sente. Ao final do empate em 0 a 0 com o Peru na última quinta (5), ele fechou os olhos e bufou de frustração.

Apesar de ter criado todas as chances do time, foi massacrado por parte da imprensa local, como acontece sempre que a equipe não vence.

"Espera-se tudo de Messi, que faça tudo em campo. Até ele, que é o melhor do mundo, precisa de apoio", diz Carlos Bilardo, técnico campeão na Copa de 1986 e hoje apresentador da rádio La Red, de Buenos Aires.

Bilardo é o maior crítico do atual comandante da seleção, Jorge Sampaoli. Mas agora prefere se calar.

A campanha ruim é resultado do caos em que mergulhou o futebol do país desde a morte de Julio Grondona, presidente da AFA (Associação de Futebol Argentino) de 1979 até sua morte, em 2014.

A entidade teve junta diretiva que não conseguia um nome de consenso para ser o novo mandatário. A eleição de Mauricio Macri para a presidência da república sinalizou o fim do "Futebol para Todos", programa do governo que comprava os direitos de transmissão do futebol e os distribuía para emissoras de TV amigas do regime.

Por falta de pagamento de salários, jogadores do país entraram em greve neste ano.

A crise financeira fez a comissão técnica de Gerardo Martino, que se demitiu em maio de 2016, entrar na justiça para receber os atrasados.

Todos os problemas foram parar dentro de campo.

"Sampaoli tem até um verdureiro na comissão. Se eu tenho uma pessoa como Sampaoli, que ganha 7 milhões de pesos por mês [R$ 1,3 milhão], que ela apresente uma solução!", reclamou Alejandro Fantino, um dos
apresentadores de TV mais populares do país, após o empate com o Peru. Ele chamou o técnico de "fotocópia do [tenista] André Agassi".

Figuras de TV costumam ir longe no futebol local. Um dos homens mais poderosos do esporte é Mauricio Tinelli, também apresentador e cartola do San Lorenzo.

DIGA QUE FICO

"A gente precisa parar com essa história de que a solução é pegar a bola, dar a Messi e rezar para ele resolver. A seleção tem de aprender a tirar o melhor dele", analisa Mario Kempes, artilheiro e campeão da Copa de 1978.

Em 2014, Alejando Sabella percebeu que a Argentina só iria longe no Mundial se acertasse a defesa, mesmo que o ataque fosse sacrificado. Chegou à final. Ele se demitiu após o torneio e hoje, com problemas de saúde, está longe do futebol.

Os que o sucederam não obtiveram sucesso. A Argentina teve três técnicos nas eliminatórias, fruto da falta de planejamento e vaidades. Martino não queria ser sucedido por Sampaoli, seu desafeto. Mesmo após decidir sair, se segurou até o rival achar emprego na Espanha. Entrou Edgardo Bauza. Durou sete meses. Disputou 24 pontos e ganhou 11. Sampaoli estreou em setembro.

Nenhum dos três acertou o ataque. Nem Messi, que renunciou à seleção, farto das críticas após a Copa América de 2016. Depois voltou atrás.

Ele já teve Aguero, Higuaín, Dybala, Correa, Tevez, Lavezzi, Pratto, Alario, Benedetto e Icardi como companheiros de ataque. Em 17 jogos, a Argentina fez 16 gols. O 2º pior ataque das eliminatórias.

"Menosprezamos o Peru. Sempre foi equipe difícil, bem montada. Não podemos viver no passado e achar que vamos a Quito golear o Equador. Essa época acabou. A Argentina precisa ser organizada. Ter calma e planejamento", finaliza Bilardo.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.