COB analisou 3% dos projetos olímpicos de 1 ano antes da Rio-16

Governo avaliou investimentos de R$ 129 milhões via recursos da Lei Piva

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Carlos Arthur Nuzman discursa no encerramento da Olimpíada do Rio
Carlos Arthur Nuzman discursa no encerramento da Olimpíada do Rio - Xinhua/Wang Peng

São Paulo

Uma auditoria do Ministério da Transparência à qual a Folha teve acesso apontou que apenas 3% dos projetos que receberam dinheiro público da Lei Piva em 2015, um ano antes dos Jogos do Rio-2016, tiveram prestação de contas analisadas e aprovadas pelo COB (Comitê Olímpico do Brasil). Os repasses totalizam R$ 129 milhões em investimentos nas confederações.

Segundo relatório da CGU (Controladoria Geral da União), até janeiro de 2017, a entidade analisou e aprovou prestações de contas de apenas 79 dos 2.489 projetos propostos por 32 confederações esportivas no exercício de 2015.

Confederações de atletismo, esporte universitário, desportos aquáticos, golfe, handebol, judô, lutas associadas, remo, rúgbi, tênis, tiro esportivo e vôlei não tiveram nenhum projeto analisado.

Já outras tiveram pouquíssimas avaliações. Esporte com mais projetos, o triatlo, por exemplo, teve 118 solicitações, com apenas 10 aprovações nas contas, de um total de R$ 4,4 milhões investidos na modalidade em 2015.

O hipismo, por sua vez, recebeu R$ 6,1 milhões, distribuídos em 110 projetos e teve as prestações de contas de apenas um projeto analisadas de forma correta pelo COB.

Os esportes de inverno também foram agraciados sem as prestações de contas produzidas corretamente. Desportos na neve levaram R$ 2 milhões, em 87 projetos, sendo apenas três analisados, enquanto esportes no gelo levaram R$ 2,8 milhões, em 100 projetos. Apenas 14 tiveram a fiscalização adequada.

Na avaliação do controle da aplicação dos recursos, a CGU identificou deficiências nos procedimentos de análise e aprovação das prestações de contas, o que vem contribuindo para o estoque elevado de processos nas dependências do setor de prestações de contas do COB.

FALTA DE ESTRUTURA

Como consequência, o processo contribui de forma significativa para a distribuição de recursos sem que tenha sido verificada e atestada sua adequada utilização por parte das entidades esportivas, no caso as confederações brasileiras de cada modalidade.

Aprovada em 2001, a Lei Piva garante a destinação às entidades desportivas de 2,7% da arrecadação bruta das loterias federais. Os percentuais são divididos entre os dois comitês e o CBC (Comitê Brasileiro de Clubes).

"Em visita da equipe de auditoria à sede do COB, identificou-se que o espaço físico destinado à acomodação da equipe que analisa as prestações de contas das confederações está superlotado", avalia o Ministério da Transparência.

"Os documentos físicos referentes às prestações encaminhadas pelas entidades filiadas a cada encerramento de projeto estão ocupando diversas prateleiras e se espalhando sobre as mesas de trabalho dos funcionários, o que pode estar contribuindo de maneira significativa para os atrasos na análise e aprovação das prestações de contas dos projetos encerrados", continua a Controladoria.

Isso vai contra instrução normativa do próprio COB, que atesta que toda a documentação referente à aplicação dos recursos repassados pelo comitê "após ser devidamente analisada, será arquivada no Comitê Olímpico Brasileiro, ficando à disposição do Tribunal de Contas e da Corregedoria Geral da União".

Em resposta à CGU, o COB justificou o atraso na prestação de contas pelo baixo número de funcionários dedicados à análise da documentação. Segundo a entidade, apenas 15 pessoas trabalham atualmente no departamento analisando "aproximadamente 10.197 documentos".

Como as prestações não foram auditadas pelo COB, acabam ficando também sem a análise dos órgãos que fiscalizam o uso dos recursos públicos, como o TCU (Tribunal de Contas da União ) e a própria CGU, que realizou a auditoria no Comitê Olímpico.

Após utilizar o dinheiro dos projetos, as confederações devem enviar as prestações de contas com todos os comprovantes de gastos para que o COB aprove ou rejeite. A partir daí, os projetos ficam liberados para que CGU e TCU fiscalizem a utilização dos investimentos.

A Lei Piva prevê que o Ministério do Esporte terá ciência dos programas e projetos feitos pela Lei Piva, e que cabe ao TCU fiscalizar a aplicação dos recursos.

"A regra é que o COB só pode repassar recurso para quem já prestou contas. Na prática, isso não está acontecendo. O COB repassou dinheiro público para confederações sem analisar como elas investiram. Essa incapacidade de analisar as prestações de contas nos preocupa bastante", afirma Ismar Barbosa Cruz, secretário de controle externo do TCU.

Como funciona a Lei Piva

O caminho do dinheiro para financiar o esporte

  1. Dinheiro arrecadado

    A Lei Piva determina que 2,7% da arrecadação das loterias seja repassada para o COB (Comitê Olímpico do Brasil), que fica com 62,96% do total, e para o CPB (Comitê Paralímpico Brasileiro), com 37,04%

  2. Repasse

    Desse total, 85% são direcionados às confederações

  3. Projetos

    Para receber o dinheiro, as confederações precisam apresentar projetos ao COB. Ao serem aprovados, o dinheiro é liberado

  4. Prestação de contas

    As confederações têm de apresentar ao COB comprovantes de que o dinheiro repassado foi utilizado como previsto no projeto. O COB, então, faz a análise desses comprovantes e os libera para que órgãos de fiscalização verifiquem se não houve mau uso do dinheiro público

OUTRO LADO

À Folha, o COB admite a falha. "O acúmulo de prestações de contas citado de fato ocorreu. A mudança do sistema de verificação, que antes era manual e passou a ser eletrônico, gerou um período para o COB e as Confederações se adaptarem ao novo sistema. O COB está trabalhando intensamente para concluir a verificação de todos os documentos de 2015, sem prejuízo à prestação de contas de 2017, que segue em paralelo. Tudo está sendo feito com o entendimento do TCU e da CGU", justifica o comitê.

O COB também prometeu, após pressão da CGU, aprimorar o procedimento.

"Após os levantamentos realizados, aumentamos o número de analistas e criamos uma nova equipe que iniciou a análise do ano de 2017, objetivando não deixar acumular. A ideia é diminuir o processo de 15 para 7 meses. Vamos evidenciar as modificações já realizadas no ano de 2017 no sistema monitor", afirma a entidade.

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