Como presidente, Citadini quer que Corinthians enfrente poder da CBF

Candidato propõe que clube assuma papel de liderança no futebol brasileiro por ser "maior" que os outros

Antonio Roque Citadini, candidato a presidente do Corinthians, faz sinal com o dedo polegar na cabeça, sugerindo que clube precisa pensar mais nas ações
Antonio Roque Citadini é candidato de oposição à presidência do Corinthians - Marlene Bergamo/Folhapress
Alex Sabino
São Paulo

Quando o impeachment de Roberto de Andrade naufragou, Antonio Roque Citadini já falava em ser presidente.

"Sou candidato", disse ao sair da reunião do conselho deliberativo, em fevereiro do ano passado.

Conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado), ele quer que o Corinthians seja um foco de resistência ao poder da CBF.

"[Na eleição para presidente da CBF] o Corinthians tem uma força menor do que a Federação do Acre. Tem sentido? Você acha que o Corinthians representa menos para o futebol do que o Acre? O clube deveria ter uma posição sobre isso", reclama.

É liderança que ele pretende ocupar, caso seja eleito. Acha natural que isso aconteça pela certeza de que seu clube é maior que os rivais.

"Se estivermos à frente de um movimento, os outros vão seguir", afirma.

Sem posições radicais a respeito do Itaquerão, quer que aconteça uma arbitragem para determinar se o contrato com a Odebrecht foi cumprido e o valor da dívida. Nem tem grandes preocupações a respeito de conquistar títulos.

"A obrigação do Corinthians é disputar e ganhar. E vai continuar ganhando."

Ex-vice de futebol e ex-presidente do clube na época de Alberto Dualib, Citadini marcou sua passagem como dirigente pelas declarações polêmicas que hoje, com as redes sociais, causariam ainda maior controvérsia. Quando afirmou, por exemplo, que Gil era melhor do que Robinho.

"Promete que, como presidente, continuará o mesmo. Eu não mudo muito. Até porque não ofendo ninguém. Digo o que penso."

Impugnado pela comissão eleitoral por causa do cargo no TCE (tem liminar para seguir no pleito), sinaliza a intenção de se aposentar caso seja eleito. Se não fizer isso, será alvo de ações na Justiça para tirá-lo da presidência.


Folha - O senhor foi candidato na última eleição e o Roberto [de Andrade] ganhou. Por que desta vez será diferente?

Antonio Roque Citadini - Na última eleição eu fui candidato 25 dias antes da eleição. Eu não era candidato. Foi uma eleição atípica. Eu não era o nome. Nesta eleição é diferente, sou candidato há algum tempo. Claramente dá para organizar melhor a sua campanha.

Por que não houve uma união das oposições?

Você poderia dizer que não deu para unir a situação. Basicamente os grupos de candidatos se formaram a partir de um racha da situação, não da oposição. Há um número de pessoas que fizeram parte da diretoria e divergiram em algum momento e acabaram organizando outras chapas. Mesmo na minha chapa, conto com pessoas que foram do grupo dirigente e saíram dela. Muitos apoiaram na melhor das intenções. Não é bem um racha na oposição. Há um processo de desfazimento do grupo "Renovação e Transparência" e que acabou abrindo questões por tudo quanto é lado.

O senhor não acha então que, considerando que o Andrés [Sanchez] é situação, ter tantos candidatos o favorece?

O Andrés é situação, o grupo predominante na situação. Os dois vices do Paulo [Garcia] saíram agora da direção [Flavio Adauto e Emerson Piovezan] e o Paulo nunca escondeu que apoiava a gestão do Roberto. O grupo do [Felipe] Ezabella sempre votou na "Renovação e Transparência". Não estou criticando isso porque alguns votaram com boas intenções, mas sempre votaram. Mesmo os dois vices do [Romeu] Tuma [Ilmar Schiavenato e  Luiz Carlos Bezerra] estavam na situação.

A gente vê em outros clubes, não apenas no Corinthians, que quando o mesmo grupo fica tanto tempo no poder, existe um desgaste natural. Não só na administração como de pessoas. Talvez este seja o momento bom para o senhor que sempre se colocou na oposição?

Eu tenho uma vantagem. Não preciso me autodefinir. Quando o candidato começa a fazer um programa muito rebuscado para oferecer é porque tem dificuldade de se definir. Então ele quer se definir pelo programa, dizer que tem grandes ideias, projetos etc. As pessoas no Corinthians conhecem todo mundo. Me conhecem, conhecem o Andrés, conhecem o Paulo, todo mundo... De forma que para mim, neste sentido, é mais fácil. Tanto que minha campanha claramente reúne mais gente, mais voluntários. Não há dúvida que há processo de esgotamento do grupo "Renovação e Transparência".

É normal os candidatos apresentarem planos e projetos. O senhor não tem um projeto ousado para o Corinthians então?

As pessoas me conhecem e sabem que eu sou o mais ousado. Não tem essa história. Eu sou o candidato com ideias fora das que estão colocando. Com respeito à Arena, à gestão da Arena, ao Parque São Jorge e com respeito também à relação do Corinthians com CBF, Federação... Eu sou quem tem as coisas mais claras.

O que o senhor fará ou o que pensa a respeito da relação com a Odebrecht e a dívida do estádio? Há conselheiros que defendem que isso tem de ir para a Justiça. Sei que o senhor não é muito partidário dessa ideia...

Nós temos um contrato que prevê uma arbitragem. Se não houver acordo, tem de ir para arbitragem. Eu espero que solucione porque a Arena é por um lado uma grande coisa para o Corinthians. Faz diferencial, é uma arena muito bonita, uma coisa muito boa. Por outro lado, ela é também é um negócio que está inconcluso. A Arena foi feita para a Copa do Mundo de 2014, nós estamos às portas da Copa de 2018 e não conseguimos fechar as questões básicas do negócio. É uma coisa que terá de ser resolvida.

Demanda uma renegociação com a Odebrecht?

Demanda um ajuste final.

A Odebrecht alega que a Arena está pronta e não há nada que ficou por fazer.

Tudo bem, mas demanda um ajuste final do contrato. A auditoria do Corinthians alega que muitas coisas não foram feitas, outras foram feitas erradas e outras precisam ser refeitas. Neste ajuste final, quem deve dar um passo à frente é o Corinthians. É isso o que estamos vendo nesses quatro anos, da Copa do Brasil até agora, que é o Corinthians não dando um passo à frente para resolver.

Mas o que é esse passo à frente?

Fazer o ajuste final, acertar tudo. Aí é que está a dificuldade para o clube.

A Arena é pagável?

É pagável. Demanda um ajuste que deverá ser feito de alguma forma que o clube não está conseguindo fazer.

O senhor tem algum plano para os naming  rights? É um assunto que se fala muito desde a construção do estádio.

Esse assunto é desgastante, totalmente inadequado para nós. Perdemos a oportunidade de conseguir o nome do estádio antes da Copa do Mundo. Depois foi muito explorado do ponto de vista político. Toda vez que aparecia alguma dificuldade da gestão surgia que estava 99%, quase fechado. Não adianta dizer que foi a imprensa que publicou porque a divulgação vazou do clube. Nomes de empresas apareceram e tudo mais. Acho que os naming  rights é a última coisa a ser resolvida. Tem de resolver a construção, depois o financiamento da Caixa, que não se sabe como ficou e a gestão da Arena que é feita basicamente pela Omni. Resolvido tudo isso, o naming  rights fica para uma segunda etapa

Como o senhor vai tratar essa relação da Omni com o Corinthians?

A Omni é um problema porque é uma empresa que só trabalha no Corinthians. Tem uma relação com a direção que é estranha. Ela que deveria gerar recursos para pagar o estádio e isso não está ocorrendo. Isso terá de ser rediscutido. A Arena do Corinthians tem um problema. Quanto mais estiver ajustado às ideias do campeonato do mundo, uma arena moderna, mais ela produzirá de resultado. Quanto mais ela retroceder para um estádio comum que o Brasil tinha, com ingressos revendidos no câmbio negro, com aquela confusão toda, menos dará lucro. Então, está claro que a Omni não consegue fazer uma gestão modernizadora.

Que avaliação geral o senhor faz da administração do Roberto? O que ele errou, além do estádio?

Do estádio, não deu passo à frente. Existe um outro problema de um grande desequilíbrio nas contas do Corinthians. O clube sempre está mais gastando do que arrecadando. Por isso que tem de ficar antecipando, antecipando e antecipando. Isso tem muito a ver com um problema sério que o clube teve, aquela ação de crime fiscal que o clube deixou de recolher os impostos que recolhia das empresas e pessoas e de uma hora para a outra teve uma ação. Na iminência de ter problema com os diretores envolvidos, o clube saiu por aí para levantar dinheiro da Nike, da CBF, da Globo, de tudo quanto é lado para poder fazer aquele parcelamento e pagar. Este ocorrido desequilibrou as contas. Isso vem desequilibrando ano a ano.

No que o senhor pretende mudar na relação com a CBF e a Federação?

É lamentável a posição do Corinthians e dos outros clubes. A do Corinthians é lamentável. A CBF fez uma mudança estatutária onde reduziu o papel dos clubes. Não tem nenhum sentido uma entidade que congrega o futebol reduzir o papel dos clubes em prol de federações as quais a maior parte ela sustenta. O Corinthians deveria, quando saiu este novo estatuto, deixar a posição bem clara. Nós não concordamos e não vamos votar na eleição do presidente da CBF. Este estatuto não atende aos interesses do futebol. Quem deve eleger o presidente da CBF são os clubes que disputam os torneios nacionais, como ocorre no mundo inteiro. Por que vamos fazer diferente? O Corinthians tem uma força menor do que a Federação do Acre. Tem sentido? Você acha que o Corinthians representa menos para o futebol do que o Acre? O clube deveria ter uma posição sobre isso.

Na eleição passada, o senhor já defendia algo parecido, que o Corinthians deveria ter uma posição de liderança em um movimento de mudança no futebol brasileiro.

Sim. E continuo achando isso. O futebol só muda por dois caminhos. Ou muda pelo governo, pelo Estado, ou muda pelos clubes. Pela Confederação e Federações não muda nada. Nós precisamos de mudança. Isso é coisa para os clubes e para o governo.

Mas é uma coisa que dependeria da união dos clubes. Corinthians poderia ser propositivo, mas dependeria da união dos clubes. Isso é factível?

Se um clube do tamanho do Corinthians (e eu falo isso porque acho que o tamanho do Corinthians é maior)... Se um clube como o Corinthians se dispõe a um projeto de mudanças, certamente atrairá outros clubes. Os outros clubes não vão porque o Corinthians não vai. O Corinthians é, de todos os clubes, o mais solícito em atender as coisas da CBF. E isso não é de agora. Desde sempre.

O senhor tem uma noção da real situação financeira do clube?

É ruim. O problema todo aí é ter esse desequilíbrio que vem sendo compensado com adiantamentos, mas chega uma hora que isso se esgota. Vai chegar uma hora que o clube vai ter de fazer um ajuste. De uma certa forma, 2017 foi interessante. O clube não tinha dinheiro para contratar, acabou tendo de fazer a opção que fez no departamento de futebol e deu certo. As pessoas viram que é possível ter um time competitivo mesmo em uma situação de grande restrição orçamentária.

O que aconteceu em 2017 foi imponderável?

O futebol é assim. Esperamos que a nosso favor se repita outras vezes.

O que o senhor acha do elenco?

É um elenco campeão, não vamos esquecer disso. É um elenco muito curto. O time precisa de mais espaço para disputar as competições que vêm por aí.

Precisa de jogadores.

Sim, de jogadores. Precisará de mais porque há posições em que tem apenas um jogador.

A eleição do Corinthians não acontece na data errada?

Mas já foi corrigida. Será a última eleição em fevereiro. A seguinte será em dezembro.

Porque se o senhor ganhar a eleição, o time já está jogando.

Isso já foi alterado. O mandato do próximo presidente será um pouquinho mais curto.

Até que ponto o clima político do Corinthians é atrelado aos resultados dentro de campo.

Não é. Talvez uma coisa boa do Corinthians e acho que é boa porque o time treina na [Rodovia]  Ayrton Senna e joga em Itaquera. De uma certa forma, o futebol é blindado do dia a dia do clube. Isso é bom. Não é apenas bom, é necessário. É um dos poucos clubes que sabem blindar e isso não é uma coisa recente. Vem de longo tempo e é boa. Os outros clubes que falam aí tem conselheiro dando palpite para escalar, apesar de venderem uma imagem de modernidade. Nesse sentido, o Corinthians tem um procedimento que a meu ver é o mais correto.

Quando o senhor era vice de futebol, tinha um estilo provocador em alguns momentos. De comparar favoravelmente o jogador do Corinthians com o do São Paulo ou do Santos. Lembro que o senhor disse que o Gil era melhor que o Kaká...

Isso não falei.

Melhor que o Robinho também. O senhor tinha um estilo que não existe hoje...

Sabe por que não existe hoje? Porque hoje existe uma praga. São esses media  training. Todos os dirigentes respondem tudo igual. Todos os jogadores respondem tudo igual. Os assessores treinam eles e aceitam o que os assessores determinam. Eu nunca comparei jogador... Provavelmente. O futebol é também entretenimento. Você não pode querer que futebol seja uma coisa chata, carrancuda, com essas entrevistas de media  training, que não saem nada. Uma certa dose de descontração não é mau. Eu não me lembro de ter ofendido nenhum clube. Tem coisas que os outros clubes não gostam. Veja uma coisa: o São Paulo sempre vendeu o Morumbi como a oitava maravilha do mundo. Precisou chegar a Fifa na Copa do Mundo e dizer que não iria ter jogo lá. Porque não é a oitava maravilha do mundo. É um estádio que não tem estacionamento, é um estádio largo em que o campo fica longe do público... Mas ninguém falava isso. Parecia um crime. Você tinha de dizer "o grande Morumbi, o maior estádio particular do mundo, esta maravilha da engenharia". Como eu não falava isso, soava como provocação. Não tem provocação nenhuma, mas tem constatação. Outra constatação que o pessoal sempre se revolta, é que o Corinthians tem mais torcida do que o São Paulo e o Palmeiras juntos, incluindo o Santos. Por que não dizer isso? Por que tem de falar que somos do mesmo tamanho deles? Nós não somos. Nós somos maiores. Desde que de bom nível e é difícil o bom nível nessa área porque as pessoas querem xingar e ofender. Mantido o bom nível, não vejo problema em um pouco de descontração.

Eu queria saber o quanto a gente pode esperar que o presidente Citadini seja o mesmo Citadini que foi vice de futebol, neste sentido.

Mesmo sendo em situação diferente, diretor de futebol não é presidente, eu não mudo muito. Até porque, como disse, não ofendo ninguém. Não tenho dificuldade em ter relacionamento aberto com a imprensa, falando o que penso. A imprensa fala o que pensa a meu respeito e eu também falo dela. Pouca coisa mudará.

Além da crise econômica, o futebol encontra dificuldade para encontrar patrocínios como havia antigamente, com contratos mais longos...

O nosso está pior porque fizemos uma coisa difícil de entender. O clube ficou na liderança do Campeonato Brasileiro quase o tempo inteiro e sem publicidade, com todos os jogos sendo televisionados e dado grande audiência. Foi um fracasso o nosso marketing. Até porque outros tinham e nós não.

O que o senhor pretende fazer de diferente com relação a isso?

Nós precisamos trabalhar com a expectativa de grandes empresas anunciarem no Corinthians, como o Corinthians já teve. Pepsi, Samsung, tantas grandes empresas. Não tenho nada contra essas empresas pequenas aí, empresas de marketing, mas esse caminho só polui a camisa.

De vários patrocínios na camisa?

Desmerece a camisa do Corinthians esse monte de pequenas marcas. Respeito todas, mas são pequenas.

O futebol brasileiro ficou muito dependente da Caixa?

O futebol brasileiro ficou muito dependente do governo. Tudo foi dado pelo governo. O que não era a Caixa eram empresas do governo. Isso se deu porque o presidente Lula gostava de futebol e achava que era importante gastar no futebol. Hoje os clubes precisam encontrar caminho com anúncios de empresas privadas. Terá dificuldade, mas terá de achar o caminho.

O senhor acha que a presença da Odebrecht no noticiário em casos de corrupção, na Operação Lava Jato, e a relação da empresa com a arena do Corinthians atrapalha?

Atrapalha o futebol toda porque todas as arenas foram envolvidas. Todos nós pagamos um certo preço por causa dessas questões. O melhor para nós é que se esclareça o quanto antes. Mas não foi só isso. Esse episódio da Fifa e do FBI, também afetou muito o futebol.

Existe uma crise de confiança?

Existe. Um mal-estar. Tenho impressão que algumas empresas evitam. Mas precisamos recuperar isso. O caminho é colocar luz sobre os negócios dos clubes.

O que é colocar luz? Transparência?

Clarear. Quando você chega e pergunta sobre um contrato, não podem responder. Tudo isso contribui para criar um clima ruim, agravado que boa parte dos clubes criou relações promíscuas com empresários que são donos de partes de jogadores. Isso ficou uma coisa ruim.

Mas é evitável hoje em dia isso? Está em todos os clubes.

Sim, no Brasil. É evitável de eles serem sócios do clube. Dos jogadores terem seus agentes, não. É natural que discutam com clube o contrato. Mas que divida o negócio com o clube, aí acho que é evitável. O agente não deve ter uma participação no contrato.

Então se o senhor como presidente for contratar um jogador, o Corinthians terá de ter 100% desse atleta?

Especialmente os da base. É possível que em algumas situações você possa, ao contratar um jogador, o outro time ficar com uma participação. Aí eu acho que ocorre no Barcelona, em qualquer lugar. Mas os jogadores revelados pela base têm de ser 100% do clube.

Há problemas na base?

Não concordo com essa política de parcelamento dos jogadores. Queria que fossem 100% nossos, ainda que fossem menos.

O ingresso na arena é caro? O senhor acha que há a elitização do futebol?

Não. Temos de tratar de várias coisas. No caso do Corinthians, o ingresso do setor oeste, está barato. O ingresso que deveria ser mais caro, está barato. Eu comprei ingressos para o campeonato todo... Não sei se vendeu por um preço baixo porque tinha expectativa de que não faria uma boa campanha, então para vender maior número, vendeu por um preço barato. A verdade é que aquele setor pode reajustar. A gente pode ter uma audácia mantendo uma área de ingressos populares. Esse é o nosso DNA, não dá para imaginar que você vá ter só ingressos caros. Você deve trabalhar várias coisas. A primeira é por que não ter áreas mistas de torcedores? É uma coisa que o futebol precisa reencontrar. Nós estamos no pior dos mundos, os clássicos com torcida única. Quando não é torcida única, é aquela divisão horrível que os visitantes ficam enjaulados, assim como ficamos enjaulados quando vamos nos estádios deles. O clube precisava tomar a frente nisso. É inaceitável partida com uma única torcida. Isso é a morte do futebol. Se nós não conseguimos fazer jogos em que os dois torcedores possam ir, nós podemos renunciar ao futebol. Sou contra essa torcida única. Precisamos criar espaços que diminuam o clima de guerra que existe entre as torcidas. Em vários lugares você tem áreas mistas. Se a pessoa topa ir lá... Eu acho que no Corinthians temos outra coisa que precisa ser enfrentada. Não acho uma boa polícia dentro do estádio. A polícia deve ficar do lado de fora. Quem tem de fazer o controle dentro do estádio é a segurança do clube. Até para as nossas torcidas aprenderem a conviver. Você não vai esperar uma repressão policial ali e não vai poder fazer uma série de coisas porque vai prejudicar seu próprio clube. As pessoas acham que é absurdo... A PM foi quem cometeu o erro de dividir as torcidas. Se ela não tivesse inventado essa história de dividir, muito provavelmente não teria se desenvolvido essas brigas de grupos rivais. Você veja que tem um monte de coisas para a gente pensar na mudança do futebol, tanto no preço dos ingressos quanto no espetáculo.

É mais um assunto que o senhor pretende que o Corinthians tome a dianteira?

Sim. Deveria tomar a dianteira, chegar para a Secretaria de Segurança e dizer "não". As pessoas vão dizer que estamos assumindo o risco. Atualmente não assume e tem a mesma coisa de conflitos. O que precisa resolver é que tivemos coisas neste ano em matéria de torcidas que foram muito ruins. Houve oportunidade em que a polícia fez carga contra a torcida organizada. E os torcedores das outras áreas aplaudiram. Isso é uma coisa horrível para nós. Para o Corinthians e para o futebol. Como a torcida pode bater palma pelo fato de a polícia ter subido lá para  bater? Mas a torcida organizada também tem culpa porque no fundo, alguma cosia ela fez que jogou toda a torcida que não é organizada contra ela.

A torcida organizada não tem uma imagem desgastada?

Tem. Muito. Desgastou demais. Tem vários fatores aí. Ela perdeu a classe média antiga e é uma coisa que eles mesmo reconhecem. Por vários motivos. Eles alegam que foi a mídia que ficou os chamando de bandidos, mas de alguma forma nós temos esse problema que temos de resolver. É preciso ter uma relação boa das organizadas com o conjunto do clube e também precisa entenderem as limitações que elas têm. Não dá para fazer o que vem na cabeça.

Qual seria sua relação como presidente com as organizadas?

Eu acho que essa relação que está não adianta. Há um problema sério das organizadas e boa parte dos dirigentes mentem sobre ela. Todos eles têm relações porque elas ajudam em alguma coisa, ajudam em eleição, algum parlamentar... Você tem de ter uma relação aberta, pública, sem medo de falar o que estou falando. Não vejo porque não possa falar o que estou falando.

Há uma discussão em torno de organizadas e o que o clube dá. Se dá ingresso, se dá ônibus... É uma discussão antiga porque o clube sempre alega que não dá nada.

Todo mundo dá. Vou dizer porque fui diretor por quatro anos. A gente não tinha dinheiro, não dava, mas eu sei que todo mundo dá. Não culpo boa parte das coisas às torcidas organizadas. Culpo os dirigentes porque querem fazer média, vão em churrasco na quadra da torcida... Aí cria-se uma relação. É a mesma relação problemática que se tem com empresários.

Mas as organizadas não esperam que o clube dê alguma coisa?

Não sei. No passado, diziam que não. Mas de qualquer forma, ingresso não se deve dar para ninguém. Se o pobre do nosso torcedor vai lá e compra, todo mundo tem de comprar.

O estádio tem um problema que pode ter sido uma megalomania na época da construção, que é a questão dos camarotes. Estão vazios. O Corinthians administra o estádio. O que é possível fazer porque esta seria uma fonte de receitas?

Em muitos lugares, você vende ingressos individuais em camarotes. Você não precisa comprar o camarote inteiro.

Não era essa a ideia inicial.

Não era, mas como não apareceram ricos o suficiente para alugar os camarotes, não há porque não vender 25 ingressos para camarotes de 25 lugares. Mais caro, obviamente, porque estão em posição diferenciada. Faltou tudo aí para a Omni.

Tudo?

Estou vendo do ponto de vista do Corinthians.

Seus adversários na eleição previram que esta seria uma eleição muito aguerrida por causa da criação das chapinhas. O senhor foi a favor ou contra?

Eu fui a favor do fim do chapão. Era favorável à chapa proporcional. Você poderia montar uma chapa completa e eleger proporcional. As chapinhas oxigenaram o clube. Elas têm uma contribuição que estão dando no caso da eleição.

Isso não pode acarretar em um toma lá, dá cá para quem ganhar?

Não sei, sabe? Falam muito isso, que o presidente vai ter muita dificuldade. Não sei, o presidente precisa aprender a discutir com as pessoas. Uma gestão como a do Roberto teria dificuldade muito grande porque a gestão dele não falava as coisas que estavam acontecendo nem para os aliados. O sujeito chegava para uma reunião e descobria que havia coisas que nem ele sabia. Isso não vai ter mais condições de existir.

Se as chapinhas já existissem na última eleição, o senhor acha que o Roberto teria sofrido o impeachment em 2017?

Não dá para avaliar. O impeachment, na verdade, independentemente das discussões, gerou uma dissidência muito grande na "Renovação e Transparência". Nos principais departamentos do clube (o mais famoso é o Canindé) houve uma grave cisão. Vejo aí uma dificuldade grande para a situação advinda daquele processo do impeachment.

No Corinthians não há reeleição. Se o senhor vencer, como gostaria de ser lembrado ao sair do clube?

Primeiro queria ser lembrado por ganhar a eleição. Cada presidente pode dar sua contribuição. Não falo só em títulos. Como o Corinthians tem ganho muito nos últimos 20 anos, notadamente depois do meio dos anos 90, o Corinthians tem ganho bastante e todo tipo de campeonato, cada presidente pode contribuir com algumas coisas na história do clube. Eu gostaria de contribuir para o Corinthians ser um time mais ativo no futebol. Além de ganhar campeonatos, que vamos ganhar. O clube está acostumado a jogar dificuldades. Mas além disso, que o clube crescesse no conceito do futebol. Que o clube não se comportasse como pequeno, que não fala nada sobre os problemas. Em todos os problemas que o futebol brasileiro tem você nem sabe a posição do Corinthians. Esse é um retraimento. Eles dizem que não podem brigar com a federação, não podem brigar com a CBF, que vão sofrer retaliação, porque a arbitragem... Isso é tudo bobagem. Não há arbitragem que vá nos prejudicar. Nossos jogos são todos transmitidos e tem câmeras para todos os lados. Você acha que o sujeito vai entrar em esquema para prejudicar o Corinthians porque o Corinthians votou contra alguma coisa da CBF? Não. O clube tem de tomar as posições que devem tomar tem de tomar pelo bem do futebol e aceitar que ele tem tamanho para fazer isso. Temos de aceitar o nosso tamanho. Há uns dois meses, a Globo terminou uma novela das nove que foi o maior sucesso, recuperou o público das novelas, a Globo soltou rojões. O último capítulo deu 36 pontos de média, uma coisa fabulosa. Menos de duas semanas depois, teve o jogo Corinthians e Palmeiras, às 5 horas da tarde de domingo, deu uma média de 46 pontos. Não foi à noite, quando o número de televisores ligados é maior. Não podemos esquecer essa força que o futebol tem com a sociedade.

Digamos que o senhor assuma essas posições como presidente do Corinthians, assumindo esse papel de vanguarda...

Eu não gosto deste termo "vanguarda". Prefiro protagonista.

Tudo bem, protagonista. Talvez seja possível liderar um movimento de outros clubes...

Mas muitos clubes virão.

O senhor acha?

Vários clubes têm uma índole. Eles não vêm porque não está o Corinthians. Você vai fazer movimento com um clube médio, quem vai se arriscar a entrar? Não vou citar para não ofender. Tem muitos clubes médios aí rebeldes, mas que não conseguem pelo tamanho deles.

A questão era original era se o Corinthians ficasse sozinho nessa, o que o senhor faria?

Eu garanto que não ficamos sozinhos. Mas se ficarmos, em uma posição justa, não vejo dificuldades. O que o Corinthians tem a seu favor que é diferente dos outros? Se tomarmos uma posição... Por exemplo, essa que falei. Este estatuto da CBF não dá para aceitar. Não dá. "Ah, a CBF pode fazer..." Poder fazer, ela pode, mas não dá para aceitar. Ela tem de mudar a forma da eleição. Digamos que só nós falemos isso. O problema é que na sociedade, o nosso enraizamento é de tal forma que a nossa posição será majoritária na sociedade. Os outros times é que vão ter de se justificar. É isso que eu acho que é um dos erros da gestão do Roberto... E do Andrés também. O Corinthians ainda não se descobriu para o papel que tem. Isso não é novo. Eu vivi a Democracia Corintiana. Ninguém concordava. Todos os times falavam mal. Todo mundo. Por que a Democracia contribuiu tanto? Porque era no Corinthians. Se fosse feito em um outro clube, não dava nada. O Botafogo teve um jogador chamado Afonsinho, que era rebelde. O que ficou para a história? O Afonsinho era um rebelde. Não teve contribuição. A Democracia era esculhambada diariamente pela imprensa, pelo governo, pelos jornalistas... Todo mundo. Por que foi a força que foi? Porque era no Corinthians. Claro, também tinha o Sócrates. A Democracia era antes de tudo um grande time de futebol. Era verdade. Nós éramos um time que eu até hoje tenho orgulho do futebol que jogava. Mas tinha apoio. As pessoas apoiavam e que deixou muito mal os outros. Deixou muito mal São Paulo, Palmeiras, Santos, esses que ficavam paparicando o governo.

Mas se o senhor tiver essa mesma posição e o Corinthians não for campeão ou passar um ano sem ser campeão... O impacto é outro?

Não sei. A Democracia perdeu o título nacional. Ganhou dois paulistas, mas perdeu o nacional em um jogo ruim de se lembrar com o Fluminense, que foi campeão. Você vai dizer que a Democracia não foi importante porque não conseguiu ir para Tóquio? Não. Ficou na história como um movimento importante na história do Corinthians. A gente precisa acreditar nisso.

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