Desde 1986, quando não comprou os direitos para a final entre Guarani e São Paulo, o Grupo Globo sempre transmitiu o jogo decisivo do Campeonato Brasileiro. Isso pode não acontecer em 2019.
Dos 20 clubes que hoje estão na Série A do torneio nacional, três estão em negociação com a emissora para renovar pelos jogos em TV aberta e PPV (pay-per-view) para os próximos cinco anos.
Sete clubes assinaram acordos com o Esporte Interativo, emissora que pertence ao Grupo Turner, para as transmissões em TV fechada.
É a maior ameaça à hegemonia da Globo no futebol brasileiro desde 1987, quando o canal fechou contrato com o então recém-criado Clube dos 13 (grupo que reunia as 16 principais equipes do país) e mostrou o torneio com exclusividade.
Consideradas as equipes na elite neste ano, Atlético-PR, Bahia e Palmeiras ainda não assinaram com a Globo para TV aberta e PPV. As negociações estão em andamento porque as equipes não aceitam a oferta, com reduções de 20% (para TV aberta) e 5,2% (em PPV, por jogo).
O corte nos valores é por terem acertado com o Esporte Interativo em TV fechada.
"Embora um clube possa efetivamente vender direitos de mídia separadamente, é inegável que uma mídia pode afetar o valor da outra", justifica Fernando Manuel Pinto, diretor de Direitos Esportivos do Grupo Globo.
Segundo o executivo, os redutores, não obrigatórios, serão aplicados se um clube não garantir os direitos que também valem para os outros, que assinaram em todas as plataformas com a Globo.
As decisões dessas equipes de aceitarem a oferta da Turner limitam a capacidade da Globo de manejar as transmissões. Como o Esporte Interativo dificilmente vai abrir mão dos jogos a que tem direito, a Globo teria uma desculpa para aplicar o redutor.
"Similar à compra de carro usado que contenha uma avaria ou [esteja] amassado. Se você quer o carro, o que faz? Aplica-se um desconto, ou não?", compara Pinto.
Nas primeiras 12 rodadas do Brasileiro deste ano (quando haverá a interrupção para a Copa do Mundo), por exemplo, o SporTV selecionou 24 partidas para serem transmitidas. Não poderia mostrar 16 delas se fossem em 2019.
O artigo 42 da Lei Pelé diz que os direitos de transmissão dos jogos pertencem aos dois times envolvidos.
Se Atlético-PR, Bahia e Palmeiras baterem o pé e não aceitarem o que a Globo propõe, privariam a emissora de 108 dos 380 jogos na TV aberta e PPV, que tem como seu principal atrativo de venda a oferta ao torcedor de todas as partidas de sua equipe.
Em TV fechada, a oferta de partidas será maior, mas, considerando os clubes que estão na Série A neste ano, a gama de opções para o Grupo Globo escolher os jogos a serem mostrados e em quais plataformas será menor.
O Esporte Interativo hoje teria direito a transmitir 42 partidas. O SporTV, 156. Do total, 182 jogos não poderiam ser mostrados por nenhuma emissora em TV fechada. O canal do Grupo Globo pode levar ao ar dois confrontos por rodada. Poderá continuar fazendo isso, mas terá a liberdade de escolha restrita.
A restrição pode ficar maior ou menor dependendo dos rebaixados e promovidos à Série A neste ano. Dos 20 clubes da Série B, o Esporte Interativo fechou com Coritiba, Criciúma, Figueirense, Fortaleza, Paysandu, Ponte Preta e Sampaio Corrêa. Os outros 13 assinaram com a Globo.
A emissora do grupo Turner ofereceu R$ 520 milhões anuais de 2019 a 2024. Do total, R$ 260 milhões serão divididos igualmente entre os clubes, R$ 130 milhões pela classificação no campeonato e outros R$ 130 milhões de acordo com a exposição.
"A força da nossa audiência na TV e nas plataformas digitais vai ajudar a valorizar mais um campeonato que é tão importante para o apaixonado por esportes", afirma Leo Lenz Cesar, vice-presidente de esportes da Turner.
Para a TV fechada, segundo apurou a Folha, o SporTV propôs R$ 500 milhões, partilhados pelas agremiações.
Na aberta, a Globo oferece R$ 600 milhões por ano, sendo R$ 240 milhões divididos de forma uniforme, R$ 180 milhões pela classificação e R$ 180 milhões pela quantidade de jogos transmitidos.
O valor a ser pago no PPV não está definido. A oferta é que dos 100% arrecadados com a venda de assinaturas, 38% sejam repartidos entre os clubes de acordo com pesquisa de torcedores que compraram o serviço.
O time com mais assinantes, receberá mais. Existe valor mínimo a ser pago, que varia de clube para clube. Corinthians e Flamengo assinaram por cerca de R$ 120 milhões por ano, cada.
A reportagem tentou falar com Atlético-PR, Bahia e Palmeiras sobre o assunto, mas não obteve resposta. Por motivos de sigilo contratual, Globo e Esporte Interativo não comentam oficialmente os valores pagos aos clubes.
Até 1987, a Globo fazia as transmissões do Campeonato Brasileiro, mas a negociação ocorria jogo a jogo.
A final de 1986, por exemplo, teve exclusividade da extinta Rede Manchete.
Em 1991, o Grupo Globo fechou um pacote para mostrar ao vivo 25 partidas, mas a Rede Bandeirantes também investia nas transmissões.
Concorrentes como SBT, Record e RedeTV! tentaram a compra dos direitos do Brasileiro, mas nunca conseguiram convencer os clubes.
A Globo passou a ter exclusividade em 1997, negociando com o Clube dos 13. Em alguns anos, cedeu jogos para a Bandeirantes. A entidade que reunia as equipes acabou em 2011, quando houve racha nas negociações de transmissão. A partir daí, a Globo passou a tratar com os clubes.
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