Descrição de chapéu Marco Polo Del Nero

Sem mostrar propostas, Caboclo será aclamado presidente da CBF

Indicado por Del Nero, dirigente obteve apoio da maioria das federações

Sérgio Rangel
Rio de Janeiro

Ele é desconhecido do torcedor, não foi presidente de clube ou federação e nunca apresentou publicamente os seus projetos para comandar o futebol brasileiro. Ao registrar a sua chapa, também não teve o apoio dos dois times mais populares do país (Flamengo e Corinthians) e das principais federações do Brasil (Rio e São Paulo).

Mesmo assim, o paulista Rogério Caboclo, 45, será eleito nesta terça (17) presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) para comandar a entidade até 2022. 

Para conseguir o apoio de 25 das 27 federações e da maioria dos clubes das séries A e B do Campeonato Brasileiro, Caboclo se apresenta como herdeiro político de Marco Polo Del Nero, presidente afastado da entidade.

Del Nero é acusado pelo FBI de receber propina na venda de direitos de torneios e deve ser banido pela Fifa até o final do mês. 

Apesar dos problemas no exterior, o dirigente afastado permanece com o prestígio intacto com os presidentes de federações estaduais.

Nos raros encontros com os jornalistas, o futuro presidente Caboclo também elogiava o seu mentor.

Atual diretor-executivo de gestão da entidade, ele fez campanha nos bastidores nos últimos meses, sem se expor.

Até ser escolhido por Del Nero, Caboclo era criticado pela maioria dos cartolas, que o acusavam de ser duro nas negociações para liberar verbas. Com o aval de seu tutor, foi apoiado pela maioria.

“O Marco Polo fez uma verdadeira revolução de gestão na CBF. Por isso, acho justo o Caboclo dar continuidade a esse trabalho”, disse o presidente da Federação Tocantinense de Futebol, Leomar Quintanilha, um dos 25 que apoiam o candidato único.

Por causa do estatuto da entidade, uma chapa para concorrer na eleição da CBF precisa ter o apoio de oito federações e cinco clubes.

Responsável por controlar o caixa da entidade, Caboclo inviabilizou candidaturas adversárias com o apoio das federações estaduais.

A CBF distribui para cada federação R$ 75 mil pelo PAF (Programa de Assistência às Federações), chamado de “mensalinho” pelos cartolas. 

Já os presidentes de cada entidade ganham R$ 20 mil por mês da CBF. 

O diretor executivo de gestão da CBF,  Rogério Caboclo
O diretor executivo de gestão da CBF, Rogério Caboclo - Lucas Figueiredo/CBF/Divulgação

DUPLA COM DEL NERO

Nascido em São Paulo, Caboclo é advogado e administrador de empresas. 

Ele começou a carreira de cartola aos 26 anos, quando passou a integrar o Conselho Deliberativo do São Paulo. 

A parceria com Del Nero se iniciou em 2002, quando Caboclo entrou na Federação Paulista de Futebol, da qual foi vice-presidente.

Com a indicação do presidente afastado da CBF, foi diretor do Comitê Organizador da Copa de 2014. Ele passou a fazer parte da CBF em 2015. Atualmente, é também CEO da organização da Copa América 2019, que será no Brasil.

“O fato de o Caboclo nunca ter comandado uma federação não depõe contra a candidatura dele. O Ricardo Teixeira também não era [presidente de federação]. Ele pegou a CBF falida e transformou nesta entidade milionária”, disse o alagoano Gustavo Feijó, que se declarou um dos “cabeças da campanha” de Caboclo na confederação.

Teixeira deixou o comando da CBF em 2012 depois de duas décadas no poder. Assim como Del Nero e José Maria Marin, que está preso, ele é acusado nos EUA também de receber propina em troca da venda de direitos de torneios no país e no exterior.

Feijó foi presidente da Federação Alagoana de Futebol e será um dos vices da chapa única. Prefeito licenciado de Boca da Mata, ele é investigado pela Polícia Federal por suposto esquema de caixa 2 ainda durante sua campanha eleitoral em 2012. 

Segundo as investigações, o cartola recebeu R$ 200 mil da confederação sem que os recursos tivessem sido declarados à Justiça Eleitoral.

Além de Feijó, os outros três vice-presidentes de Del Nero (o empresário Fernando Sarney, o deputado federal capixaba Marcus Vicente e o cartola paraense coronel Nunes) permanecerão na administração de Caboclo.

Após mudar o estatuto, o novo mandato terá mais quatro vices. Caboclo convidou quatro presidentes de federações em troca da maioria no colégio eleitoral. O acreano Antonio Aquino Lopes, o Toniquim, o gaúcho Francisco Novelletto, o baiano Ednaldo Rodrigues e o mineiro Castelar Neto serão os novos vices.

Presidente da CPI do Futebol, que investigou a entidade, o senador Romário (Podemos-RJ) classificou a eleição de barbaridade e disse que Caboclo “será pau-mandado de Del Nero”.

“Lamentavelmente, o futebol continua na contramão da renovação, da modernidade e da transparência. Como escrevi no relatório da CPI do Futebol, o crime organizado no futebol brasileiro tem endereço conhecido, assim como os membros da quadrilha que lá atuam”, disse Romário sobre a eleição na CBF.

Promotoria pede que eleição seja suspensa

O Tribunal de Justiça do Rio pode suspender nesta terça a eleição da CBF. O juiz Bruno Ruliere vai analisar o pedido do promotor Rodrigo Terra, que contesta a mudança do estatuto da entidade, feita em 2017. 

Na ocasião, as federações se reuniram numa assembleia e alteraram o colégio eleitoral da CBF, que havia ganho a participação dos 20 clubes da Série B do Brasileiro.

Sem consultar os times, as federações criaram o sistema de pesos. Os votos das federações têm peso 3, os dos clubes da Série A têm peso 2 e os da Série B têm peso 1.

Com essa nova distribuição de votos, as 27 federações permanecem com a maioria —81 votos contra 60 dos clubes.

“A assembleia administrativa não poderia ter deliberado sobre assunto eleitoral”, disse Terra.
A ata da reunião requisitada pelo juiz foi entregue na sexta (13). A eleição está marcada para o início da tarde na sede da entidade, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio.

O presidente do Flamengo, Eduardo Bandeira de Mello, disse que não votará em Caboclo.

“Somos contra a condução do processo. Tínhamos lutando para a entrada dos clubes da Série B no colégio eleitoral, o que infelizmente foi alterado pela mudança do estatuto sem a nossa participação”, afirmou. 

Desde 1986, quando Otávio Pinto Guimarães venceu uma disputa apertada pelo comando da CBF, as eleições da entidade são realizadas com candidato único. Antes  disso, Giulite Coutinho comandou a entidade por dois mandatos. A CBF foi criada em 1979. Até então, a entidade se chamava CBD (Confederação Brasileira de Desportos).

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