Descrição de chapéu Copa do Mundo

Confronto entre Portugal e Marrocos, agora na Copa, ecoa mito lusitano

Batalha entre os países, em 1578, é central na identidade portuguesa

Treino da seleção do Marrocos, nesta terça (19) - AFP
Moscou

Jogos de Copa do Mundo usualmente são apenas isso, partidas de futebol em níveis variáveis. Mas algumas ecoam conflitos, atuais ou antigos, como é o caso do embate desta quarta (20) entre Portugal e Marrocos, que ocorrerá às 9h (horário de Brasília) no estádio Lujniki, em Moscou.

Os dois países se enfrentaram de forma menos figurativa na famosa batalha de Alcácer Quibir, em 1578. Uma escaramuça que levou aproximadamente quatro horas marcou para sempre a história portuguesa, sendo definidora de vários traços de sua identidade nacional.

Alcácer Quibir é o nome português de uma localidade no norte de Marrocos, Ksar el-Kibir. O rei português dom Sebastião 1º estava preocupado com a infiltração de forças do Império Otomano no norte da África, especialmente no Marrocos, de onde navios poderiam ameaçar as rotas comerciais entre Lisboa e suas colônias, como o Brasil.

Embora houvesse um tom de cautela na corte, dom Sebastião acabou levado à guerra quando Abu Abdallah Mohammed 2º o procurou. Sultão deposto pelo seu tio, Abd al-Malik 1º, ele queria a ajuda das forças portuguesas para retomar o trono. Em troca, prometia se livrar da presença turca em solo marroquino. De 1568 a 1574 houve investidas bem sucedidas dos portugueses contra posições costeiras no país africano, que levaram ao planejamento de uma invasão.

Sebastião montou uma grande armada e juntou cerca de 23 mil homens, entre portugueses, mercenários europeus e uma tropa de mouros aliados a Abu Abdallah. Ela se encontrou no dia 4 de agosto de 1578 em Alcácer Quibir com as tropas do sultão Malik —algo entre 50 mil e 60 mil soldados, segundo estimativas pouco precisas. O resultado militar foi desastroso: 8.000 foram invasores foram mortos, e os restantes, aprisionados.

O rei português morreu com apenas 24 anos, mas seu corpo nunca foi encontrado, dando início a uma lenda que influencia a psiquê lusitana desde então: a da volta triunfal do monarca, para resgatar o passado glorioso da pequena nação que virou um império marítimo. O dito sebastianismo começou justamente porque a morte do rei marcou o declínio daquela que foi, na definição do historiador britânico Roger Crowley, a primeira potência global.

Com a morte de Sebastião, que não tinha filhos, a crise sucessória na casa de Aviz se instalou. O resultado foi a incorporação de Portugal à Espanha, de 1580 a 1640, um episódio traumático na história lusitana. O sebastianismo se tornou força por trás da expressão do sentimento nacional português, a saudade, e influenciou decisivamente a cultura do país. Ele está no fado, a lacrimosa música que simboliza Portugal, e permeia a obra do poeta maior lusitano, Fernando Pessoa —seu livro “Mensagem” é uma ode à crença no retorno ao passado.

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