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Passagem pelo futebol árabe rende histórias curiosas para brasileiros

Altos salários atraem jogadores e técnicos apesar de choque cultural

Luciano Trindade Toni Assis
São Paulo | Agora

Imagine-se sob a mira de um guepardo sem coleira enquanto discute com o dono de um clube a falta de pagamento de seu salário. Ou ser convidado para corrida de camelos sob o sol escaldante do deserto.

Em campo, você pode ser surpreendido por uma tempestade de areia. Ou ainda passar a noite preso e correr risco de ser expulso do país por fabricar e ingerir bebida alcoólica.

Essas e outras histórias inusitadas foram vivenciadas por atletas e treinadores que se transferiram para países árabes. O ex-centroavante Rodrigão, que defendeu Palmeiras e Santos, e nomes como Pepe, Rivellino e Vampeta passaram por situações assim.

Pouco antes da Copa do Mundo da Rússia, cartolas da Arábia Saudita abriram os cofres para contratar Fábio Carille, 44, que iniciou nesta semana seu trabalho no país. Auxiliar de Tite no Corinthians, ele ganhou projeção ao sair do anonimato nas duas últimas temporadas.

 

Em dois anos, Carille conquistou um Brasileiro e dois Paulistas à frente do Corinthians. O desempenho despertou o interesse do Al-Wehda. A compensação por trabalhar em um lugar tão distante está na parte financeira. O treinador receberá pouco mais de R$ 1 milhão mensal por dois anos de contrato.

Ex-técnicos e jogadores brasileiros que passaram pelo futebol dos países árabes acreditam que Carille pode brilhar novamente nesse novo desafio.

Com autoridade por ter vencido quatro torneios em cinco disputados como treinador no Qatar, Pepe afirma que um fator determinante para o ex-corintiano será a comunicação.

"Ele tem que dominar o inglês. O idioma é fundamental. Na minha época levei o meu filho para me auxiliar. Ele falava inglês muito bem e tudo ficou mais fácil." O ex-ponta do Santos disse também que a cobrança é proporcional ao salário que o treinador ganha quando deixa o Brasil.

"Eles observam tudo. Apostam em técnicos estudiosos, gostam de treinamentos táticos. O Carille é um técnico de muito futuro e tenho certeza de que vai ser dar bem", declarou.

Rivellino, maior camisa dez da história corintiana, aprova a decisão do treinador. "Ele está indo no momento certo. O mundo árabe hoje tem mais abertura do que na minha época, e o Carille tem tudo para fazer um bom trabalho", afirmou o ex-meia, que defendeu o El-Helal.

Com passagem pelo Kuait, Vampeta acredita que Carille trilhará o caminho de técnicos consagrados."O Zagallo, o Parreira e o Joel Santana trabalharam lá e se tornaram referências. O Carille fez o certo, até porque deram muito dinheiro", disse.

Já Rodrigão alerta para a possibilidade de choque cultural. "A discriminação contra a mulher é grande. Elas não vão aos estádios. Os príncipes fazem as leis de acordo com a sua vontade. Mas a parte esportiva vai ser compensadora", afirmou o ex-jogador.

Atacante Carlos Eduardo, do Al-Hilal, segura leão, presente de seu clube na Arábia Saudita
Atacante Carlos Eduardo, do Al-Hilal, segura leão, presente de seu clube na Arábia Saudita - Arquivo pessoal

Histórias curiosas

Carlos Eduardo, 28

O atacante acostumou-se a receber presentes da torcida do Al-Hilal, como uma vez em que ganhou um relógio que um fã tirou do próprio pulso em um restaurante e lhe deu. “Ele insistiu tanto que eu peguei o relógio.” Mas teve um presente com qual não pôde fazer o mesmo. Contente com o desempenho do jogador, autor de 18 gols em 32 jogos na sua primeira temporada, em 2015/16, um príncipe dono do clube deu ao brasileiro um leão. Não de pelúcia. De verdade mesmo. “Não tinha como eu ficar com ele, mesmo sendo filhote, pequeno, ele destruía tudo”, contou, aos risos

Rodrigão, 40

Há quase duas semanas sem ver a cor do dinheiro das luvas que haviam sido acordadas com o príncipe, Rodrigão decidiu não aparecer no treino sob orientação de seu empresário. O resultado da falta foi uma reunião com o todo-poderoso do clube. No local se instalou um front de batalha. De um lado, Rodrigão e seu intérprete. Do outro, o príncipe acompanhado de um guepardo de estimação. O saldo do encontro foi que Rodrigão se ajoelhou, pediu desculpa pela ausência no treino e ainda foi multado em 20% de seu salário

Vampeta, 44

Vampeta estava incomodado com a proibição de bebida alcoólica no Kuait. Até que um dia ele foi a uma festa em que a birita estava liberada. Rapidamente, ele se enturmou com o dono do local e aprendeu a fabricar vinho. Em um belo dia, quando ia para a festa levando um galão de 5 litros da bebida no carro, o volante foi parado pela polícia. Ao ser desmascarado, acabou preso e passou 36 horas no xadrez. Foi submetido a exame, mas nada de álcool foi detectado. Só não foi expulso do país porque, segundo o próprio, ele estava indo para a festa e, portanto, não tinha bebido nada

Edu Coimbra, 71

Edu dirigia o Al-Rasheed, time de Uday Houssein, filho do ditador iraquiano Saddam Houssein. Num jogo contra a melhor equipe do país, o Al-Rasheed vencia por 1 a 0 quando o zagueiro e capitão do time foi expulso. Uday mandou a equipe sair de campo. Edu não permitiu e brigou com o chefe. Para a sorte dele, o brasileiro escapou de uma punição. Edu não sabia, mas quem não obedecesse o filho de Saddam ia para um paredão com um leque de punições, como dar um tiro no pé de um atleta que perdesse um gol feito ou sumir com os jogadores

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