Eleição de Caboclo na CBF corre risco de ser anulada pela Justiça

Ministério Público questiona mudança no colégio eleitoral da entidade

Sérgio Rangel
Rio de Janeiro

​A eleição de Rogério Caboclo para presidente da CBF corre risco de ser anulada. Até o final do mês, uma ação proposta pelo Ministério Público que contesta mudança no colégio eleitoral da entidade poderá ser destravada no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e desencadear na anulação do pleito realizado em abril.

O Ministério Público argumenta que a confederação não respeitou os princípios de publicidade e transparência, previstos no Estatuto do Torcedor, já que os clubes da Série A não foram convocados para a assembleia que reduziu sua representatividade nas eleições da entidade.

A CBF, no entanto, entrou com recurso na Justiça alegando que o Estatuto do Torcedor não pode ser aplicado para questionar mudanças estatutárias, como alteração no colégio eleitoral.

Na última quinta-feira (1º), o desembargador Juarez Fernandes Folhes determinou que a 19ª Câmara Cível julgue o recurso da CBF. O caso deverá ser apreciado no dia 27 de novembro.

Se os desembargadores entenderem que o estatuto se aplica às práticas da CBF, a questão será encaminhada para o Juizado do Torcedor. Depois disso, a ação deve ser julgada em até uma semana.

O Ministério Público alega também que a inclusão de pesos diferentes no pleito foi uma forma de o atual grupo político que comanda a CBF manter o poder das federações na eleição.

Isso entraria em conflito com o objetivo da legislação que obrigou a participação dos clubes da Série B na eleição: dar maior protagonismo às agremiações na entidade.

Em nota enviada à Folha, a CBF afirmou que tem autonomia constitucional de gestão, lembrou que chapa de Caboclo foi eleita com 95,7% dos votos, uma “maioria incontestável”, e disse que confia plenamente na Justiça.

A entidade diz também que a ação do MP não contesta a eleição, mas a assembleia realizada em 2017, que mudou seu colégio eleitoral.

Em março do ano passado, a CBF incluiu os 20 clubes da Série B do Campeonato Brasileiro no seu colégio eleitoral, mas sem reduzir a participação das federações. Isso numa reunião que contou apenas com representantes das entidades estaduais.

Mensalmente, cada federação recebe R$ 75 mil dos cofres da entidade, que tem Caboclo como principal executivo atualmente.

Para formar a sua chapa, Caboclo colocou apenas cartolas ligados às federações. Ele deixou os clubes e personalidades do esporte fora da sua chapa.

A lista de vices conta até com dirigentes folclóricos, como o presidente da Federação de Futebol do Acre, Antônio Aquino Lopes, o Toniquim. Ele comanda o modesto futebol da sua região desde 1984.

Com o apoio de 25 das 27 federações ao homologar sua chapa, ele inviabilizou a oposição. Para registrar candidatura na CBF, o postulante ao cargo precisa ter o apoio de oito federações e cinco clubes.

Candidato único na eleição da CBF, o paulista venceu com facilidade. Apenas Corinthians, Flamengo e Atlético-PR não votaram em Caboclo.

O futuro presidente da CBF obteve a vitória após receber o apoio de Marco Polo Del Nero, afastado o comando da entidade desde dezembro. Sem chance de continuar no comando da CBF, Del Nero apressou o processo para fazer o seu substituto.

Acusado pelo FBI de receber propina na venda de direitos de torneios, o ex-presidente da entidade foi banido pela Fifa logo após a vitória de Caboclo. Ele nega as acusações.

Se o Ministério Público conseguir que os clubes sejam maioria no pleito, a CBF terá que realizar nova eleição. A entidade terá até abril, quando termina o atual mandato, para escolher o seu novo comandante.

Enquanto isso, a confederação é comandada pelo paraense Antonio Carlos Nunes, vice de Del Nero.

Em caso de nova eleição, Caboclo deverá enfrentar um adversário indicado pelos clubes.

O presidente da Federação Paulista de Futebol, Reinaldo Carneiro Bastos, tentou viabilizar sua candidatura no início do ano para concorrer com Caboclo, mas não teve sucesso na ocasião.

Leia abaixo a nota da CBF:

1. A ação não contesta a eleição da CBF, realizada em 16 de abril de 2018. Ela contesta uma Assembleia Administrativa, realizada mais de um ano antes, em março de 2017, que alterou diversos pontos do estatuto da CBF  e não teve interferência no resultado do processo eleitoral.

2. A CBF não argumenta que o Estatuto do Torcedor não se aplica às suas normas internas. Ao contrário, a entidade cumpriu estritamente as determinações da lei.

3. A Lei Pelé prevê diferentes pesos nas eleições de entidades esportivas.

4. A mudança no estatuto não aumentou o peso das federações. Pela regra anterior, elas tinham 27 de 47 votos, ou 57,4% do total. Na regra nova, elas têm 81 de 141 votos possíveis. Os mesmos 57,4%.

5. A ação não contesta a regra de cláusula de barreira, que existe há décadas na CBF. Por essa regra, para se inscrever uma chapa precisa ter o apoio de 8 das 27 federações e 5 dos 40 clubes das séries A e B. A única chapa apresentada obteve apoio de 25 federações e 37 dos 40 clubes.

6. A chapa foi eleita com 95,7% dos votos possíveis, numa maioria incontestável.

7. A CBF tem autonomia constitucional de gestão e confia plenamente na Justiça.

Relembre a eleição de Rogério Caboclo

Colégio eleitoral
Obrigada por lei a incluir clubes da Série B, a CBF faz em 23.mar.2017 assembleia sem convocar clubes da Série A e muda o peso dos votos, mantendo representatividade das federações

Banimento de Del Nero
Presidente da CBF é banido provisoriamente pela Fifa em 17.dez.2017. Logo depois, começa a articular a eleição de Rogério Caboclo, então diretor-executivo de gestão

Oposição abafada
Em março, o presidente da Federação Paulista de Futebol, Reinaldo Carneiro Bastos, tenta articular candidatura de oposição, mas Caboclo e Del Nero conseguem apoio de 25 federações e inviabilizam inscrição da chapa rival

Eleição
Candidato único, Caboclo é eleito presidente da CBF em 17.abr.2018 com 135 de 141 votos possíveis (Corinthians, Flamengo e Atlético-PR não votam nele) para mandato de quatro anos, começando em abril de 2019. O Ministério Público tenta suspender o pleito contestando a mudança do colégio eleitoral em assembleia sem a presença dos clubes, mas não consegue

Banimento definitivo
Dez dias depois da eleição, em 27.abr.2018, Del Nero é banido do futebol em definitivo pela Fifa

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