CBF não exigiu garantias de grupo que prometeu pagar R$ 550 mi a clubes

Empresa ganhou direitos de TV do Brasileiro no exterior após licitação da confederação

Diego Garcia Sérgio Rangel
São Paulo e Rio de Janeiro

Detentora de um contrato de R$ 550 milhões com a CBF e 18 clubes da Série A do Brasileiro, a BR Foot Mídia não precisou apresentar garantias financeiras de que poderia arcar com os seus compromissos para ganhar a licitação organizada pela confederação.

A empresa ainda não pagou prêmio R$ 100 milhões pela assinatura dos acordos de venda dos direitos internacionais de transmissão e para exploração das placas de publicidade do Nacional de 2019 a 2022. O pagamento era previsto para o dia 1º de dezembro

Segundo o contrato assinado pelos clubes, ao qual a Folha teve acesso, a BR Foot Mídia deve apresentar somente em 10 de janeiro de 2019, 2020, 2021 e 2022 três garantias de que consegue pagar os valores prometidos para cada temporada na concorrência. As luvas de R$ 100 milhões não têm garantia de quitação.

Para o advogado Bruno Fagali, especialista em licitações e compliance empresarial, é incomum que uma garantia financeira não seja apresentada nesse tipo de operação.

“O que se espera de qualquer empresa que esteja realizando uma contratação com grande vulto financeiro envolvido é que esta exija, no momento de celebração do contrato, e como condição para tanto, que a contratada apresente as garantias mínimas de seu cumprimento, na forma estipulada expressamente em contrato e já previamente fixada durante o período de negociação ou de disputa de propostas”, disse o advogado.

Sobre o caso da BR Foot Mídia, após análise dos contratos, aos quais a Folha teve acesso, Fagali entende que a CBF conduziu a licitação com imprudência e acredita que os responsáveis devem ser investigados e punidos com as demais medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis, “tanto por tal negligência quanto pelo descumprimento contratual da empresa contratada”.

“Entendo que a contratante foi extremamente imprudente e não profissional, não tendo cuidado da situação de modo profissional, eficiente e adequado às melhores práticas de governança corporativa”, disse o advogado, relembrando o Código de Ética lançado pela própria entidade.

A CBF disse à reportagem que a empresa vencedora do processo apresentou aos clubes todas as garantias para a efetivação do negócio, e que o contrato assinado contém todas as proteções para as partes signatárias. Acrescentou ainda que a empresa, escolhida pelos clubes, demonstrou todas as condições técnicas e garantias econômicas para o cumprimento do contrato. 

Clubes que conversaram com a Folha dizem que as garantias financeiras não foram mostradas no processo de concorrência promovido pela CBF. As únicas são as que estão no contrato, que só devem ser apresentadas a partir de 2019. Os times apontaram que também desconheciam as estratégias operacionais da empresa.

A BR Foot Mídia, por sua vez, disse que está em dia com suas obrigações contratuais.

Em agosto, Hélio Viana, empresário ex-sócio de Pelé que intermediou oferta do fundo luxemburguês Prudent —que contava com o apoio de Flamengo, Corinthians e Athletico-PR—, já havia questionado a liquidez da BR Foot Mídia.

A empresa de Luxemburgo havia oferecido US$ 200 milhões (R$ 800 milhões), mais participação nos lucros obtidos com as vendas, por 10 anos de acordo. A CBF não quis ouvir a oferta alegando que a licitação já estava encerrada, apesar de o contrato só ter sido assinado depois.

A licitação da CBF contou com a participação de empresas reconhecidas internacionalmente, como a francesa Lagardère —com mais de 1.600 funcionários e 50 anos de experiência no esporte; e as americanas Octagon, que representa centenas de atletas e gerencia 13 mil eventos por ano, e IMG, com escritórios em mais de 30 países.

Apesar de ter assinado os contratos, a BR Foot Mídia não participou da licitação. Quem venceu a concorrência foi a BR Newmedia, que antes era uma empresa do ramo de móveis. O secretário-geral da CBF, Walter Feldman, disse que os componentes da oferta eram os mesmos e que a mudança foi resultado de um “aperfeiçoamento” da proposta.

Entre as concorrentes na licitação, a BR Foot Mídia foi a única que ofereceu luvas imediatas, razão pela qual as equipes optaram pela empresa. As demais ofertas baseavam-se principalmente na divisão dos lucros com os times.

Segundo estudo apresentado pelo Flamengo —que, assim como o Athletico-PR, não assinou contrato com a empresa—, em 10 anos de acordo os direitos internacionais de transmissão poderiam render até US$ 3 bilhões (R$ 12 bilhões). Em quatro anos, seriam US$ 4,8 bilhões.

Os contratos entre CBF, clubes e BR Foot Mídia previam que o pagamento deveria ser feito até 60 dias após o acordo. A CBF anunciou a parceira em 27 de setembro, por meio de seu site oficial, e disse à Folha que a empresa se comprometeu a pagar as luvas pela assinatura até o dia 1º de dezembro, o que não aconteceu.

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