Após vencer licitação da CBF, empresa não paga R$ 100 milhões aos clubes

BR Foot Mídia não fez depósito para pagar luvas do contrato e agora briga com confederação

Diego Garcia Sérgio Rangel
São Paulo e Rio de Janeiro

A BR Foot Mídia, empresa que venceu, sem concorrer, uma licitação promovida pela CBF pelos direitos de transmissão internacional e exploração das placas de publicidade do Campeonato Brasileiro entre 2019 e 2022, não pagou aos clubes um adiantamento de R$ 100 milhões previsto no acordo.

O contrato determinava que a quantia deveria ter sido paga no máximo até 1º de dezembro, mas isso não aconteceu.

Sem conseguir o dinheiro, a BR Foot Mídia notificou a CBF extrajudicialmente questionando o que entendeu serem problemas contratuais, segundo informaram à Folha fontes ligadas à operação. A empresa agora tenta rescindir o acordo, o que foi vetado pela confederação, uma vez que os documentos já estão assinados e os pagamentos devem ser feitos, por força de contrato.

Em seus argumentos, a empresa diz que a entidade vendeu direitos que já eram da TV Globo, que tem o pay-per-view no exterior, e não incluiu os 20 clubes da Série A do Nacional no acordo. As reclamações, porém, já eram conhecidas pelos envolvidos nas operações.

Em agosto, semanas antes de a CBF anunciar o acordo com a BR Foot Mídia, a Folha já havia noticiado que existiam queixas por imposições feitas pela Globo no acordo de cessão dos direitos internacionais e para a venda das placas de publicidade.

Já quando o negócio entre empresa e confederação foi anunciado, em 27 de setembro, a BR Foot Mídia aceitou assinar o contrato já sem os 20 clubes, uma vez que Flamengo e Atlético-PR ficaram fora. O Corinthians recusou apenas a oferta de exploração das placas de publicidade, aceitando a de direitos de TV.

Folha também publicou que a empresa que assinou o acordo era diferente da que havia participado da licitação, que era uma empresa de móveis, e que a BR Foot Mídia foi vendida a um fundo em paraíso fiscal.  Segundo o UOL, a empresa questionava a CBF pelo vazamento de informações da licitação à Folha. 

Presidente do Corinthians, Andrés Sanchez tem dúvidas de que algum clube vá embolsar a quantia prometida pela BR Foot Mídia. “Nem vai receber, o Corinthians e nem ninguém. Eu não acredito”, afirmou o dirigente. 

Robinson de Castro, presidente do Ceará, é outro que disse ainda não ter visto o dinheiro. “Até agora, nada”, afirmou. “O Grêmio não recebeu nada ainda, era no começo de dezembro”, acrescentou Romildo Bolzan Júnior.

Chapecoense, Santos, Vasco e mais dois clubes também confirmaram à Folha não terem recebido. Eles contavam com o dinheiro para fechar as contas de fim de ano.

A reportagem teve acesso a contratos enviados pela CBF aos clubes. Pelo documento, se a BR Foot Mídia não fizesse o depósito das luvas em até 60 dias após a assinatura, seus direitos ficariam suspensos. 

A empresa também seria penalizada com multas —uma delas já fixada em R$ 250 mil no caso do acordo pelos direitos internacionais—, além de cobrança judicial da dívida, bem como das perdas e danos e lucros cessantes a que o inadimplemento der causa.

Procurada pela reportagem, a BR Foot Mídia disse apenas que “está em dia com suas obrigações contratuais”. 

Em setembro, a empresa foi vendida ao fundo Futbol Holdings LLC, com sede no paraíso fiscal de Delaware (EUA). O local é considerado o território com a jurisdição mais sigilosa do mundo, o que impede que a reportagem tenha acesso aos donos da empresa.

Apesar de assinar os documentos, a BR Foot Mídia não participou da licitação organizada pela CBF.

A empresa vencedora foi a BR Newmedia, que saiu do negócio logo depois de realizado o processo. Em setembro, Patrícia Coelho, dona da BR Newmedia, confirmou que a BR Foot Mídia é uma empresa diferente da sua e se disse fora do negócio.

Na ocasião, Walter Feldman, secretário-geral da CBF, disse que viu a mudança de empresas como um aperfeiçoamento. “Houve uma primeira apresentação, era da BR Newmedia a proposta, depois houve uma transição quando foi aprovada. A análise jurídica é que não haveria contradição quanto a isso”, disse.

A BR Newmedia foi representada no negócio pelo advogado Caio Cesar Vieira Rocha, presidente do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) entre 2014 e 2016.

Vieira Rocha afirmou à época que as duas empresas (BR Foot Mídia e BR Newmedia) eram formadas pelo mesmo grupo de investidores. A única mudança seria a saída de Coelho do negócio.

De acordo com documento da Jucerj (Junta Comercial do Rio de Janeiro), registrado em 26 de abril, Rocha era do conselho de administração da BR Newmedia. Ele disse que foi colocado à revelia no cargo, o qual não ocupa mais. 

O advogado também era o único acionista da BR Foot Mídia no ato de criação da empresa. Ela só passou a existir na Jucesp em julho, após a realização da concorrência e até a confecção dos contratos finais, e tem registro na Receita Federal apenas de agosto.

Por meio de sua assessoria de imprensa, a BR Foot Mídia disse que o ex-presidente do STJD “não faz mais parte da companhia e não presta mais nenhum serviço ao grupo”. 

Procurado, o assessor de imprensa de Rocha, por sua vez, disse que não iria falar sobre o caso. Segundo registros da empresa, ele cedeu as ações ao Futbol Holdings.

Procurada, a CBF disse que “por questões contratuais essas informações não podem ser fornecidas”.

A licitação organizada pela CBF

Entidade fez processo pelos direitos internacionais e exploração das placas de publicidade do Brasileiro

R$ 550 milhões - Esse foi o valor oferecido pela BR Newmedia para prestar os serviços durante o processo de concorrência

Ramo de móveis - A BR Newmedia era uma mobiliária para escritórios quando CBF começou a organizar a licitação

BR Foot Mídia - O nome, CNPJ e donos da empresa que assinou os contratos finais da licitação era diferente da que participou da concorrência

Paraíso fiscal - Logo após assinar os contratos, BR Foot Mídia foi vendida a fundo com operações na jurisdição mais sigilosa do mundo 

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