No adeus às quadras, Falcão diz que brigará para futsal se tornar olímpico

Aos 41 anos, ala se despede oficialmente nesta quinta, quando disputa a final da Liga Paulista

Falcão posa para a foto durante entrevista na Arena Sorocaba antes do primeiro jogo da final da Liga Paulista
Falcão posa para a foto durante entrevista na Arena Sorocaba antes do primeiro jogo da final da Liga Paulista - Rafael Hupsel/ Folhapress
Luiz Cosenzo
São Paulo

As lambretas, canetas e a irreverência dentro de quadra de Alessandro Rosa Vieira, 41, o Falcão, terão seu último capítulo nesta quinta (6).

Eleito quatro vezes o melhor jogador do mundo de futsal (2004, 2006, 2011 e 2012), o ala se aposentará no duelo de seu time, o Sorocaba, contra o Corinthians, às 19h15, no Ginásio Wlamir Marques, no Parque São Jorge, no segundo jogo da final da Liga Paulista.

O Corinthians precisa de um empate para conquistar o titulo, enquanto o clube do interior tem que vencer no tempo normal e na prorrogação.

Após se aposentar, Falcão deseja continuar no esporte. Uma de suas metas é fazer com que o futsal entre no programa olímpico. Ele pretende reunir capitães de seleções com a Fifa, que controla a modalidade, e com o Comitê Olímpico Internacional. 

O jogador, que se aposentou da seleção brasileira em outubro, critica a CBFS (Confederação Brasileira de Futsal). 

“Hoje temos uma gestão inexperiente, que ainda comete erros e não é organizada. Porém, não rouba como a anterior”, afirma à Folha.

Falcão refere-se à gestão de Aécio de Borba Vasconcelos, que ficou 35 anos no poder e  renunciou ao cargo em 2014, após ter as contas reprovadas e sob acusações de corrupção e nepotismo.

Atualmente, a CBFS é comandada por Marcos Madeira. A confederação disse que “respeita a opinião de Falcão como qualquer um pode ter”.

“Mas trabalhamos focando na transparência, na gestão correta e profissional, tudo isso para recuperar a credibilidade da entidade no mercado”, disse a entidade em nota.

 

Aposentadoria
Depois da dor que tive no pé [inflamação do osso calcâneo] no meio do ano eu venho tomando injeções para jogar. Como você não treina e vai jogar correndo atrás de meninos de 20 anos? Estou em um momento comercial muito bom. Atualmente, o meu lado profissional atrapalha o comercial e o pessoal. Se atleta tem um prazo de validade, o meu prorroguei ao máximo. Sempre coloquei a bola debaixo do braço e assumi a responsabilidade. Agora  jogar virou uma dificuldade.

Garoto-propaganda
Atualmente, não consigo fazer nem 10% dos eventos que aparecem. É estratégia minha parar de jogar profissionalmente e poder realizar mais eventos no Brasil e no  mundo. Tenho calendário para os próximos três anos de eventos. Estou parando e consigo ser a minha maior empresa porque sou o Falcão do futsal.
Futsal fora da TV aberta
O futsal é muito mal vendido. Se você comparar com o vôlei e o basquete, que são esportes olímpicos, fica nítido.
A modalidade tem um baita Campeonato Gaúcho, Catarinense e Paranaense, o que o vôlei não tem.  O futsal tem a Liga Nacional com 20 equipes e outras 20 querendo entrar. Embora a competição seja transmitida na televisão fechada por contrato, temos 6 das 10 maiores audiências do SporTV e ninguém sabe disso. Isso não acontece com o vôlei e com o basquete.
As federações enxergam o marketing como custo e não como investimento. Eu cobro isso do presidente da confederação. Tem que fazer do futsal  um grande evento.
Quando a seleção vai jogar precisa ter uma divulgação antecipada, colocar atletas para dar entrevistas, convidar a imprensa. É necessário fazer esse trabalho e mostrar para o patrocinador o resultado, onde foi publicado, onde foi transmitido, situações de marketing que não ocorrem.
Os patrocinadores atuais da seleção eu que arranjei. Só que nenhum deles vai renovar porque não teve essa entrega. 

Futsal na Olimpíada
O principal produto da Fifa da modalidade é o Mundial, que acontece de quatro em quatro anos e na época da Olimpíada. Se a Fifa liberar o futsal para ser olímpico, perde o glamour da Copa. Precisa mudar o calendário do Mundial para que isso aconteça.
A minha meta agora é juntar os capitães das seleções da minha geração, ir na Fifa e conversar. Todos querem que o futsal seja olímpico, o Brasil, a Espanha, a Rússia, mas ninguém se uniu.

São Paulo e rusga com Leão
Fiquei frustrado por não ter tido chance com o Leão [em 2005]. Ele fechava os treinos e alegava que eu não estava treinando bem. Só que em todos os jogos que joguei eu entrei bem. O grande erro foi o presidente [Marcelo Portugal Gouvêia] ter me anunciado sem ter falado com ele, que ficou sabendo da contratação pela imprensa. Desde o primeiro dia, ele falava: “Jogador do presidente”.
Eu podia ter tido a oportunidade e não dado certo. O problema é que eu não tive. Tem muita vaidade e fui vítima disso. Não tenho mágoa do Leão. Ele era o treinador e tinha o direito de decidir.
O presidente ainda tentou mudar minha ideia e ofereceu três anos de contrato, mas decidi voltar ao futsal.
No São Paulo, fui ganhando o mesmo que ganhava no futsal. Na época, perdi os patrocinadores. Fiquei feliz quando decidi voltar ao futsal. Os patrocinadores me faziam proposta para voltar.

Falcão durante treino do São Paulo em abril de 2005 - Fernando Santos/Folhapress

Jogar fora do país
Nunca atuei porque desde 2003 eu tenho uma supervalorização no Brasil. Sempre tive no mínimo cinco patrocinadores e cláusulas que, caso eu saísse do país, romperiam o contrato. Então, qualquer proposta que tive para jogar fora do Brasil nunca fez cócegas se juntasse o meu salário e os valores pagos pelos patrocinadores.

Carreira política
Neste momento, não tenho interesse. Quem sabe lá na frente eu possa ser um secretario de esportes para ajudar a cidade, o esporte, mas não agora. 
Eu votei no Bolsonaro, mas não me posicionei durante a eleição porque acho que seria um erro, já que a minha imagem sempre foi a do Brasil, por ter jogado na seleção. Eu o visitei depois da eleição.

Saída da seleção em 2014
Era um esporte em que entrava quase R$ 30 milhões [de patrocínio] por ano e devia para todo mundo, não pagava os jogadores, não ajudavas as ligas, não ajudava os clubes, viajávamos na classe mais barata. Eu jogava e era cego, não via o que acontecia. Na época, peguei os jogadores que estavam sendo queimados e começamos a fazer campanha para derrubar o presidente [Aécio de Borba Vasconcelos], que estava desviando dinheiro. Limpamos todo mundo e começamos do zero. O futsal perdeu os patrocínios, mas não mudou nada, já que o dinheiro não chegava, era desviado.
Depois veio uma gestão inexperiente, que ainda comete erros, mas não rouba. São corretos, mas falta proatividade. Quantas vezes temos jogos da seleção agendado e 15 dias antes não sabemos onde vai ser o jogo. Tem que ter calendário. Não pode faltar 15 dias para os jogos e bater na porta das prefeituras. Não temos organização nenhuma. E é nessa parte que quero atuar, que quero ajudar também.

Treinar a seleção
Se um dia eu pensar em ser treinador, seria da seleção. Essa rotina de treinador de clube não me cabe mais. É muito cansativa. Para treinar a seleção, porém, eu preciso me preparar, fazer análise com treinadores que trabalham. Não é um sonho, mas é uma coisa que pode acontecer um dia.

Paralisia facial
O momento mais marcante na minha carreira foi quando tive a paralisia facial às vésperas do jogo das quartas de final do Mundial de 2012. Foi totalmente psicológico. Você espera quatro anos para jogar uma Copa e, no primeiro jogo, logo aos quatro minutos sente a panturrilha. Eu fiquei trancando no hotel uma semana e não sabia se me recuperaria.
Aquela situação mexeu muito comigo. Aí acordei com o olho piscando mais lento, fui tomar o café e mordi a boca um pouquinho, e a noite estava totalmente paralisado.

No dia do jogo, fiquei no banco. Perdíamos por 2 a 0 e os próprios jogadores pediram para o treinador [Marcos Sorato] me colocar. Logo quando entrei, fizemos 2 a 1. Quando faltavam quatro minutos, empatei o jogo. Na prorrogação, fiz o gol da vitória. Na final, marquei um gol contra a Espanha e fomos campeões. Aquele momento foi o menos espetacular, mas com certeza o mais importante da minha carreira.

Com paralisia facial, Falcão tenta passar pela marcação de dois jogadores argentinos no Mundial de 2012 - AFP

VEJA A NOTA COMPLETA DA CBFS (Confederação Brasileira de Futsal)

Os problemas financeiros que a Confederação enfrenta não são novidades nem segredo. Pegamos a entidade em uma situação que ninguém quis assumir na época e estamos tentando reestruturar, ainda com dificuldades, dentro das possibilidades do cenário arrasado que encontramos, além da situação financeira delicada que o país vem atravessando.

A questão de ser inexperiente e cometer erros é uma opinião do Falcão e respeitamos, como qualquer um pode ter. Mas trabalhamos focando na transparência, na gestão correta e profissional, tudo isso para recuperar a credibilidade da entidade no mercado.

Por conta dos problemas anteriores, não é tão simples assim hoje em dia vender um jogo da seleção e ele [Falcão] tem noção disso, sempre fomos abertos com ele neste sentido, tanto que demos oportunidade para que o Falcão também participasse do processo. E, mesmo diante dos obstáculos, cumprimos o nosso calendário. Se ele quer continuar ajudando e participando do futsal é ótimo, as portas estão abertas como sempre, desde que assumi. Toda ajuda, sendo correta e eficiente, voltada para reerguer o futsal, é válida.

A questão da TV aberta é um pouco mais complicada, pois temos um contrato firmado na gestão anterior até 2020. Competimos por espaço com o vôlei e o basquete e, mesmo as outras modalidades tendo o peso de serem olímpicas, conseguimos ganhar uma fatia de audiência e visibilidade sim. Mas isso por si só não é suficiente.

Reconstruir a imagem da instituição é um trabalho árduo, que necessita tempo e envolve muitas variáveis.

O Falcão tem essa visão e participou da captação de dois patrocinadores, pois, como ressaltado anteriormente, estamos abertos a ajuda de todos, não só dele. Temos ciência de que nossa transparência, nosso modelo de trabalho, é uma virtude, e isso abre portas.

Então, se captamos, é claro que os patrocinadores sabem dos nossos números, sabem como o produto é rentável, mas ainda enfrentamos dificuldades no mercado e isso não podemos negar. Não é questão de simplesmente encarar o marketing como um custo, mas de saber como investir diante de um cenário em que a verba é limitadíssima ---tanto nossa como das empresas. Nós temos projetos, corremos atrás das empresas, apresentamos, mas o marketing por si só não vai fechar contrato, porém, pode gerar caminhos que terminam no êxito. E é o que buscamos.

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