"Se você não parece ser hétero, você escuta piadinhas, vê olhares e sente um certo desprezo quando entra em campo pra jogar rúgbi, tido como um esporte masculino e viril", afirma Bruno Kawagoe, 26.
Gay e fã de rúgbi, ele fundou um time LGBTQ+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros e queers) para jogar o esporte que ama e tentar combater o preconceito.
Batizada de Tamanduás-Bandeira, a equipe foi criada em 2017. É formada por 30 atletas, que treinam às quintas e aos sábados no parque Ibirapuera. O grupo faz jus à multiplicidade de letras da sigla LGBTQ+.
Entre eles está o rapper e homem trans Tiely Santos, 43, que se emociona ao falar das barreiras que teve de enfrentar nos esportes coletivos.
"Eu jogo futebol desde os dez anos. Mas o rúgbi me seduziu, e a equipe me acolheu. A gente se entende, sabe quais são as nossas demandas, as nossas necessidades. O tratamento é melhor. É um time diverso. Não tem só o G da sopa de letrinhas, tem o L e tem o +. É um aprendizado a cada dia que tem treino", afirma Santos.
O time é treinado pela professora de educação física Isabel Vigneron. Desde que ela chegou, a equipe vem aprimorando técnicas para disputar competições.
Eles já participaram de alguns campeonatos e fizeram jogos com equipes profissionais, como o Atibaia Rúgbi, do interior paulista. A meta para 2019 é tentar disputar o campeonato paulista.
"Nosso objetivo é participar de campeonatos e ganhar. Queremos mostrar para as pessoas que o esporte pode ser inclusivo. Todo mundo pode vir aqui e praticar o rúgbi", diz Vigneron.
Essa mentalidade inclusiva permitiu que jogadores heterossexuais se aproximassem do time. Um deles é o engenheiro ambiental Rafael Armano, 29. Ele conta que a convivência fez com que deixasse para trás o que chama de "masculinidade tóxica".
"A gente vê pessoas trans, gays, as mulheres via de regra são lésbicas, eu sou hétero...Todo mundo tem um espaço aqui, e o espaço é igual", diz.
Desde que ele chegou, a integração foi natural.
"No começo ninguém sabia como me cumprimentar. Rolava aquele aperto de mão meio constrangedor e eu dei o primeiro beijo. Eu sou libanês, então tenho essa vantagem, os libaneses se beijam muito. E aí todo mundo me beijou e ficou mais descontraído", conta Armano.
"O que você vê aqui é um jogo disputado. O pessoal vai pra cima, tem grito e depois tem um trejeito qualquer que a gente não está acostumado a ver no esporte. Eu acho isso incrível! Ninguém está preocupado em ter uma imagem".
O publicitário Giordano Rocha, 31, também da equipe, conta que, apesar de o rúgbi ter uma imagem de esporte bruto, ele é bastante inclusivo.
"Aprendemos valores como respeito, solidariedade, integridade. O esporte não precisa de jogadores só com um estereótipo. A diversidade faz muito bem", diz.
Além de praticar o rúgbi, a equipe discute as barreiras que a população LGBTQ+ enfrenta mesmo antes de iniciar algum esporte.
Davi Arias, 23, conta que sempre gostou de esportes coletivos, mas teve de enfrentar o preconceito desde cedo, quando queria praticar alguma atividade física.
"Começou na escola, quando eu não queria jogar futebol. Se eu queria fazer um esporte diferente, as pessoas já olhavam e julgavam. Acho que isso é meio que um padrão para a nossa comunidade", diz.
"Muitas pessoas relatam que nunca se sentiram à vontade para praticar esportes coletivos, porque viam esses ambientes como extremamente machistas e LGBTQfobicos", afirma Kawagoe.
Além de disputar o campeonato paulista, a meta dos Tamanduás-Bandeira é participar em 2020, representando o Brasil, da Copa Binghan, evento que reúne equipes gays de rúgbi de todo o mundo e acontecerá em Ottawa, no Canadá.
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