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Atleta lesionado após tênis Nike rasgar ficará bem, mas seus colegas, não

Lesão de Williamson expôs limitações aos jogadores de basquete universitários dos EUA

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O ala Zion Williamson segura seu tênis rasgado após a lesão - Streeter Lecka - 20.fev.19/Getty Images/AFP
Marc Tracy
Nova York | The New York Times

Quando Zion Williamson, da Universidade Duke, despencou com um tênis destroçado e uma torção no joelho aos 30 segundos de um jogo contra a Universidade da Carolina do Norte, quarta-feira, a notícia foi ruim para muitos dos envolvidos. Williamson tem uma lesão a enfrentar. Duke enfrentou a arquirrival sem seu melhor jogador, e perdeu, como seria de prever -- por 88 a 72. A Nike encarou questões quanto à aparente falha de seu produto.

Mas a rede de esportes ESPN, que estava transmitindo a partida como parte de um contrato multibilionário que lhe confere os direitos de TV sobre a Conferência da Costa Atlântica (ACC, na sigla em inglês), do campeonato universitário de basquete dos Estados Unidos, saiu-se muito bem. O maior astro da categoria passou 99% do jogo lesionado, mas na quinta-feira a rede reportou que a rivalidade entre as duas universidades havia gerado o mais alto índice de audiência já registrado em um jogo universitário disputado em um dia de semana.

O episódio expôs claramente as limitações econômicas que o amadorismo compulsório imposto pela NCAA, a confederação de esportes universitários dos Estados Unidos, e pela NBA impõe a Williamson, um jogador de talento quase sobrenatural, e os efeitos únicos que elas podem ter sobre a renda de um jogador sem par.

Se a NBA não proibisse que jogadores vindos do segundo grau entrassem diretamente na liga -- uma regra que pode cair dentro de alguns anos --, Williamson já poderia estar jogando, por exemplo no Atlanta Hawks, e faturando milhões de dólares ao ano em seu contrato como calouro. Se as regras da NCAA não impedissem os atletas universitários de assinar contratos de patrocínio, Williamson já poderia estar recebendo milhões de dólares da Nike.

Mas a não ser que aconteça uma catástrofe, Williamson, o provável primeiro selecionado no draft da NBA neste ano, terminará por receber sua recompensa -- generosa, e sem muita demora --, e isso em um momento em que sua produtividade econômica será ainda mais alta do que hoje. Seu talento singular obscurece, no entanto, o que muita gente vê como a maior injustiça na política de amadorismo que vigora nos esportes universitários.

Em contraste com Williamson e alguns poucos superastros, a maioria dos jogadores do basquete universitário fica impedida de faturar durante aquele que provavelmente será seu momento de mais alto valor econômico no esporte.

"Os melhores jogadores valem muito -- somas da ordem de milhões de dólares anuais", disse Daniel Rascher, economista especializado em esportes que já pesquisou sobre o valor econômico dos atletas universitários. "Mas os jogadores que ocupam as posições sete, oito e nove" na ordem de escalação dos times, ele acrescentou, "terão um valor econômico da ordem de centenas de milhares de dólares ao ano em receita adicional para suas universidades".

Um exemplo é Jordan Goldwire, da Duke. Ele foi selecionado ao concluir o segundo grau, em posição média na lista de escolhas das universidades, e além da Duke suas opções incluíam a Universidade do Leste do Kentucky, a Universidade da Costa da Carolina e a Universidade do Nevada em Las Vegas. É pouco provável que ele esteja a caminho de um contrato milionário na NBA.

Nesta temporada, ele não entrou em quadra em três dos jogos da Duke em sua conferência, e nas partidas em que entrou seu tempo de jogo médio é inferior a sete minutos. No jogo da quarta-feira contra os Tar Heels, ele jogou oito minutos. E isso fez dele um participante essencial em uma transmissão televisiva de duas horas de duração que valia muito dinheiro para a Duke, a ACC e a ESPN.

"Se você observar a NBA, os caras que não jogam muito mesmo assim recebem salários altos", disse Rascher.

Ou desconsidere a Duke e pense nos jogadores que chegarão ao torneio final da NCAA representando a conferência Big South ou a Patriot League. Parte do charme do evento bilionário vem de chaveamentos exóticos -- e do potencial de vitórias empolgantes por azarões --, quando times das conferências menores encaram potências como a Duke ou a Universidade do Kansas, nas primeiras rodadas.

Os jogadores dessas equipes também estão produzindo retorno financeiro real para a NCAA, para as universidades que defendem e para as redes de TV CBS e Turner Sports, ainda que seu talento em quadra provavelmente nunca mais volte a ser tão lucrativo. No entanto, eles estão proibidos de receber mais que uma porção pequena, e predefinida, desse valor.

O ala-armador Jordan Goldwire, companheiro de Williamson, tem um futuro distante da NBA - Andy Lions - 12.fev.19/Getty Images/AFP

Além, disso, todos esses jogadores também estão arriscando seus futuros no basquete profissional -- e os riscos são maiores do que você imagina. Embora menos de 5% dos jogadores da Divisão 1 da NCAA sejam contratados por times da NBA, cerca de metade deles jogarão alguma modalidade de basquete profissional, por exemplo em ligas estrangeiras, de acordo com a NCAA. Dos jogadores das cinco principais conferências da NCAA, a organização informa, mais de três quartos terminam se profissionalizando.

O contra-argumento dos dirigentes do esporte universitário a esse raciocínio é que limitar a recompensa dos atletas às bolsas de estudos e despesas de manutenção que recebem é crucial para a popularidade de seus esportes. No ano passado, em um processo federal que contestava as restrições da NCAA à remuneração de atletas do ponto de vista da legislação antitruste, Mike Aresco, antigo executivo de esportes na televisão e hoje comissário da Conferência Atlética Americana, depôs afirmando que o status amador dos atletas universitários era um fator de atração, não um problema.

"Isso ecoa junto aos torcedores, porque não é esporte profissional", ele disse, de acordo com as atas do julgamento, no qual ele depôs como testemunha de diversas conferências esportivas e da NCAA. "E ele é apresentado e retratado como esporte universitário, como esporte para estudantes".

Entre outras coisas, é isso que diferencia o basquete e o futebol americano das ligas profissionais menores desses esportes, disse Aresco. "E isso é muito importante", ele acrescentou, "porque as ligas menores nunca foram populares". Ele declarou que "as pessoas veem o esporte universitário como separado. E sempre mantivemos essa separação".

Sem Williamsom em quadra, a equipe da Carolina do Norte, de Luke Maye, ganhou facilmente - Streeter Lecka - 20.fev.19/Getty Images/AFP

​Rascher depôs em favor dos queixosos no processo, cuja decisão deve ser anunciada em breve. Sua resposta a argumentos como o de Aresco foi apontar para um experimento realizado alguns atrás, quando a NCAA permitiu que as universidades oferecessem aos atletas o chamado "custo pleno de participação". Quando os jogadores começaram a receber um pouco mais dinheiro do que antes, a popularidade dos esportes universitários não foi afetada de forma mensurável.

A lesão de Williamson em um jogo de grande importância da temporada regular, especialmente por ter acontecido tão rapidamente, parece ter sido um golpe devastador para Duke, que entrou em quadra com margem de favoritismo de nove pontos, de acordo com as projeções, mas não liderou o placar em momento algum. Roy Williams, o exuberante treinador da Universidade da Carolina do Norte, foi magnânimo e admitiu o fato, depois do jogo.

"Sendo honesto", ele disse, "quando o grandalhão sai do jogo, as coisas mudam muito para eles".Com base no placar final, Williams tinha razão. Mas, sendo honesto: se você estivesse de olho apenas no faturamento, nem teria percebido que o grandalhão saiu de quadra.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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