A vitória por 4 a 0 sobre o Azerbaijão, no dia 20 de novembro de 2018, pela última rodada da Liga das Nações da Uefa, marcou o fim de uma temporada de futebol inesquecível para Kosovo. A seleção terminou o torneio invicto na liderança do Grupo 3 da Liga D, garantindo o acesso à terceira divisão europeia.
Nesta segunda (25), os kosovares escrevem mais um capítulo inesquecível de sua ainda jovem trajetória no futebol. Em Pristina, capital do país, a seleção recebe a Bulgária pelas eliminatórias da Eurocopa de 2020. Será a primeira vez que terão a chance de classificar-se ao torneio.
É impossível dissociar o que vem acontecendo com o futebol kosovar da própria história recente do país. 2018, em particular, foi marcado por uma série de simbolismos.
Em 1998, o grupo armado albanês —maior etnia de Kosovo— KLA (Exército de Libertação do Kosovo), iniciou um conflito com nacionalistas sérvios que durou até 1999 e terminou com intervenção da Otan, aliada dos kosovares. O movimento representava o passo definitivo da nação que queria se desmembrar da Iugoslávia.
Uma década depois, em 2008, Kosovo, sob jurisdição da ONU desde o fim da guerra, declarou sua independência.
Autor de três gols contra o Azerbaijão, o meia Arber Zeneli, 24, é um retrato de todas essas transformações ocorridas na região, que afetaram diretamente a formação da sociedade e, consequentemente, do time nacional kosovar.
Zeneli é filho de pais albaneses e nasceu na cidade de Säter, na Suécia, em 1995. Ele chegou a jogar pela seleção sueca sub-21, mas em 2016, ano da filiação de Kosovo à Uefa e à Fifa, decidiu trocar de país.
O mesmo aconteceu com outro meio-campista da equipe, Milot Rashica, 22, considerado uma joia do leste europeu. Rashica também é filho de pais albaneses e atuou inclusive pela seleção principal da Albânia há três anos.
Na mesma temporada de 2016, anunciou sua mudança para a seleção de Kosovo, participando da primeira partida de eliminatórias da Copa com a recém-filiada equipe kosovar —empate em 1 a 1 com a Finlândia, único ponto do país na campanha para a Rússia.
O que explica a mudança de ares em apenas dois anos, culminando com a grande campanha na Liga das Nações, é justamente a política da federação local de “importar” jovens atletas com raízes albanesas-kosovares, como Rashica, Zeneli e outros bons talentos, para representar o país.
Familiares também têm papel importante nesse processo, convencendo seus filhos a jogar pela nação que, depois de seguidos conflitos e diferentes administrações, enfim podem chamar de casa.
“A infraestrutura está melhorando, mas ainda há um longo caminho e também devemos trabalhar com os jogadores da base, pois temos talentos. Alguns inclusive nos consideram o ‘Brasil da Europa’”, diz à Folha o jornalista Tahir Sopi, do “Koha Ditore”, jornal de maior circulação no Kosovo.
Nas eliminatórias da Copa de 2018, a seleção ainda não tinha campos em condição de receber jogos internacionais. A solução foi mandar essas partidas na Albânia, que também sediou o primeiro amistoso pós-independência de Kosovo em 2010, com vitória albanesa por 3 a 2.
Nas partidas pela Liga das Nações (4 vitórias e 2 empates, com 15 gols marcados, mais que qualquer outra seleção contando todas as divisões), Kosovo já mandou os jogos na capital Pristina, no estádio Fadil Vokrri, nome do maior jogador albanês-kosovar da história e presidente da federação de futebol do país de 2008 até sua morte, em junho do ano passado.
Agora em 2019, a seleção já sonha com voos mais altos, como a possibilidade de se classificar à próxima Euro, que será disputada em 12 sedes pelo continente. A única impossibilidade ainda, por determinação da Fifa, é o encontro com Sérvia e Bósnia, que não reconhecem a independência kosovar.
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