Descrição de chapéu The New York Times

Quando e como mulheres lutaram por igualdade no esporte

Basquete, surfe e tênis tiveram que mudar regras por premiações mais justas

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Em 2007, depois que Venus Williams e outras tenistas importantes começaram a pressionar a organização, o torneio de Wimbledon anunciou que as tenistas receberiam prêmios iguais aos dos homens. - France Presse- AFP
Sarah Mervosh Christina Caron
Nova York e São Paulo | The New York Times

Na sexta-feira, as 28 jogadoras da seleção feminina de futebol dos Estados Unidos abriram um processo por discriminação de gênero contra a US Soccer, a federação americana da modalidade, em uma escalada de sua batalha cada vez mais pública pela igualdade.

As jogadoras disseram que jogam mais partidas que a seleção masculina —e vencem maior proporção de seus jogos— mas ainda assim recebem remuneração mais baixa. Afirmaram que "a discriminação de gênero institucionalizada" afetou não só sua renda mas também os locais e frequência de seus jogos, sua forma de treinamento, a assistência médica e a instrução tática que recebem, e até a maneira pela qual viajam para as partidas.

Elas não estão sozinhas, em sua luta por pagamento justo e tratamento melhor. Abaixo, oito exemplos recentes de luta das mulheres pela igualdade no esporte.

CONCLUIR A MARATONA DE BOSTON APESAR DE UMA TENTATIVA DE EXPULSÃO

Os especialistas disseram por anos que provas longas de atletismo prejudicavam a saúde e a feminilidade das mulheres.

Em 1967, mulheres não eram autorizadas a participar oficialmente da Maratona de Boston, e por isso Katherine Switzer se inscreveu na corrida daquele ano como "K.V. Switzer", para ocultar seu gênero.

Ela já havia corrido três quilômetros quando um fiscal tentou expulsá-la da pista, um momento capturado em fotografias dramáticas. Switzer concluiu a prova mesmo assim, se tornando a primeira mulher a fazê-lo como participante oficial.

"Aprendemos que as mulheres não ficam a dever em termos de resistência e vigor, e que correr não requer instalações ou equipamentos sofisticados", escreveu Switzer em um artigo para o The New York Times em 2007.

A participação oficial de mulheres na maratona de Boston foi autorizada a partir de 1972, e em 1984 os jogos olímpicos passaram a incluir uma maratona feminina.

MULHER CAMPEÃ DE TÊNIS VENCE A BATALHA DOS SEXOS, EM 1973

O ano de 1973 foi histórico para Billie Jean King, estrela que desbravou caminhos no tênis.

Ela fundou a Women's Tennis Association (WTA). Também liderou um movimento para que as tenistas recebessem prêmios iguais aos dos homens, em torneios que incluíssem jogadores dos dois sexos.

E, em setembro, em uma partida noturna disputada no Astrodrome de Houston, ela pôs em prática sua cruzada pela igualdade entre os sexos quando derrotou facilmente o tenista Bobby Riggs, que se autodescrevia como porco chauvinista, na Batalha dos Sexos.

King viria a receber uma Medalha Presidencial da Liberdade, em 2009, por seu trabalho em defesa dos direitos das mulheres e dos gays. Ela é considerada como uma das atletas mais importantes do século 20.

"Todo mundo acha que as mulheres deveriam ficar contentes por receber migalhas", King disse certa vez. "Já eu quero que as mulheres recebam o bolo, a cobertura e a cereja por cima".

REMADORAS DE YALE PROTESTAM NUAS PELA FALTA DE CHUVEIROS PARA MULHERES

Chris Ernst defendeu os Estados Unidos no remo em duas olimpíadas. Mas no segundo trimestre de 1976, ela era capitã da equipe de remo da Universidade Yale e não suportava mais a falta de chuveiros para uso depois dos treinos.

Ela liderou outras 18 remadoras em um protesto muito visível nos escritórios da comissão atlética de Yale. As atletas se despiram até a cintura, mostrando a frase "Title IX", escrita com canetas hidrográficas azuis em suas costas e seios.

O The New York Times publicou um artigo sobre o protesto no dia seguinte, e uma foto do acontecimento histórico também foi publicada pelo jornal Yale Daily News.

Em duas semanas, as remadoras passaram a dispor de novos vestiários. E em todo o país, as instituições educacionais começaram a encarar o Title IX [uma seção de uma lei de educação americana que proíbe discriminação por sexo em qualquer atividade educacional beneficiada por verbas federais], então em vigor há apenas quatro anos, como lei que precisava ser cumprida.

VENUS WILLIAMS CONQUISTA UMA VITÓRIA PARA AS MULHERES FORA DA QUADRA

Em 2007, depois que Venus Williams e outras tenistas importantes começaram a pressionar a organização, o torneio de Wimbledon anunciou que as tenistas receberiam prêmios iguais aos dos homens.

Williams havia apresentado um apelo à comissão organizadora de Wimbledon um dia antes de conquistar o título do torneio em 2005, mas seu pedido foi rejeitado. Em 2006, ela escreveu um artigo para o jornal The Times, de Londres, intitulado: "Wimbledon me enviou uma mensagem: sou uma campeã de segunda classe".

"Você já foi deixado na mão por alguém a quem admirou, respeitou e idolatrou por muito tempo?", ela escreveu., "Pouca coisa na vida decepciona mais, especialmente se essa pessoa faz alguma coisa que contraria diretamente o que você considera ser justo e correto".

Depois da mudança de regras em 2007, ela recebeu US$ 1,4 milhão por seu quarto título no torneio, a mesma quantia paga ao campeão masculino Roger Federer.

UM FEITO PARA O HÓQUEI FEMININO

Em março de 2017, a seleção americana de hóquei sobre o gelo feminino anunciou que boicotaria o campeonato mundial que estava por acontecer se a USA Hockey, a organização que comanda o esporte no país, não aumentasse o pagamento das jogadoras.

"É difícil acreditar que, em 2017, tenhamos de lutar tanto para conseguir o que é justo em termos de apoio", disse Meghan Duggan, a capitã da seleção, quando do protesto. "Queremos fazer a coisa justa, e a coisa certa - não só para o hóquei mas para todas as mulheres".

Elas colocaram suas carreiras em risco, mas a aposta deu certo.

Menos de duas semanas mais tarde, a seleção chegou a um acordo com a USA Hockey, válido por quatro anos. As jogadoras passariam a receber um estipêndio mensal de US$ 2 mil do Comitê Olímpico dos Estados Unidos, e bonificações maiores por conquistar medalhas. A equipe também passaria a ter condições de viagem e cobertura de seguro iguais às da seleção masculina da modalidade, e foi criado um fundo de premiação, com distribuição anual das quantias acumuladas.

MULHERES DO SURFE CONSEGUEM PRÊMIOS IGUAIS

Três importantes surfistas de grandes ondas, Bianca Valenti, Andrea Moller e Paige Alms, passaram anos batalhando por pagamento igual em um esporte dominado pelos homens no qual elas arriscam suas vidas regularmente.

Em julho do ano passado, a Comissão pela Igualdade das Mulheres no Surfe, organização formada por elas e outras surfistas, enviou uma carta à Comissão Costeira da Califórnia argumentando que, ao tratá-las de modo desigual, a World Surf League estava violando uma lei estadual de direitos civis.

Meses mais tarde, em setembro, Valenti e outras surfistas conseguiram uma vitória quando a World Surf League anunciou prêmios iguais para os homens e mulheres.

Valenti e as colegas também lutaram com sucesso pela inclusão das mulheres no Maverick's Challenge, uma competição de surfe em grandes ondas que tradicionalmente só incluía homens.

"Algumas pessoas me diziam que, por tentar mudar a distribuição dos prêmios, eu estava estragando as coisas para todo mundo", disse Moller em dezembro. "E eu respondia que elas estavam erradas, e que estávamos lutando por todos. O público ama ver mulheres surfando grandes ondas, e com isso todo o esporte vai crescer".

JOGADORAS DA WNBA SE PRONUNCIAM

No mundo do basquete profissional, as disparidades de pagamento são bem conhecidas. Na NBA, uma organização multibilionária na qual os jogadores podem faturar milhões de dólares ao ano, o salário mínimo inicial é cerca de oito vezes maior que a média salarial da WNBA.

E as jogadoras de basquete estão se pronunciando, na mídia social e na TV.

Skylar Diggins-Smith, armadora do Dallas Wings e integrante da seleção de melhores jogadoras da WNBA, recentemente estrelou um comercial cujo objetivo era conscientizar as pessoas sobre a disparidade na remuneração.

O comercial, da consultoria de investimento Wealthsimple, contrasta os percursos de dois jovens atletas, um menino e uma menina. Os dois fazem uma lista do que sonham fazer no basquete, mas só um deles receberá um contrato milionário assim que começar no basquete profissional.

A'ja Wilson, caloura selecionada em primeiro lugar no draft da WNBA para a temporada de 2018, também se pronunciou: "deve. ser. ótimo", ela escreveu sobre o contrato de US$ 154 milhões entre LeBron James e o Los Angeles Lakers. "Nós aqui ainda estamos em busca do M[ilhão], mas, meu Deus, melhor eu voltar para o meu canto".

Wilson ganhou US$ 53 mil em sua primeira temporada na WNBA. Deandre Ayton, o primeiro selecionado no draft da NBA no ano passado, teria salário provável de US$ 6,8 milhões em sua primeira temporada como jogador do Phoenix Suns.

MELHOR JOGADORA DE FUTEBOL DO PLANEJA BOICOTA COPA DO MUNDO

A norueguesa Ada Hegerberg, 23, foi premiada como melhor jogadora mundial de futebol no ano passado, recebendo a Bola de Ouro, um prêmio individual prestigioso antes reservado aos homens.

A despeito do prêmio importante, ela decidiu não jogar no maior torneio do futebol feminino, a Copa do Mundo, que acontece nas França na metade do ano.

Ela deixou a seleção norueguesa em 2017 em protesto contra o que definiu como falta de apoio ao futebol feminino em seu país.

"Fui muito clara com eles quanto às coisas que eu achava que precisavam melhorar", ela disse em entrevista depois da conquista da Bola de Ouro. "Expliquei-lhes os motivos. Desejo o melhor à minha seleção. Amo meu país. Queria muito jogar por ele. Mas nesse caso, tive de seguir em frente".

The New York Times, tradução de Paulo Migliacci




 

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