Jiu-jítsu brasileiro conquistou príncipe e virou febre em Abu Dhabi

Em visita aos Emirados Árabes, Bolsonaro deverá acompanhar demonstração da luta

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São Paulo

Incógnito, um príncipe árabe vai estudar na Califórnia e se apaixona pelo jiu-jítsu brasileiro. Na volta ao país natal, leva junto o instrutor, cria um megaevento mundial e torna a prática obrigatória no país.

A história de como a arte marcial brasileira se tornou um dos esportes mais populares de Abu Dhabi (Emirados Árabes Unidos) lembra um roteiro de cinema, mas aconteceu de verdade.

O cenário é a cidade de San Diego (Califórnia, EUA), no início dos anos 1990, e os personagens são Tahnoon Bin Zayed Al Nahyan —um dos 16 herdeiros do xeque fundador do país— e o lutador brasileiro Nelson Monteiro, dono da primeira academia de jiu-jítsu na costa oeste americana.

Nos EUA, onde estudava administração, o príncipe se tornou amigo do instrutor, sem revelar a identidade. “Eu via que era um cara bem de vida, com vários carros, mas na academia ele era apenas o Bin”, conta Monteiro.

Tahnoon obteve a faixa azul, mas queria chegar à faixa preta. “Foi só então que ele se identificou como príncipe e me convidou a morar em Abu Dhabi”, diz o brasileiro.

O instrutor aceitou e nos quatro anos que ficou no Golfo ajudou o príncipe a criar as “olimpíadas da luta agarrada”, o ADCC (Abu Dhabi Combat Club), um dos mais disputados eventos de jiu-jítsu no mundo.

Quando Monteiro voltou aos EUA, Tahnoon, então faixa roxa, trouxera para os tatames vários sobrinhos, um deles filho de seu irmão Mohammed —príncipe herdeiro (e, na prática, dirigente) de Abu Dhabi e um dos políticos mais influentes dos Emirados.

O filho do xeque, tímido e retraído, se tornou um garoto autoconfiante, e Mohammed atribuiu a transformação ao jiu-jítsu. Daí a fazer da arte marcial brasileira uma prática obrigatória para os jovens do país foi um passo.

Quando Zumbi Lara, 38, desembarcou no país para disputar um torneio, o jiu-jítsu havia sido recém-adotado pelo Conselho de Educação de Abu Dhabi no currículo escolar. Havia apenas dez instrutores no país, e ele foi convidado a se juntar ao grupo.

Fisioterapeuta, Zumbi vendeu a clínica em Porto Alegre e se integrou em 2009 ao projeto-piloto. Desde então, viu o jiu-jítsu passar de 14 colégios para 130, chegando a mais de 76 mil alunos, segundo a Federação de Jiu-Jítsu de Abu Dhabi. Cada escola tem dois instrutores disponíveis das 7h30 às 14h. As meninas também treinam —com faixas-preta mulheres.

Há competições entre escolas e campeonatos nacionais para os que se destacam.

Por ordem do governo, todo clube de futebol de Abu Dhabi mantém uma equipe da arte marcial. Bases militares e polícias dos sete emirados praticam jiu-jítsu, e todo cidadão pode aprender de graça em centros de treinamento.

Indicada para crianças a partir dos 4 anos de idade, a arte marcial é adotada “para desenvolver saúde, disciplina e senso de equipe dos alunos”, de acordo com o Conselho de Educação emiradense.

A versão brasileira, adaptada do original japonês, prioriza a luta de solo: a imobilização por meio de alavancas —em vez da explosão de chutes e socos— dá vantagem a quem domina a técnica, mesmo que não tenha porte avantajado, afirmam os instrutores.

O projeto oficial atrai aos Emirados centenas de faixas-preta do Brasil: são hoje cerca de 600 instrutores, 95% deles brasileiros, segundo Zumbi. Praticamente todos são contratados pela Palms Sports, empresa do príncipe Tahnoon que presta serviços ao governo.

A rotina dos professores é puxada. Zumbi, por exemplo, vai todos os dias a uma escola, dá duas aulas diárias num centro de treinamentos e mais duas aulas privadas por semana para três irmãos da família real.

“O jiu-jítsu virou o esporte número 1 do país”, afirma. “Não é à toa que foi o escolhido pelo xeque Mohammed para mostrar ao presidente russo, Vladimir Putin [em 16 de outubro].”

Jair Bolsonaro recebe camiseta de Robson Gracie (à dir.) durante a campanha presidencial de 2018
Jair Bolsonaro recebe camiseta de Robson Gracie (à dir.) durante a campanha presidencial de 2018 - Carl de Souza - 25.out.18/AFP

Uma grande demonstração está sendo preparada também para o presidente Jair Bolsonaro, que visita os Emirados no sábado (27).

O encontro que está na agenda distribuída pelo Planalto, embora sem confirmação, foi articulado pelo empresário e lutador Renzo Gracie, amigo do príncipe Tahnoon e próximo do filho mais novo do presidente, Eduardo Bolsonaro.

Dono de uma academia em Nova York, Renzo Gracie é defensor ardoroso da família Bolsonaro em redes sociais. Na crise das queimadas da Amazônia, se envolveu em polêmica ao dizer que o presidente francês Emmanuel Macron iria “tomar um gogó” no “pescoço de franga” por “falar mal do Brasil”.

Em agosto deste ano, Renzo aceitou convite da Embratur para se tornar “embaixador do Turismo” —trabalho voluntário de divulgação do país no exterior.

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