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Como United caiu e viu City virar força dominante em Manchester

Rivais se enfrentam neste sábado (7), às 14h30, pela Premier League

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São Paulo

Há pouco mais de 20 anos, em 26 de maio de 1999, o Manchester United marcou dois gols nos acréscimos sobre o Bayern de Munique (ALE) para realizar o sonho do técnico Alex Ferguson e conquistar a Champions League.

Quatro dias depois, o Manchester City também anotou duas vezes após os 45 do 2º tempo para levar o jogo em Wembley para os pênaltis. O prêmio pela vitória foi escapar da terceira divisão inglesa.

As condições dos times de Manchester eram bem estabelecidas então. O United era a potência, uma máquina de fazer dinheiro, com time campeão em série e treinador incontestável. O City era o primo indigente. Tradicional, mas paupérrimo. Tinha como único objetivo evitar rebaixamentos e atuava em estádio decrépito (Maine Road) em uma das zonas mais perigosas do norte da Inglaterra.

Fellaini, do Manchester United, acerta cabeçada em Sergio Aguero, do Manchester City segundos antes de ser expulso no clássico entre as duas equipes em 2017
Fellaini, do Manchester United, acerta cabeçada em Sergio Aguero, do Manchester City segundos antes de ser expulso no clássico entre as duas equipes em 2017 - Jason Cairnduff-27.abr.2017/Reuters

Nos anos 1990, o United foi campeão nacional 5 vezes e teve na década Eric Cantona, Peter Schmeichel, Paul Scholes, David Beckham e Ryan Giggs, todos nomes reconhecidos no mundo do futebol. O City entrou em campo com Danny Tiatto, Georgi Kinkladze e Shaun Goater, jogadores que despontaram para o anonimato.

Os dois rivais da cidade se enfrentam pela Premier League, neste sábado (7), às 14h30, no Etihad Stadium. Desde a última vez que o Manchester United foi campeão inglês, em 2013, o Manchester City ganhou o troféu três vezes.

Com dono bilionário, dinheiro a rodo para contratações, um dos melhores treinadores da história e estádio novo, cedido quase de graça pela prefeitura de Manchester, o time azul se transformou em força do futebol e almeja chegar ao topo mundial. O United vive período de renovação e incerteza que já dura seis anos, com trocas de técnicos, contratações desastrosas e donos mais preocupados em tirar dinheiro do clube do que em investir.

Desde 2005, quando fez manobra financeira que lhe permitiu se tornar dona do Manchester United, a família Glazer tirou 1 bilhão de libras (R$ 5,5 bilhões) em dividendos do clube. É a mesma quantia que o City Football Group, empresa subsidiária da família real dos Emirados Árabes, investiu no Manchester City.

A equipe de Pep Guardiola, atual campeã, está em terceiro na tabela e parece pouco provável que vai alcançar o Liverpool, líder com 11 pontos de vantagem. Mas a atenção maior é a inédita conquista da Champions League. Está classificado para as oitavas de final.

O United começa a rodada em 6º e tem como objetivo na temporada conseguir vaga para o principal torneio europeu. Terá de terminar a Premier League entre os quatro melhores ou ser campeão da Liga Europa.

Desde 2013, quando Ferguson se aposentou após 27 anos como senhor absoluto do clube, a agremiação teve quatro técnicos. O atual, Ole Gunnar Solskjaer, autor do gol do título europeu de 1999, estava no modestíssimo Molde (NOR) quando foi convidado para assumir o cargo de forma interina após a demissão de José Mourinho.

O City ganhou a tríplice coroa doméstica (Premier League, Copa da Inglaterra e Copa da Liga) na última temporada. O United não venceu nada.

A decadência na Premier League acontece apesar de o clube de Old Trafford ter gasto 840 milhões de libras (R$ 4,4 bilhões) em reforços no período. O símbolo do desperdício foi o chileno Alexis Sánchez, contratado em janeiro de 2018 por um salário de R$ 8,8 milhões por mês, mais bônus por gols marcados (foram apenas quatro). Em julho, o atacante foi emprestado para a Internazionale (ITA), mas a equipe inglesa ainda paga parte dos vencimentos.

O Manchester United é administrado por Ed Woodward, ex-banqueiro da JP Morgan sem qualquer experiência anterior no futebol e que, a cada momento em que os resultados em campo são ruins, demite treinador para se safar da culpa. O Manchester City tem como CEO Ferran Soriano, o catalão por trás do plano de expandir a marca do Barcelona. Estratégia que culminou na formação do time comandado por Guardiola a partir de 2008.

Woodward ocupa o cargo porque foi responsável por outro plano. Ele bolou a fórmula para que os Glazers, americanos especializados no mercado de shopping centers, comprassem um dos clubes de futebol mais valiosos do mundo sem colocarem um centavo. O dinheiro veio de empréstimos de bancos de investimento, o que fez o United, um clube sem dívidas, passar a ter um débito, em 2005, de 500 milhões de libras (R$ 2,7 bi em valores atuais) do dia para a noite.

Os americanos deram como garantia da quitação dos empréstimos os bens e receitas do próprio United. Foi o golpe perfeito.

Em reunião com investidores e patrocinadores, Woodward chegou a dizer que a capacidade de receita do clube não dependia dos resultados em campo.

Apesar da afirmação, entre julho e setembro deste ano, a arrecadação com televisionamento dos jogos caiu em 23%. O débito subiu para 524 milhões de libras (R$ 2,8 bilhões) confirmando as suspeitas de que até agora, apenas os juros dos empréstimos feitos na aquisição pelos Glazers têm sido quitados.

Nos últimos 15 anos, o United cortou de forma sistemática os orçamentos da academia das categorias de base e dos olheiros. Funcionários que apontaram o problema que isso causaria no futuro foram demitidos. A alegação de Woodward é que o United, com Solskjaer, passa por uma “reformulação de cultura e mentalidade”.

Na temporada passada, a arrecadação do Manchester City foi recorde: 535,2 milhões de libras (R$ 2,8 bilhões) e o clube começa uma escalada que há 20 anos era impensável: superar o rival da cidade no campo e nas finanças.

Há suspeitas sobre as fontes de arrecadação do City. O patrocínio do estádio é da Etihad Airways, empresa aérea que também pertence à família real do Emirados Árabes Unidos, o que causou investigação da Uefa no fair play financeiro, regra de que os clubes não podem gastar mais do que arrecadam. São 60 milhões de libras por ano (R$ 328,5 milhões).

O presidente da Fifa, Gianni Infantino, foi acusado de agir nos bastidores para favorecer o clube inglês e o Paris Saint-Germain e evitar que fossem punidos.

O estádio, rebatizado com o nome do patrocinador, também caiu no colo da equipe por iniciativa de conselheiros da prefeitura e apesar da reclamação de torcedores do United. Antigo City of Manchester Stadium, foi erguido pelo poder público para os Jogos da Comunidade Britânica, em 2008.

No último número disponível, em 2015, por temporada a cidade recebeu 4 milhões de libras (R$ 21,2 milhões) da equipe.

Há também investimentos do grupo empresarial ligado à família real dos Emirados Árabes para transformar e revitalizar o entorno do estádio, encravado em região considerada carente no norte inglês.

A próxima fronteira a ser explorada pelo Manchester City é ampliar a base de torcedores. A equipe regularmente não consegue lotar o Etihad Stadium apenas com sócios, o que é comum nas maiores equipes do país. É obrigada a colocar os bilhetes à venda para o público em geral, não apenas para associados. Algo pouco comum na elite do país.

A agremiação divulgou na temporada passada uma média de público no estádio (apelidado de Emptyhad pelos rivais, uma brincadeira com a palavra “empty”, vazio em inglês) de 54 mil na arena com capacidade para 55.097. Há quem conteste. O site Sun Online afirmou que o número correto era 46 mil. 

A média do Manchester United em Old Trafford foi de 74.879 em estádio de 76.000, na temporada 2018/19. É taxa de ocupação de 98,5%, mas a menor desde 2010.

A popularidade dos diabos vermelhos, apelido do time, ainda faz com que atraia patrocinadores. Fechar acordos não apenas globais, mas regionais, e nos mais diferentes setores, ampliou a base de receita. No ano passado, o site oficial anunciou acordos com uma marca de colchões e com empresa de noodles.

As grandes empresas começam a ficar insatisfeitas com o desempenho em campo. A Chevrolet não se mostrou disposta a renovar o contrato do patrocínio do uniforme, que acaba em 2021 e vai render ao United 450 milhões de libras (R$ 2,46 bilhões) em sete anos.

As ausências da Champions League e o futebol ruim também incomodam a Adidas, que pode cortar em 30% o valor pago se o time não se classificar para o torneio europeu em 2020. O acordo assinado em 2015 rende 75 milhões de libras (R$ 410,5 milhões) a cada temporada.

Em 2009, quando o City contratou Carlos Tevez, que na temporada anterior estava no United, o clube colocou um provocativo outdoor no Arndale Center, o maior shopping da cidade. Havia a imagem do atacante e a frase “Welcome to Manchester” (bem-vindo a Manchester, em inglês), uma gozação porque o estádio do rival na verdade fica no distrito de Trafford. Alex Ferguson respondeu dizendo que os azuis eram apenas “vizinhos barulhentos.”

Por mérito do City e erros do United, se tornou bem mais do que isso nos últimos dez anos. Virou a maior força de Manchester.

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