Descrição de chapéu Tóquio 2020

Ana Marcela decide 'sumir' por feito inédito na Olimpíada de Tóquio

Ela quer distância de rivais e mídia para buscar ouro na maratona aquática

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Santos

Ana Marcela Cunha, 27, se acostumou a longas maratonas na carreira. Em julho do último ano, nadou por pouco mais de cinco horas para conquistar a medalha de ouro na prova dos 25 km do Mundial de Esportes Aquáticos de Gwangju, na Coreia do Sul. Foi a quarta vitória dela nessa distância.

À beira da piscina da Universidade Santa Cecília, em Santos, ela resolveu encarar outro teste de resistência. Atendeu a quase 20 jornalistas no dia 27 de dezembro por várias horas e de forma ininterrupta.

Foi praticamente seu último compromisso com a imprensa antes da Olimpíada de Tóquio, de 24 de julho a 9 de agosto deste ano. “Deixei frases já gravadas, algumas opiniões, fiz tudo o que era possível. Tenho contrato com patrocinadores e devo algo em troca também, mas tentamos eliminar muitas coisas, ela diz à Folha.

A ideia da nadadora, dona de 11 medalhas em campeonatos mundiais, é “sumir” dos olhares da mídia e de suas principais adversárias até o momento mais aguardado da temporada, no Japão. “Estou pagando o preço para tentar algo fora da curva”, afirma.

Ana Marcela tenta chegar menos visada para aquela que pode ser a sua última chance de conquistar uma tão sonhada medalha olímpica. Em dezembro de 2018, ela já admitia que, devido à sua idade, não poderá deixar passar a próxima oportunidade. “Essa pode ser a minha última. Sei que minha vida útil [como atleta] estará chegando ao fim”, disse na ocasião.

Em 2019, Ana Marcela viveu o que chama de melhor ano de sua vida. Conquistou dois ouros no Mundial na Coreia, nas provas de 5 km e 25 km, em julho. Menos de um mês depois, veio um primeiro lugar inédito na modalidade para o Brasil nos Jogos Pan-Americanos, em Lima, no Peru.

A nadadora ainda venceu cinco etapas do circuito de maratonas aquáticas e foi eleita em novembro pela revista americana Swimming World, a mais importante sobre o esporte, a melhor nadadora do mundo em águas abertas.

Na opinião dela, muitos fatores colaboraram para a crescente. O principal, acredita, foi ter se instalado no Rio de Janeiro. Desde 2018, ela mora em frente ao centro aquático Maria Lenk, onde tem acesso laboratório do Comitê Olímpico do Brasil, entre outras estruturas de ponta.

"Fazemos medições diárias para saber o nível de tudo [no corpo]. São ganhos que ninguém vê. Esse, aliás, é o legado da Olimpíada de 2016. Se você é um atleta de seleção absoluta, tem direito a isso. Eu tomei a decisão de ir até isso, não tenho zona de conforto”, diz.

Ela, agora, idealiza um caminho diferente das principais oponentes. Abdicará de grande parte do circuito de maratonas aquáticas, competição que já conquistou por quatro vezes.

Após uma breve pausa, a nadadora voltou aos treinos no último dia 5. Competirá na primeira etapa e depois, em fevereiro, rumará para as Ilhas Canárias, arquipélago espanhol procurado pelos nadadores para trabalhar a resistência. As adversárias passarão pelo local antes, em janeiro.

De maio a junho, voltará a viajar, desta vez acompanhada de nutricionista, psicóloga e outros profissionais, a Sierra Nevada, também na Espanha, para treinamento na altitude. Outra vez, longe das adversárias.

“Olhamos várias vezes a prova dos 10 km do Mundial [na Coreia do Sul]. Vinha de uma sequência muito boa, mas fiquei fora do pódio, em quinto lugar. Não é um absurdo, mas foi impressionante como fui marcada. Eu ia para o fundo do pelotão, as atletas iam junto. Puxava mais à frente, elas iam", contou. "Foi uma caça, então decidimos que a nossa estratégia seria competir menos em 2020."

Ana Marcela faz gesto de "4" com os dedos
Ana Marcela Cunha após conquistar o tetracampeonato mundial na prova de 25 km - Kim Hong-Ji - 19.jul.19/Reuters

A distância de 10 km, justamente aquela em que a brasileira nunca levou o ouro em campeonatos mundiais, é a única disputada nos Jogos Olímpicos.

Tóquio-2020 será a sua terceira tentativa de medalha. Em 2008, em Pequim, admitiu ter errado na estratégia adotada na reta final da prova. Mesmo assim, acabou em quinto lugar, sua melhor colocação.

Em 2011, sofreu o maior baque da carreira, quando não conseguiu classificação para os Jogos de Londres. Desde então, passou a trabalhar com uma equipe multidisciplinar. Nela está a psicóloga Carla di Perro, responsável por ajudá-la com as cobranças por desempenho.

No Rio de Janeiro, em 2016, Ana Marcela se emocionou ao fim da prova e disse que o 10º lugar não era digno de uma atleta então três vezes campeã de Copa do Mundo. Na ocasião, Poliana Okimoto conquistou um bronze inédito para o país.

Se decidiu rever a prova do último Mundial, a nadadora evita fazer o mesmo com as disputas olímpicas em que esteve. “Não faço muita questão, não, sinceramente. Foram erros de prova. No Rio, foi uma hidratação que não deu certo, não dá para pensar muito nisso”, justifica.

Sempre vista com cabelos pintados, descoloridos ou cortes ousados, ela agora quer desaparecer dos olhares de todos. Isso porque, mesmo dona de um currículo invejável no esporte, sente que ainda falta a glória no maior palco do esporte.

“Estive na festa da Fina [Federação Internacional de Natação] como vencedora em 2018 e falei [ao técnico Fernando Possenti]: quero estar aqui de novo. Para isso, preciso ser campeã olímpica, esse é o nosso objetivo. Quero ser a melhor do mundo."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.