Por que banir o City da Champions abre dúvida sobre inocência do PSG

Clube francês foi investigado em 2017, em processo questionado por comissão

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São Paulo

Ao mesmo tempo em que suspender o Manchester City de competições europeias nas próximas duas temporadas por violações às regras do fair play financeiro pode ser um marco na história do futebol, a decisão da Uefa reacende a dúvida acerca da inocência de outro clube, o Paris Saint-Germain.

 

Ambos são controlados pelas famílias reais de países árabes e têm como principal fonte de receita seus pomposos contratos de patrocínio com empresas que pertencem aos mesmos donos.

O PSG chegou ser investigado pela entidade máxima do futebol europeu em 2017, logo após o clube quebrar duas vezes num mesmo mês o recorde de contratação mais cara do futebol, levando Neymar e Mbappé. Foi declarado inocente um ano depois.

No entanto, documentos obtidos pelo jornal The New York Times (e publicados em reportagem de julho de 2019) sugerem não só que a decisão foi equivocada, como também que a Uefa pode ter sabotado sua própria investigação e que os parisienses usaram uma manobra técnica para escapar à possibilidade de punição, preservando seu lugar na Champions League.

Segundo as normas do fair play financeiro, nenhum clube pode gastar muito mais do que recebe, podendo acumular um máximo de 30 milhões de euros (R$ 139,65 mi) em prejuízo num intervalo de três anos.

Neymar e Mbappé somados, em agosto de 2017, custaram 402 milhões de euros, ou quase R$ 1,5 bilhão ao PSG.

Neymar e o presidente do PSG, o bilionário Nasser Al-Khelaifi, durante a apresentação do brasileiro no clube francês
Neymar e o presidente do PSG, o bilionário Nasser Al-Khelaifi, durante a apresentação do brasileiro no clube francês - Xinhua - 4.ago.2017/Jean-Marie Hervio

Um ano depois, o relatório final da investigação sobre os franceses chegou à mesa de José Narciso da Cunha Rodrigues, ainda hoje presidente da comissão julgadora do Órgão de Controle Financeiro de Clubes da Uefa (a mesma que condenou o City). Para sua surpresa, a investigação concluia pela inocência dos parisienses.

O clube sequer chegou a ser julgado na comissão presidida por Cunha Rodrigues, já que para isso o relatório deveria apontar suspeitas de desrespeito às regras de fair play financeiro.

“A decisão de encerrar o caso foi um erro manifesto”, ele afirmou, ao enviar o relatório de volta ao investigador do caso, o ex-ministro belga Yves Leterne —o mesmo que conduziu as apurações contra os ingleses—, pedindo que ele reavaliasse o caso.

A defesa do PSG se baseia em uma manobra contábil e na afirmação de que seus contratos generosos de patrocínio com entidades qatarianas, como a companhia de telecomunicações Ooredoo, o Banco Nacional do Qatar e, especialmente, a Autoridade de Turismo do Qatar, tornaram possíveis as contratações de Neymar, Mbappé e outros. Todas elas têm ligações com a família real do país.

Foram em contratos como estes que a Uefa, ao investigar o Manchester City, entendeu que os ingleses haviam adulterado suas declarações de receita com patrocínio de uniformes entre 2012 e 2016.

Segundo o jornal Der Spiegel, por exemplo, apenas 11% dos 67,5 milhões (R$ 379 milhões) anunciados pelo clube como pagos pela companhia aérea dos Etihad (empresa dos Emirados Árabes que estampa a camisa do clube) na temporada 2015/2016 teria vindo, de fato, da aviadora.

O restante teria sido sido investido pela Abu Dhabi United Group, dona do Manchester City e que tem proprietário é o xeque Mansour bin Zayed, membro da família real de Abu Dhabi, capital emiradense. A Etihad também é controlada pelo mesmo grupo.

Já no caso do Paris Saint-Germains, o clube relatou que o contrato com a Autoridade de Turismo do Qatar valeria 100 milhões de euros (US$ 111 milhões) por temporada.

A investigação da Uefa contratou a Octagon Worldwide, uma companhia de marketing esportivo, para fazer uma análise deste contrato. A defesa do PSG contratou a Nielsen para o mesmo trabalho.

Enquanto a Octagon avaliou que o acordo com a organização turística do Qatar deveria ser avaliado em 5 milhões de euros (R$ 23,2 mi), já que ele conferia visibilidade quase nenhuma ao patrocinador, a Nielsen chegou a cifras parecidas àquelas divulgadas inicialmente pelo clube.

Ao invés de solicitar um terceiro estudo, Leterme, o investigador, determinou que os números da Nielsen deveriam ser usados. Sendo assim, o clube se salvou de ultrapassar o teto de prejuízo do fair play financeiro por apenas 6 milhões de euros (R$ 28 mi).

O presidente Cunha Rodrigues rejeitou os cálculos. Ele também apontou para outros contratos cujo valor também parecia ter sido superestimado, em benefício do PSG, no relatório final de Leterme.

Essa e algumas outras constatações o levaram à conclusão de que a decisão de inocentar os franceses devia ser abandonada, e uma nova investigação empreendida imediatamente.

O PSG recorreu à Corte Arbitral do Esporte (CAS) contra a decisão de reabrir o caso na Uefa, afirmando que ele havia perdido o prazo de 10 dias para conduzir uma revisão. A entidade máxima do futebol europeu apoiou o clube francês.

Cunha Rodrigues descreveu a afirmação como “absurdo lógico”, dada a quantidade de trabalho necessária para estudar os documentos e avaliações, em um caso de fair play financeiro. Ele defendeu que o prazo de 10 dias se aplicava a iniciar uma revisão, não a conclui-la.

No dia 19 de março de 2019, o CAS decidiu derrubar o pedido de reabertura da investigação. Neste mesmo dia, a Uefa, questionada pelo The New York Times, afirmou que “depois da conclusão de uma avaliação legal, com apoio de assessores jurídicos externos, quanto à interpretação do artigo acima mencionado, a Uefa concluiu que de fato havia fortes argumentos em apoio à interpretação apresentada pelo clube”.

Com informações do The New York Times

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