Descrição de chapéu The New York Times

Soterrado e quase morto em avalanche, americano volta ao snowboard

Brock Crouch passou cinco minutos debaixo da neve antes de ser resgatado, em 2018

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Shauna Farnell
The New York Times

Brock Crouch aprendeu muito desde que sobreviveu a uma avalanche, quase dois anos atrás. E voltar às suas velhas manobras no snowboard representa apenas uma pequena parte disso.

Natural da Califórnia, Crouch cresceu surfando e, depois de se apaixonar pelo snowboard, ascendeu rapidamente no ranking do esporte.

Aos 13 anos, ele já era um dos principais atletas na modalidade slopestyle, uma competição decidida por notas na qual atletas se lançam sobre uma série de obstáculos e rampas. Em 2017, ele começou a competir nos X Games.

Ele salta com a prancha de snowboard em meio a muita neve
Brock Crouch compete na final final slopestyle da Dew Tour Copper Mountain 2020 - Tom Pennington - 8.fev.20/AFP

Mas em abril de 2018, Crouch, aos 18 anos, estava fazendo “heliboarding” –ou seja, snowboarding em uma encosta inacessível e sujeita a avalanches, para a qual os atletas são levados de helicóptero– nos picos altos e indomados da região do Monte Whistler, na província canadense da Columbia Britânica, com um grupo de amigos e uma equipe de câmera.

Ele estava no topo de um funil estreito e muito íngreme, contemplando uma queda que ele calculava ser de entre três e cinco metros. Mas na verdade era uma cornija, um enorme cobertor de neve que se estendia pelo funil. Crouch estava planejando em que direção apontaria a prancha para uma jornada vertical de 450 metros entre encostas rochosas quando uma jornada mais violenta subitamente o arrastou.

Com um som que lembrava uma trovoada, o chão se abriu sob ele, e Crouch despencou encosta abaixo, em meio a uma torrente incontrolável de neve e rochas. O piloto do helicóptero acompanhou a queda do snowboarder e alertou a equipe sobre o lugar em que Crouch havia sido soterrado. Seguindo a trilha do deslizamento, os amigos dele usaram sistemas de rastreamento para localizá-lo e escavaram a neve para retirá-lo.

Crouch ficou soterrado por cerca de cinco minutos. Quando um amigo chegou a ele e removeu a neve de sua boca para que pudesse respirar, o snowbarder mordeu sua mão.

Ele recorda que um de seus primeiros pensamentos foi imaginar se seria capaz de voltar a andar –quanto mais praticar snowboard, ou retomar sua carreira de voos por rampas e encostas.

Brock Crouch faz uma manobra numa espécie de corrimão
Brock Crouch em ação no Dew Tour Copper Mountain 2020 - Tom Pennington - 8.fev.20/AFP

Crouch decidiu trabalhar por uma recuperação rápida. “Duas semanas e meia depois da avalanche, eu já estava indo, de bengala, à academia”, ele disse. “Queria melhorar o mais rápido que pudesse."

Isso envolvia longas horas de exercícios físicos, fisioterapia prolongada, consultas médicas constantes e 28 cirurgias odontológicas. Menos de sete meses mais tarde, Crouch estava recuperado o suficiente para voltar à prancha. A primeira coisa que desejava fazer era voltar às encostas imprevisíveis das montanhas distantes.

“Depois de meu acidente, eu estava conversando com meu pai um dia”, afirmou Crouch. “Ele disse que era hora de eu decidir o que queria fazer. Eu decidi que, se não voltasse logo a filmar nas encostas, provavelmente seria um cara tímido pelo resto da vida."

Crouch se equipou da melhor maneira possível antes de voltar ao território das avalanches. “O que fiz foi treinar primeiros socorros, e um monte de cursos sobre avalanches. Comecei a levar as coisas muito mais a sério”, contou.

Ele passou a maior parte do inverno do ano passado deslizando por encostas íngremes longe das áreas oficiais de esqui. Teve de superar alguns demônios, mas nenhum deles em forma de um deslizamento letal de neve.

“Eu estava em Tahoe quando comecei a enfrentar problemas”, disse, falando sobre seu nervosismo.

“Estávamos descendo grandes encostas, na primavera. A equipe que eu tinha comigo me ajudou a superar muita coisa. Sempre que estou nas encostas e vejo uma cornija, penso sobre aquele dia e sobre o que aconteceu. Mas a única coisa quer você pode mesmo fazer é ir em frente e continuar pensando no futuro e no progresso."

De volta às competições aos 20 anos, na atual temporada, Crouch mostrou progresso. Vinte meses depois da avalanche, ele está competindo em nível ainda mais alto do que no passado. No Winter X Games, em janeiro, chegou em quarto, ficando logo abaixo do pódio.

Eles posam para a foto abraçados e mostrando as pranchas
Red Gerard e Brock Crouch após o Dew Tour Copper Mountain 2020 - Tom Pennington - 8.fev.20/AFP

No começo deste mês, em uma competição da Dew Tour, Crouch chegou em segundo, derrotado apenas por um de seus melhores amigos, Red Gerard, que levou o ouro olímpico na modalidade em 2018. Crouch classifica essa experiência como uma das melhores de sua vida, e Gerard afirmou que ela representava um grande passo para o amigo e para o esporte que eles compartilham.

“Por algum tempo, ficamos sem ver Brock nas competições”, declarou Gerard. “Foi uma recuperação muito demorada, e suas velhas manobras assustavam os adversários. Os X Games e a Dew Tour me surpreenderam, e foi realmente empolgante ver que ele reaprendeu a fazer suas velhas manobras, e superou seus medos. Era visível que ele estava superando aquela fase. É muito bom vê-lo de volta”.

Na semana passada, Crouch e Gerard estavam de volta ao território das avalanches, perto de Jackson Hole, Wyoming, e passando seus dias sobre as pranchas em zonas sujeitas a avalanches, filmando manobras, antes de participarem do último grande torneio da temporada, o Burton U.S. Open.

Crouch chegou à competição da forma que faz todas as coisas hoje em dia: fisicamente mais forte e mentalmente transformado.

“Quando um acidente como aquele acontece com alguém, muda sua vida drasticamente”, disse. “Para mim, as mudanças foram muito boas. Agora levo minha saúde física muito mais a sério, tentando cuidar do meu corpo o mais que que posso, comendo de modo saudável. Também estou tratando meus amigos do modo certo."

Sim, ele está mais ciente dos perigos de avalanche, mas também mais consciente do mundo ao seu redor, em termos gerais, e acredita que encarar a própria mortalidade pode ajudar todo mundo.

“Eu lamento pelas pessoas que estão no mundo e não passaram por algo assim”, afirmou. “Às vezes, ouvindo o jeito de meus amigos quando falam com suas mães, eu paro e questiono, ‘cara, o que é isso?’ Sinto que saber que sua vida pode acabar a qualquer segundo realmente muda tudo. Certamente mudou muito a minha vida. Tornei-me um ser humano melhor."

Tradução de Paulo Migliacci

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