Apogeu de jogadoras dos EUA causou revés em disputa contra federação

Para juiz, no período analisado elas receberam mais que atletas da seleção masculina

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Andrew Das
The New York Times

Depois que um juiz rejeitou as reivindicações de igualdade na remuneração feitas pelas jogadoras da seleção de futebol feminino dos Estados Unidos, ganhadora da mais recente Copa do Mundo, na sexta-feira (1º), não foram as palavras pronunciadas pela US Soccer (a federação de futebol dos Estados Unidos) que calaram mais fundo. Mais importantes foram as palavras não ditas.

A US Soccer não afirmou em ponto algum de seu comunicado de duas páginas sobre a decisão que estava feliz com o resultado. A federação, que começou a ser combatida judicialmente pelas jogadoras da seleção quatro anos atrás, tinha todos os motivos para celebrar, é claro.

Depois de uma disputa prolongada que abalou a reputação da organização, causou embaraços aos seus líderes, zangou os patrocinadores e ameaçou seu futuro financeiro, a decisão sumária do juiz em seu favor, quanto à reivindicação de igualdade na remuneração, não foi só um triunfo sobre as jogadoras. Foi uma rejeição devastadora do argumento central das reclamantes.

As jogadoras vinham argumentando há anos que recebiam remuneração menor do que as de seus colegas na seleção masculina americana. Elas repetiram em numerosas ocasiões que mereciam pagamento igual.

Repetiram essa palavra de ordem em hashtags, camisetas e entrevistas coletivas, e ouviram os torcedores do time a usarem como grito de guerra em partidas amistosas, na final da Copa do Mundo e nas paradas com que o time foi recebido ao retornar.

E depois de tudo isso, em um parágrafo demolidor da decisão anunciada na sexta-feira, o juiz encarregado do caso, R. Gary Klausner, da justiça federal dos Estados Unidos em Los Angeles, lhes informou que elas não tinham razão.

Klausner escreveu que a US Soccer não só não pagava menos às mulheres do que aos homens como que os argumentos da defesa o haviam convencido de que “a seleção feminina havia recebido pagamentos cumulativos e pagamentos médios por jogo superiores aos da seleção masculina”, nos anos cobertos pelo caso.

As provas apresentadas pelos advogados das reclamantes para contestar a matemática da federação, ele concluiu, “são insuficientes para criar uma questão factual genuína que embase um julgamento”.

Na prática, ele afirmou, as jogadoras não teriam qualquer possibilidade de vitória.

Jogadoras dos EUA chegaram e entrar em campo com a camiseta do avesso em protesto contra a federação
Jogadoras dos EUA chegaram a entrar em campo com a camiseta do avesso em protesto contra a federação - Jerome Miron - 12.mar.20/USA Today Sports

A brutal ironia, evidentemente, foi que, ao escolher lutar contra a US Soccer em um momento no qual estavam no apogeu de sua força –campeãs da Copa do Mundo, estrelas na mídia social, e respeitadas porta-vozes internacionais do empoderamento feminino—, as jogadoras da seleção americana também escolheram o pior momento possível para comparar alguns anos de sua remuneração à remuneração da seleção masculina.

Desde fevereiro de 2015, a data base definida para a ação coletiva, a seleção feminina ganhou duas Copas do Mundo (e recebeu milhões de dólares em bonificações por essas vitórias) e obteve outros avanços ao negociar um novo contrato coletivo de trabalho com a US Soccer. Já a seleção masculina dos Estados Unidos caiu seriamente, e os seus fracassos em campo ajudaram a enfraquecer o caso das mulheres.

Por não se classificarem para a única Copa do Mundo masculina disputada no período do caso, os homens se tornaram inelegíveis para milhões de dólares em bonificações por participação a que teriam tido direito. Esses valores teriam engordado os pagamentos da US Soccer à seleção masculina e os levado a valores muito mais altos do que as mulheres poderiam obter.

Assim, a US Soccer pôde argumentar que não só não estava pagando menos às mulheres como na verdade pagava mais a elas do que à seleção masculina. As planilhas que delineavam os números –como muitas das ações da US Soccer durante o caso— tiveram um péssimo efeito no tribunal da opinião pública e enfureceram as jogadoras.

Mas como argumento judicial, permitiram que Klausner concluísse que os números da federação, pelo menos na janela de tempo estreita que estava em julgamento, eram exatos.

As jogadoras prometeram recorrer da decisão e assumiram o compromisso de levar adiante as demais acusações de desigualdade que Klausner manteve, centradas em viagens, acomodações em hotéis e equipes de apoio. Mas o sucesso no tribunal parece mais distante do que nunca para o caso delas.

Isso não significa, porém, que não exista um caminho para algo que possa ser declarado como vitória pelos dois lados. A única questão é quanto custaria a paz.

As jogadoras podem ter de dar o primeiro passo, o que seria humilhante, mas não sem precedentes. A meio-campista Megan Rapinoe, talvez a mais efetiva porta-voz das jogadoras, reconhece há muito tempo que a igualdade na remuneração é uma “questão complexa” que não se limita aos pagamentos, e no passado ela e suas colegas de time pressionaram pela realização de uma mediação, que se provou infrutífera.

Em caráter privado, pessoas dos dois lados concordam há muito tempo que uma paz negociada seria a melhor saída para a US Soccer e sua seleção feminina. Agora, essa pode ser a única maneira de contentar a todos

Tradução de Paulo Migliacci

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.