Descrição de chapéu BBC News Brasil 50 Anos do Tri

Os bastidores da pioneira transmissão do tri do Brasil na Copa de 70, que faz 50 anos

Quatro emissoras compartilharam o sinal e revezaram narradores e comentaristas

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Salvador | BBC News Brasil

"Alô, alô, México."

Era essa a deixa da vinheta de abertura das transmissões dos jogos da Copa do Mundo de 1970 na televisão brasileira. As imagens da seleção que conquistou o tri no México, há 50 anos, são até hoje as mais lembradas do nosso futebol em todo o mundo.

Para quem viveu a época, uma novidade tornou tudo ainda mais empolgante: aquela foi a primeira Copa com transmissão ao vivo na TV para o Brasil.

Por aqui, até 1966, a Copa do Mundo só podia ser acompanhada ao vivo pelo rádio. Na televisão, os jogos demoravam pelo menos até o dia seguinte para serem exibidos. As transmissões internacionais via satélite começaram em 1967, com um programa especial chamado "Our World", exibido ao vivo para 24 países.

Publicação faz homenagem ao narrador Fernando Solera após a Copa do Mundo de 1970
Homenagem ao narrador Fernando Solera, publicada após a Copa do Mundo de 1970 - Arquivo Thiago Uberreich

Mas o Brasil só entrou nessa era em 1969, graças a uma estação da Embratel instalada em Tanguá, no Estado do Rio de Janeiro. Uma entrevista no Vaticano com o papa Paulo 6º, exibida pela Globo no dia seguinte, foi a primeira transmissão via satélite na tevê brasileira. Depois, os brasileiros puderam assistir, dessa vez ao vivo, à decolagem da missão Apollo 9 e à chegada do homem à Lua na missão Apollo 11.

Para a Copa do Mundo do ano seguinte, após tensa negociação com o empresário mexicano Emilio Azcárraga Milmo, os direitos de transmissão da competição foram vendidos para quatro emissoras brasileiras, mas só haveria um sinal de áudio à disposição. A solução, por meio de um "pool" formado por Tupi, Globo, Record e Bandeirantes, foi exibir a mesma transmissão em cadeia para todos os canais, com narradores e comentaristas se revezando a cada jogo e também na mesma partida.

"Eu estava de férias em Ubatuba, e me encontrou na praia um motorista da Bandeirantes, que disse que a diretoria tinha mandado ele lá para 'subir' comigo pra tomar as providências para a transmissão da Copa. Eu nem imaginava a possibilidade de uma transmissão ao vivo", relembra o narrador Fernando Solera, 87, último remanescente daquela equipe de transmissão.

Geraldo José de Almeida, o "Gera", inventor do termo "seleção canarinho"
Geraldo José de Almeida, o "Gera" (à dir.), inventor do termo "seleção canarinho" - Acervo Que Fim Levou

A seleção da TV tinha os narradores Geraldo José de Almeida, Walther Abrahão, Oduvaldo Cozzi e Fernando Solera, com a companhia dos comentaristas João Saldanha — técnico da seleção nas Eliminatórias —, Rui Porto, Geraldo Bretas e Leônidas da Silva.

O rodízio entre eles foi decidido através de um sorteio realizado na Cidade do México pelo diretor da TV Tupi, Enéas Machado de Assis, que coordenava as atividades dos integrantes do pool. Mas todos tiveram o seu momento de destaque durante a transmissão da campanha do Tri

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Olha lá, olha lá, no placar!

"Alô, alô, Brasil! Alô, meu caríssimo telespectador da Rede Brasileira de Televisão". Assim, do estádio Jalisco, em Guadalajara, Fernando Solera iniciou a transmissão da estreia do Brasil contra a antiga Tchecoslováquia, no dia 3 de junho, tendo a seu lado, nos comentários, o craque Leônidas da Silva, artilheiro da Copa do Mundo de 1938. "Estávamos ultrainteressados em viver a experiência", conta Solera à BBC News Brasil.

Aos 11 minutos de jogo, a imagem que focava Pelé mudou rapidamente para o atacante Petras, que invadiu a área brasileira e tocou por cima de Félix para abrir o marcador. "Ô, meu Deus do céu, olha o gol de Petras para a Tchecoslováquia", lamentou Solera.

Mas ele logo narraria o primeiro gol da seleção em Copas transmitido ao vivo na tevê brasileira, depois que Pelé cavou falta na entrada da área. "Onde está o Rivelino? Onde está o Rivelino?", perguntou, como se já soubesse que Riva soltaria a bomba que os mexicanos apelidariam de patada atômica. "Não dava outra coisa, Leônidas! Rivelino e fim de papo, 1 a 1".

Nos 45 minutos a que tinha direito, Solera ainda narrou um dos lances mais marcantes daquela Copa, quando Pelé chutou de trás da linha do meio-campo e quase marcou um golaço. "A sobra é para Pelé, que resolve tentar enganar o goleiro e quase, quase, quase, quase, quase que ele derruba esse estádio se ele faz esse gol", disse na transmissão. "Essas coisas é que fazem o futebol ser sensacional", completou.

A partir daí, seria a vez de Geraldo José de Almeida — o inventor do apelido "seleção canarinho" — soltar a voz com o show brasileiro no segundo tempo. Gérson fez lançamento perfeito para Pelé, que dominou a bola no ar como numa coreografia, deixou ela quicar e soltou a bomba para virar o jogo.

O narrador gritou o seu bordão característico na hora do gol: "Olha lá, olha lá, no placar", carregando na pronúncia da letra r. "Deus lhe pague, Pelé! Golaço de Pelé, Saldanha".

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