Atletas da NBA boicotam jogos dos playoffs após violência policial contra homem negro

Milwaukee Bucks inicia movimento, e protestos impactam outros esportes nos EUA

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Jogadores da NBA resolveram boicotar a rodada dos playoffs programada para esta quarta (26), no complexo da Disney, na região metropolitana de Orlando. A decisão foi tomada como manifestação contra mais um ato de violência policial nos EUA: os tiros dados pelas costas em Jacob Blake, um homem negro.

Blake, 29, sobreviveu, mas ficou paralisado da cintura para baixo, segundo seu pai, e segue internado.

Os atletas do Milwaukee Bucks deram forma ao protesto recusando-se a entrar em quadra para enfrentar o Orlando Magic, no que seria o primeiro dos três jogos do dia. O elenco do Magic chegou a se dirigir ao ginásio para realizar seu aquecimento, mas deixou o local quando ficou claro que o adversário não apareceria.

Na sequência, representantes das outras equipes que atuariam na rodada decidiram aderir ao boicote. Assim, a NBA anunciou o adiamento de Oklahoma City Thunder x Houston Rockets e Los Angeles Lakers x Portland Trail Blazers.

Uma reunião entre dirigentes e jogadores na noite desta quarta discutiu a possibilidade de encerrar a temporada imediatamente, mas não se chegou a uma conclusão sobre quais serão os próximos passos.

O movimento de boicote ganhou solidariedade das equipes, com múltiplas manifestações de consentimento. Os donos dos Bucks publicaram um texto declarando "total apoio" ao elenco. Afirmaram que não foram informados previamente, mas que, se tivessem ciência do plano, "teriam concordado de todo o coração".

Jeanie Buss, 58, da família que controla os Lakers, posicionou-se "ao lado dos jogadores, hoje e sempre". "Após mais de 400 anos de crueldade, racismo e injustiça, todos nós precisamos trabalhar juntos para dizer que chega", afirmou.

O boicote teve um efeito cascata em outras ligas. A WNBA, versão feminina da liga norte-americana de basquete, também adiou os jogos programados para quarta. As jogadoras usaram camisetas com furos similares a tiros para protestar. Na MLB, a liga de beisebol, o Milwaukee Brewers e o Seattle Mariners tomaram a decisão de não atuar, o que foi seguido por outras equipes.

O torneio de tênis de Cincinnati, disputado em Nova York neste ano, anunciou a suspensão das partidas marcadas para esta quinta-feira (27) em solidariedade às manifestações antirracistas nos EUA. Os jogos das semifinais foram remarcados para sexta (28).

A decisão, tomada conjuntamente pela Federação de Tênis dos Estados Unidos, ATP e WTA, foi anunciada depois que a tenista japonesa Naomi Osaka declarou sua adesão ao boicote.

"Como esporte, o tênis está adotando coletivamente uma postura contra a desigualdade racial e a injustiça social que mais uma vez foi posta em evidência nos Estados Unidos", disse a USTA em nota.

Disputada em uma “bolha” montada para isolar a NBA dos riscos de contaminação pelo novo coronavírus, a liga norte-americana de basquete foi retomada no mês passado, em meio a protestos ligados à questão racial em todo o país. A associação dos atletas só topou o retorno com a condição de que haveria espaço para essa questão.

As quadras onde estão sendo disputados os jogos estão pintadas com a frase “vidas negras importam”. Essa também é uma das mensagens colocadas nas camisas, no local onde geralmente fica o nome dos atletas. Ficou a critério deles manter a inscrição habitual ou usar o espaço para textos como “igualdade”, “paz” e “reforma educacional”.

Apesar disso, vários jogadores se manifestaram contrários à retomada, justamente por entender que a volta do basquete a uma situação competitiva e a opção de entretenimento oferecida pela NBA desviariam a atenção da luta racial. Quando se deu o caso Jacob Blake, nesta semana, alguns entenderam que continuar jogando tinha perdido o sentido.

“Nós nem deveríamos ter vindo a esta droga de lugar, para ser honesto. Ter vindo para cá tirou o foco de quais são as reais questões”, disse o armador George Hill, 34, dos Bucks, na última segunda (24), revoltado ao descobrir que Blake, 29, havia levado sete tiros na cidade de Kenosha, no Wisconsin, onde também fica Milwaukee.

“Eu sei que as pessoas se cansam de me ouvir dizer isso, mas nós, como negros nos Estados Unidos, estamos com medo. Homens negros, mulheres negras, crianças negras, estamos aterrorizados”, disse LeBron James, 35, astro dos Lakers, que adotou uma mensagem agressiva no Twitter, com palavrões e letras garrafais: “F...-se isso. Exigimos mudança”.

O técnico Doc Rivers, 58, também passou uma mensagem carregada de emoção após a vitória de seu Los Angeles Clippers sobre o Dallas Mavericks, na última terça (25). “Somos nós os que estão sendo mortos. Levamos tiros, e tudo o que você faz é continuar falando sobre medo. É incrível para mim que continuemos amando este país e este país não nos ame de volta”, afirmou.

A NBA tem se colocado do lado dos jogadores nas questões sociais, que ganharam peso com o assassinato de George Floyd, 46, em maio. Vários atletas da liga apareceram em manifestações após a morte dele, que teve o seu pescoço prensado no chão por um policial branco por cerca de oito minutos.

Os dirigentes da liga foram pegos de surpresa, no entanto, quando tomou forma o boicote às partidas desta quarta. Apesar das declarações de repúdio a mais um ato de violência nos Estados Unidos, o comissário Adam Silver e seus auxiliares não vislumbravam a hipótese de os jogos não serem realizados.

A conclusão da NBA tem agora um risco que não se apresentava como o maior na retomada da competição. A grande preocupação era com a eficácia da “bolha”, porém os protocolos rígidos têm funcionado e a testagem diária de todos os que estão no ambiente controlado da Disney tem até agora um total de zero caso de Covid-19.

Fora da “bolha”, porém, os problemas não cessaram. O coronavírus e a violência policial continuam sendo questões graves em várias partes do território norte-americano. Ao menos por um dia, os jogadores de basquete decidiram que ficar de joelhos no momento da execução do hino nacional não era o suficiente.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.