Descrição de chapéu Financial Times Tóquio 2020

Risco financeiro de sediar Olimpíada é semelhante ao de desastres naturais

Estudo feito por pesquisadores de Oxford diz que COI minimiza estouros de orçamento

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Leo Lewis Murad Ahmed
Tóquio e Londres | Financial Times

Cidades que estejam considerando uma candidatura para sediar Jogos Olímpicos deveriam calcular o risco financeiro usando modelos aplicados a desastres naturais, pandemias e guerras, advertiu uma equipe de pesquisadores da Universidade de Oxford.

O estudo, intitulado, “Regression to the Tail: Why the Olympics Blow Up”, acusa o Comitê Olímpico Internacional (COI) de minimizar o que os pesquisadores definem como riscos inevitáveis de grandes estouros de custo.

O relatório sugere que as cidades que pensam em se candidatar a sediar eventos olímpicos deveriam temperar suas ambições e presumir que o orçamento previsto para os Jogos terá de ser triplicado.

O COI e os organizadores da Olimpíada de Tóquio 2020 estão lutando com as dificuldades logísticas relacionadas a realizar o evento com atraso, e, de acordo com os cálculos dos pesquisadores de Oxford, os Jogos do Japão já se tornaram os mais dispendiosos de todos os tempos.

A proposta original da capital japonesa calculava um custo de US$ 7,3 bilhões (cerca de R$ 39 bilhões na cotação atual) para organizar os Jogos, mas a agência nacional de auditoria do Japão, que destacou que o governo embutiu diversos custos do evento em orçamentos não olímpicos, estimou que o custo final possa ser até três vezes mais alto.

Ainda que as autoridades japonesas continuem a insistir em que a Olimpíada está pronta para seguir adiante a despeito das preocupações atuais com relação ao coronavírus, o apoio do público do país aos Jogos parece estar se reduzindo. Uma recente pesquisa com 13 mil empresas japonesas, conduzida pela Tokyo Shoko Research, constatou que mais de metade delas se opunha à realização no próximo ano.

De acordo com os pesquisadores, o estouro de custos da Olimpíada do Rio de Janeiro em 2016 foi da ordem de 352%, e o de Londres em 2012 foi de 76%. O estouro médio de custos, para os Jogos de Verão e os de inverno realizados desde 1960, foi de 172%, nos cálculos deles.

Para explicar o estouro dos custos olímpicos, os pesquisadores afirmaram que eles não passam por uma “regressão à média” –o fenômeno estatístico que dispõe que uma variável extrema na medição inicial tenderá a se aproximar da média na medição seguinte.

Em lugar disso, eles passam por uma “regressão à cauda”, com os estouros de gastos em cada edição individual dos Jogos variáveis a ponto de distender ao infinito os possíveis resultados para os países sedes. “Desastres graves como terremotos, tsunamis, pandemias e guerras tendem a seguir esse tipo de distribuição [estatística]”, afirmaram os autores.

“Eventos como esses não são apenas os incidentes infelizes e ocasionais que parecem ser lamentáveis, mas que poderão ser evitados no futuro com mais preparo e sorte melhor. Em lugar disso, os estouros de custos olímpicos são sistemáticos, governados por uma lei de força que se imporá repetidamente, com resultados mais e mais desastrosos.”

Bent Flyvbjerg, economista na Escola Saïd de Administração de Empresas, em Oxford, e líder da pesquisa, acusou o COI de “ou se iludir ou deliberadamente desconsiderar os fatos desconfortáveis”, ao determinar os níveis de contingência para o evento.

Ele também argumentou que a organização sediada em Lausanne, na Suíça, deveria ser responsabilizada por não informar os organizadores corretamente quanto aos riscos.

Flyvbjerg disse que o COI era irrealista quanto ao nível das provisões para contingências que estipulava. A compreensão da entidade quanto ao risco, ele disse, se baseava em uma suposição de “aleatoriedade lenta”, em lugar da “aleatoriedade extrema” que, na opinião dos pesquisadores de Oxford, governa os riscos financeiros de sediar Olimpíadas.

Os motivos subjacentes que tornam estouros de custo inevitáveis, disse Flyvjberg, incluem a falta de capacidade do país anfitrião para reverter sua decisão, ou qualquer possibilidade de economizar custos atrasando o projeto.

Os anfitriões são, por sua natureza, “eternos principiantes” –cada candidato para todos os efeitos práticos começa do zero em um megaprojeto para o qual cada cidade não tem praticamente qualquer memória institucional relevante.

Também existe a síndrome do “cheque em branco”, sob a qual a cidade anfitriã tem obrigação legal de cobrir os estouros de custos, enquanto o COI não assume responsabilidade similar.

O relatório de Oxford sugere algumas possíveis soluções, entre as quais entregar a organização de dois jogos sucessivos a cada anfitrião e cláusulas de contingência maiores para cobrir possíveis estouros de custos.

O COI criticou as constatações, afirmando que os pesquisadores não lhe solicitam dados há anos, e argumentando que o estudo “adota uma abordagem fundamentalmente falha” ao misturar dois orçamentos diferentes”: o orçamento de organização dos Jogos e os orçamentos de infraestrutura da cidade, região e país sedes.

“Isso cria a impressão completamente errônea de que essa infraestrutura serve apenas para as quatro semanas de competição dos Jogos Olímpicos e deve ser descartada imediatamente depois”, afirmou o COI. “O que simplesmente não é verdade. E aparentemente o legado do evento também é excluído totalmente do quadro.”

O COI em 2015 introduziu reformas conhecidas como “Agenda 2020”, para reduzir os custos de candidatura e organização dos Jogos, por exemplo ao encorajar cidades a usar estádios existentes.

O futuro das Olimpíadas também está garantido pelos próximos 10 anos, depois que Paris conquistou o direito de organizar o evento de 2024 e Los Angeles o de 2028.

Mas essas definições vieram apenas depois que só as duas cidades restavam como candidatas a organizar a Olimpíada de 2024, dentre os muitos aspirantes iniciais a sediar o evento.

Depois que preocupações referentes aos custos puseram fim às candidaturas de Budapeste, Boston e Roma, o COI estava ansioso para garantir o futuro do maior evento do planeta pela próxima década, e persuadiu Los Angeles a aceitar ser sede quatro anos mais tarde do que a cidade propunha.

Tradução de Paulo Migliacci

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