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'Mago das transferências' faz do Sevilla um clube-modelo na Europa

Diretor esportivo, Monchi é a cabeça por trás do bom trabalho de mercado dos andaluzes

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São Paulo

Johan Cruyff, histórico jogador e técnico do Barcelona, disse certa vez que o fato de um clube ser mais rico que outro não significa que o time com menos recursos financeiros não possa vencer. "Eu nunca vi um saco de dinheiro marcar um gol", afirmou o holandês.

A metáfora de Cruyff ilustra de certa forma o duelo deste domingo (4) entre Barça e Sevilla, que acontece às 16h (de Brasília), pela quinta rodada de LaLiga, com transmissão da ESPN Brasil.

Philippe Coutinho e Antoine Griezmann foram os maiores investimentos recentes do clube catalão. O francês, que chegou na temporada passada por 120 milhões de euros (R$ 505 milhões), entregou pouco em campo –apenas 15 gols em 48 jogos.

Coutinho foi comprado em 2018 por 160 milhões de euros (R$ 621 milhões) e acabou emprestado em 2019 ao Bayern de Munique (ALE). Desafiando a lógica cruyffista, o saco de dinheiro marcou seus gols. Para azar do Barcelona, porém, justamente contra o clube que detém seus direitos econômicos.

Nas quartas de final da última Champions League, o brasileiro anotou duas vezes e deu uma assistência na goleada de 8 a 2 do Bayern sobre o Barça. Campeão europeu com o time alemão, Coutinho está de volta ao Barcelona para um novo ciclo.

Já o Sevilla não tem condições de investir essas quantias na contratação de um único jogador. E mesmo se tivesse, provavelmente não o faria.

Em um mercado tão inflacionado como o do futebol europeu, clubes dessa envergadura não podem se dar ao luxo de gastar e errar, para depois gastar de novo na tentativa de cobrir os buracos. É preciso dar tiros certeiros na janela de transferências, e o Sevilla é um bom modelo de como fazer isso.

Dos 11 jogadores que iniciaram a final da última Europa League, contra a Inter de Milão (ITA), 9 haviam chegado para a temporada: Bono (empréstimo), Koundé, Diego Carlos, Reguilón (empréstimo), Fernando, Jordán, Ocampos, Suso (empréstimo) e De Jong. Ao todo, custaram menos de 100 milhões de euros, e ajudaram o Sevilla a conquistar seu sexto título na competição.

A cabeça por trás desse sucesso tem nome e sobrenome, mas é conhecido principalmente por seus apelidos: Monchi, ou o "Mago das Transferências".

Diretor esportivo do Sevilla, Ramón Rodríguez Verdejo, 52, foi goleiro reserva do clube entre o fim da década de 1980 e o ano de 1999, quando pendurou as chuteiras e recebeu o convite para ser diretor de futebol.

Monchi assumiu o departamento e começou a implementar mudanças na formação de jogadores da base e principalmente na prospecção de atletas.

Monchi é arremessado pelo alto por atletas após a conquista da Europa League
Monchi é arremessado pelo alto por atletas após a conquista da Europa League - Lars Baron - 21.ago.2020/AFP

Seu entendimento é o de que clubes como o Sevilla precisam ser mais rápidos que os concorrentes no mercado, buscando com os reforços um legado esportivo e, mais para frente, retorno financeiro.

Daniel Alves, o negócio que mais orgulha Monchi, é um exemplo dessa política. Revelado no Bahia, o lateral direito foi contratado por 800 mil euros em 2003, conquistou cinco títulos e foi vendido ao Barcelona, em 2008, por 35 milhões de euros.

Desde que ele assumiu o futebol do Sevilla, há 20 anos, o time conquistou seis vezes a Europa League e faturou duas Copas do Rei, além de uma Supercopa da Espanha e uma Supercopa Europeia. Até sua chegada, o clube fundado em 1890 tinha somente quatro taças.

Atualmente, Monchi conta com uma equipe de 12 scouts espalhados pelo mundo, que dividem o processo de observação em três grupos: um primeiro com ligas de elite e mercados exportadores como Brasil e Argentina; um segundo com ligas de segundo escalão; e um terceiro com torneios de seleções fora da Europa.

Esses profissionais são auxiliados por ferramentas de big data, que geram uma série de informações sobre os atletas e ajudam a conduzir a observação do scout.

Para Monchi, apesar de a tecnologia ser uma aliada, é preciso entender de futebol e contar com o olhar humano do observador.

"Eu sou um defensor dos dados, um doente pelo big data, pela inteligência artificial. O dado tem uma ajuda fundamental. O que precisamos saber é que dado utilizar. Em cada jogo são gerados aproximadamente 8 milhões de dados. E nem todos são necessários", disse Monchi em bate-papo organizado por LaLiga com jornalistas de todo o mundo e do qual a Folha participou.

"O dado vai te dar duas coisas fundamentais: primeiro, você vai poder selecionar antes, de acordo com o perfil que você busca, uma seleção de jogadores. Você não vai ter que ver todos, o dado vai te dar a direção. E sobretudo, vai cortar sua margem de erro. São duas bases importantes que vão sustentar o trabalho."

Abraçados à esq., Daniel Alves e Luis Fabiano trouxeram desempenho e títulos ao clube andaluz
Abraçados à esq., Daniel Alves e Luis Fabiano trouxeram desempenho e títulos ao clube andaluz - Cristina Quicler - 4.mar.2008/AFP

O sucesso como "mago das transferências" chamou a atenção de clubes extrangeiros e, em 2017, Monchi foi contratado pela Roma para tentar implementar seu modelo na Itália. Não deu certo.

Apesar de não ter conseguido emplacar resultados na equipe da capital italiana, disse ter aprendido durante sua passagem pela Roma e defende que suas ideias são aplicáveis a outros clubes.

Mas fato é que, no Sevilla, para onde retornou em 2019, o dirigente se sente em casa e está respaldado pelas taças que ajudou a conquistar com seus métodos. Como mostrou com os reforços que conquistaram a última Europa League.

Essa conexão com o clube andaluz produziu, durante a pandemia, um curso virtual denominado "Monchi Masterclass". São 13 aulas, cada uma com 13 minutos (referência ao número que ele usava como goleiro), que explicam sua metodologia de trabalho, ilustrada com casos que aconteceram ao longo de sua gestão.

"O que eu quis fazer com o Masterclass foi explicar nosso projeto. Não creio que seja um segredo que deva ser guardado. Não há nenhum afã de protagonismo ou egocentrismo. Sou um defensor da figura do diretor esportivo e desde minha modéstia, minha experiência, se eu puder ajudar que alguém aprenda algo, me sinto muito feliz", diz o espanhol.

Ao compartilhar seu conhecimento, o diretor também acena ao mercado e faz uma afirmação, de que o seu clube não entrega o destino ao azar. Como tem feito o Barcelona, que mais uma vez, com chegadas e saídas, inclusive de treinador, ainda precisa encontrar uma cara.

Algo que o Sevilla, independentemente de quem jogue, já tem. A cara de Monchi.

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