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Atleta paraplégico une ciência e esporte em 'olimpíada biônica'

Brasileiro é estimulado a pedalar por meio de tecnologia desenvolvida na UnB

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São Paulo

Estevão Lopes, 42, considera que sua vida hoje em dia é "mil vezes melhor" do que a que tinha em 2012. Não é uma declaração simples. Em março daquele ano, ele foi atingido por uma bala perdida no Riacho Fundo, região administrativa de Brasília, e ficou paraplégico.

"Eu agora tenho um propósito. Antes tinha um cotidiano de escritório, barzinho, happy hour. Não possuía pretensão nenhuma", afirma.

Nesta sexta-feira (13), Estevão será o único representante da América Latina na Cybathlon, também chamada pelos envolvidos de "olimpíada biônica".

O brasileiro Estevão Lopes se prepara para a Cybathlon de 2020, a 'olimpíada biônica'
O brasileiro Estevão Lopes se prepara para a Cybathlon de 2020, a 'olimpíada biônica' - Equipe EMA UnB

O campeonato reúne equipes que desenvolvem tecnologias para aperfeiçoar a reabilitação de pessoas com deficiência. O brasileiro usará um triciclo em que seus músculos da perna são estimulados eletronicamente para pedalar.

A tecnologia foi desenvolvida por pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB), em projeto iniciado no início da década passada.

"Eu não mexo as pernas, mas depois que entrei no projeto, em 2015, só de massa muscular nas coxas ganhei mais de 20 cm. Melhorei a circulação [de sangue], cicatrização, densidade óssea", diz Estevão, que foi finalista na primeira edição da Cybathlon, realizada em 2016, em Zurique, na Suíça.

A competição deste ano também deveria acontecer na cidade, mas a pandemia da Covid-19 provocou mudança de planos.

Os organizadores mandaram para cada time um aparelho que deixa a bicicleta ou o triciclo estáticos, sem sair do lugar com as pedaladas. Todos os competidores estarão online ao mesmo tempo, e a telemetria do tempo gasto e da velocidade serão enviados para Zurique. A distância a ser percorrida é de 1.200 metros, com o tempo limite de oito minutos.

O evento poderá ser acompanhado pela internet, e a prova do brasileiro acontecerá a partir das 14h (de Brasília).

Há seis categorias na Cybathlon, que envolvem resolver tarefas como cortar um pão e abrir um frasco de geleia, levantar de um sofá, além das corridas de bicicleta ou de cadeira de rodas. Neste ano, 60 equipes de 40 países estarão envolvidas.

O princípio da tecnologia desenvolvida pela equipe brasileira de certa forma lembra os aparelhos que tonificam o abdômen com choques elétricos. É uma comparação grosseira, Estevão reconhece. "Mas serve apenas para dar ao público leigo uma noção do que se trata."

O estímulo eletrônico precisa ser feito na medida e no ângulo precisos. Os engenheiros da Universidade de Brasília desenvolveram um computador do tamanho de um aparelho celular, com a programação que envia os choques para os músculos.

Foi depois de ser atingido pela bala perdida que Estevão passou a se dedicar ao esporte e se tornou atleta das versões adaptadas de vela, remo e canoagem. Hoje está à frente de projetos sociais para oferecer essas modalidades a pessoas com deficiência. Um deles, o "Capital do Remo", é um dos maiores do gênero na América do Sul.

"Um dos motivos [para estar no projeto desenvolvido pela Universidade de Brasília] é que essa tecnologia não fique apenas em mim, que sou atleta de alto rendimento. Que sirva também para quem tem esse tipo de problema e não é atleta, como pessoas da terceira idade, por exemplo", diz.

Esse é um dos objetivos da Cybathlon: mostrar o avanço científico já aplicado ao usuário final para encurtar a distância entre a tecnologia e o público.

"Com os investimentos adequados, essa é uma tecnologia que poderia chegar à população daqui a cinco ou dez anos. Hoje temos um produto mais robusto e confiável. Nem sequer usamos todas as novidades científicas que temos porque queremos ter a tecnologia mais confiável e segura possível", afirma Roberto Baptista, líder da equipe brasileira no torneio e um dos pesquisadores.

Por causa da falta de financiamento, a equipe de engenheiros, fisioterapeutas e profissionais de educação física que trabalham no projeto diminuiu. Em 2015, havia 20 pessoas com dedicação exclusiva às pesquisas, por contarem com subsídios e bolsas de estudo. Hoje em dia são sete, todos com trabalhos em outras áreas acontecendo em paralelo.

"Todo mundo que está aqui não tem bolsa e não tem condição de ter dedicação exclusiva. A gente tem uma patente depositada desse projeto, uma tecnologia nossa, várias teses de doutorado e mestrado publicadas. Temos parcerias internacionais com França, Alemanha e hoje nossa principal ligação é com a Suíça", finaliza Baptista, ressaltando que com financiamento para pesquisa seria possível fazer bem mais.

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