Descrição de chapéu Maradona (1960-2020)

Não sei quantos pênaltis Maradona perdeu na vida, mas um deles eu fotografei

O dia em que o craque argentino participou de um showbol em um ginásio de Brasília

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Brasília

Diante de tantos relatos relevantes sobre a grandiosidade de Diego Armando Maradona, escritos por pessoas com muito mais cabedal, sinto-me na obrigação de alertar para a evidente desimportância desse texto.

Ele trata apenas de um pênalti perdido pelo gênio argentino, só isso. Um fragmento extremamente minúsculo de uma história de vida maíuscula.

Um pênalti só, dentro de uma carreira espetacular. Nem "dentro de uma carreira" pode ser dito, na verdade, porque o pênalti foi perdido anos após ela ter sido encerrada.

O fato é que desde 18 de fevereiro de 2006, ou seja, há 14 anos e 9 meses, conto a quem queira ouvir a provável lorota de que fui a única pessoa que conseguiu fotografar, a poucos metros de distância, o momento exato em que Maradona, o gênio e o maior jogador de futebol que eu vi jogar, perdeu a sua única penalidade máxima batida na capital do seu país arquirrival, o Brasil.

Um feito para a minha vida de amante do futebol, é certo. Embora muito dificilmente seja verdade.

O exato momento em que Maradona perde um pênalti no ginásio Nilson Nelson, em Brasília, em 2006. Do goleiro Zetti, só se enxergam os pés - Ranier Bragon/ Folhapress

Repare na foto. A imperícia, a máquina amadora e a distância proporcionam uma falta de foco não intencional em que aparecem três brasileiros de costas, borrados, possivelmente Paulo Nunes, Careca e Cesar Sampaio (ou Júnior Baiano), um pedacinho das pernas do goleiro, um outro argentino qualquer e Maradona —talvez o único que esteja, digamos assim, dentro de alguma espécie de foco, obra e graça do divino, como sempre procuro ressaltar aos que querem ouvir.

A história começa assim: vinte anos depois de em uma mesma partida tomar emprestado la mano de Dios e de com suas próprias pernas fazer o gol mais sensacional da história das copas do mundo, contra a Inglaterra, Maradona resolveu desembarcar em Brasília, em 2006, aos 45 anos de idade, para um Brasil e Argentina entre amigos.

Não nos gramados, mas na quadra dura do ginásio Nilson Nelson, para um showbol, espécie de futsal em que a bola corre ininterruptamente e as placas de publicidade são usadas como tabela. Todos ali estavam aposentados, incluindo o astro maior, havia cerca de cinco anos.

Jogadores se preparam para o início da partida. Em primeiro plano, Paulo Nunes (de costas), Djalminha, Júnior Baiano e Maradona - Ranier Bragon/Folhapress

A partir exclusvamente da minha memória, procurei relembrar o que aconteceu nesse —para mim— memorável dia momentos após o impacto de visualizar na tela do celular a notificação que anunciava a morte do astro argentino.

Lembrava que o jogo havia ocorrido há muito, muito tempo, que tinha ido de folga com dois colegas jornalistas e com uma das minhas filhas (na verdade, ela que me lembrou disso), que tinha feito com uma câmera fotográfica Sony o registro do incrível pênalti defendido pelo goleiro (não lembrava quem), que havia dado a vitória aos brasileiros.

Não conseguia lembrar de nehum outro jogador dessa partida ou qualquer outra circunstância.

Ao achar em meio a centenas de outras as 8 fotos que imprimi e guardei durante todo esse tempo e ao pesquisar os relatos dessa visita de Dom Diego a Brasília descobri que, na verdade, o Brasil tomou uma espetacular virada após estar vencendo de 3 a 0, e acabou perdendo de 8 a 4.

Com dois gols de Maradona. Que, ufa, perdeu mesmo o tal pênalti, conforme atestado na inscrição que fiz no verso da foto: "Momento em que Maradona perdeu um pênalti, no 1º tempo, defendido por Zetti". Sim, o dono das pernas que aparecem na foto.

Maradona e Júnior Baiano, em lance da partida de showbol vencida pelos argentinos por 8 a 4 - Ranier Bragon/ Folhapress

Também pelas fotos, foi possível saber que Maradona não só brilhou como mantinha, mesmo na aposentadoria, o estilo marrento que caracterizou boa parte da sua carreira.

Em uma das imagens, aparece reclamando com o juiz. Em outra, caminhando para a lateral do ginásio com uma cara não muito satisfeita.

Maradona reclama com o juiz durante a partida no Nilson Nelson, em Brasília - Ranier Bragon/ Folhapress

O relato do jogo feito pela Folha informa que também participaram da exibição, embora miseravelmente quase nenhum tenha saído nas minhas fotos, Dunga, Djalminha, Bebeto, Almeyda, Basualdo, Goycoechea e Careca, que formou uma sensacional dupla com o argentino no Napoli, no final dos anos 80.

"Desde que chegou a Brasília, anteontem à noite, Maradona vem recebendo tratamento de popstar. Está sempre cercado por seguranças, fãs, fotógrafos e cinegrafistas. Ontem, antes de ir ao ginásio, posou para fotos e deu rápidas tragadas num charuto no saguão do hotel", diz a reportagem.

Sobre o desempenho no gramado, quer dizer, na quadra pintada de azul, segue o relato: "O astro argentino decepcionou no primeiro tempo e foi decisivo no segundo. Na primeira etapa, desperdiçou um pênalti e, em outra oportunidade, isolou a bola na arquibancada. Na etapa final, fez dois gols e comandou a virada dos argentinos, que terminaram o primeiro tempo perdendo de 3 a 0".

Minha pesquisa também mostrou que, evidentemente, houve registro fotográfico profissional do evento, com foco, como a foto abaixo, feita pelo então repórter fotográfico da Folha Lula Marques.

Não sei quantos pênaltis ele perdeu na vida, só sei que em relação a personagens da grandeza de um Maradona até os momentos mais desimportantes guardam o seu significado histórico, mesmo que apenas para pessoas sem qualquer importância.

Maradona participa de uma dividida na partida de showbol entre Brasil e Argentina - Lula Marques/Folhapress
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