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Ginástica quer levar parkour aos Jogos Olímpicos e irrita puristas

Federação da modalidade tenta impedir 'apropriação indébita' do esporte

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The New York Times

O parkour, um esporte ideal para registro em vídeo no qual aventureiros disputam corridas sobre telhados, saltam de edifício em edifício e galgam paredes sem ajuda ou equipamento, sempre pareceu um pouco diferente. Seu espírito de liberdade o destaca de outros esportes, e essa percepção é encorajada por seus fãs, praticantes e organizadores.

Mas à medida que a modalidade começou a ganhar prestígio, desde seu surgimento no final da década de 1980, ela se tornou mais organizada. E diante da possibilidade de um grande ganho de legitimidade no futuro, surgiu uma disputa interna dentro do esporte sobre quem deve governar as ações de atletas que rodopiam, saltam e se catapultam espetacularmente pela paisagem urbana.

A disputa se agravou a tal ponto que um dos lados –a federação internacional de parkour– decidiu anunciar na segunda-feira (30) que prefere não receber o reconhecimento mais procurado por quase todos os demais esportes menos conhecidos: a inclusão nos Jogos Olímpicos.

O parkour começou a ganhar popularidade junto ao público mais amplo nas décadas de 1990 e 2000, porque a compatibilidade entre o vistoso esporte e o registro em vídeo fez dele presença frequente na televisão e no YouTube e, posteriormente, o ajudou a causar sensação na mídia social.

Os praticantes iniciais do parkour enfatizavam filosofias como a liberdade e a expressividade quase quanto o aspecto físico de seu esporte, que deriva do treinamento militar e combina elementos de ginástica, artes marciais e escalada. Competividade e rivalidades são rejeitados como traços contrários à natureza do parkour.

A despeito disso, uma federação de parkour foi fundada em 2007, não só para expandir o esporte, mas para criar novos eventos competitivos. Em 2017, a Federação Internacional de Ginástica (FIG), vendo na modalidade uma maneira de atrair uma audiência mais jovem, começou a organizar competições de parkour, afirmando que ele representava uma extensão natural das técnicas desenvolvidas por seus atletas.

Isso colocou as duas federações em disputa, já que elas passaram a organizar eventos concorrentes.

“Eles são uma federação de ginástica, e não de parkour”, disse Damien Puddle, presidente-executivo da Parkour Earth, a federação da modalidade. “O parkour é uma atividade distinta. A coisa toda é claramente uma farsa.”

A federação de ginástica não respondeu a um pedido de comentário, na terça-feira (1º).

Há dois eventos principais de parkour competitivo que podem um dia ser candidatos a inclusão nos Jogos Olímpicos. Na corrida de velocidade, atletas percorrem uma pista sem parar para manobras ou movimentos especiais; o critério de vitória é exclusivamente o tempo de percurso. No estilo livre, os atletas são julgados subjetivamente, pelo grau de dificuldade e qualidade de execução de suas manobras.

O Comitê Olímpico Internacional (COI) vai se reunir na segunda-feira (7) a fim de finalizar o programa para a Olimpíada de 2024, em Paris. Não há expectativa de que novos esportes sejam adicionados, além de algumas modalidades que já tinham sido escolhidas, como o break dancing. Isso dá à federação de ginástica a oportunidade de propor a inclusão de provas de parkour, excluindo a federação desse esporte.

“O parkour foi reconhecido com um esporte distinto, soberano e independente, por direito próprio, e assim não pode ser considerado como uma disciplina ou parte subsidiária da ginástica ou de qualquer outro esporte”, afirmou a Parkour Earth em carta ao COI, na terça-feira. “A interferência e apropriação indébita de nosso esporte pela FIG continua.”

A carta da federação ao comitê está eivada de expressões como “as necessárias verificações”, “petição formal” e “normas internacionais reconhecidas”; a terminologia jurídica parece contrastar com o espírito de aventura e improviso exibido pelos homens e mulheres que saltam de telhado em telhado.

A disputa entre as duas organizações remete ao conflito sobre o “stand-up paddleboarding” que surgiu em 2017. As federações de canoagem e de surfe afirmaram seu direito de comandar a modalidade no futuro. O surfe terminou vencendo.

A Olimpíada de Tóquio, agora marcada para 2021, vai incluir cinco novos esportes, ainda que suas presenças tenham sido aprovadas apenas para esse evento: beisebol e softball (que o COI considera como um só esporte), karatê, escalada esportiva, surfe e skate.

O COI deve aprovar a inclusão da escalada esportiva, surfe, skate e break dancing como modalidades olímpicas nos Jogos de Paris, em 2024.

Independentemente de que federação venha a vencer a batalha, há entusiastas do parkour espalhados pelo planeta que jamais consideraram que as olimpíadas fossem atraentes e que acreditam que a competitividade feroz dos Jogos Olímpicos conflite com o espírito de sua atividade. É uma disputa que também aflorou em outros esportes heterodoxos, como o snowboard e o skate.

Puddle, da federação de parkour, não garante que seu esporte venha a participar das olimpíadas, nem mesmo sob o comando da federação que ele dirige.

“É uma conversação que nossa comunidade ainda não teve”, ele disse. “A comunidade em geral, mesmo que decida participar da competição, não tem isso como foco. A maior parte das pessoas que pratica o esporte o faz por amar a experiência.”

Ryan Doyle, da Inglaterra, uma lenda do parkour, disse em 2010 que “às vezes as pessoas perguntam quem é o melhor no parkour, e o fazem por não compreender o que o parkour é. Perguntar quem é o melhor é algo que você faz em um esporte, e o parkour não é um esporte, mas sim uma forma de arte, uma disciplina. Seria como perguntar qual é a melhor canção do mundo”.

Tradução de Paulo Migliacci

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