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Mudanças pós-Brexit podem impactar chegada de brasileiros à Premier League

Jogadores contratados sob novas regras precisarão de um visto de trabalho baseado em pontos

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Londres

Chelsea e Norwich se enfrentaram pelo Campeonato Inglês no dia 6 de outubro de 2013. O brasileiro Willian passou a bola para o camaronês Samuel Eto’o, depois pegou a sobra e fez o primeiro gol dele na Premier League.

Outro brasileiro, Oscar, e o belga Eden Hazard também marcaram na vitória por 3 a 1. O treinador era o português José Mourinho.

“Fui acolhido muito bem pelo clube, pela torcida. Logo quando eu cheguei, a torcida do Chelsea fez uma música que eles cantavam nos jogos. Consegui me adaptar muito bem”, diz Willian, hoje no Arsenal, em entrevista à Folha.

Há sete anos na Inglaterra após chegar com visto de trabalho, ele está prestes a obter cidadania britânica.

A diversidade é fundamental para fazer da liga inglesa a mais competitiva e poderosa do planeta. Com dinheiro e prestígio, consegue atrair boa parte dos maiores talentos ao redor do mundo. Na temporada 2020/2021, são 455 jogadores de 58 nacionalidades.

A partir de 1º de janeiro, quando a saída definitiva do Reino Unido da União Europeia (Brexit) entra em vigor, a política de imigrações irá se misturar de vez com o esporte britânico.

Até hoje, jogadores do bloco europeu podem morar e trabalhar livremente na Inglaterra, incluindo brasileiros com dupla nacionalidade. É o caso do atacante brasileiro Gabriel Martinelli, com cidadania italiana e no Arsenal desde o ano passado.

Mas como o Reino Unido perderá o direito à livre circulação de pessoas dentro dos países integrantes da União Europeia —e o inverso também ocorrerá—, os futuros contratados precisarão de um visto de trabalho baseado em pontos.

Neste mês, a Federação de Futebol da Inglaterra e a Premier League anunciaram os critérios para a contratação de estrangeiros a partir de 2021.

Contam o nível do clube vendedor e do campeonato local, o número de partidas disputadas, atuação em competições continentais e pela seleção nacional.

Dessa forma, uma possível consequência do Brexit será abrir mais portas para atletas de fora da Europa. Para Marcos Motta, advogado especialista em direito esportivo internacional, há pontos positivos para o mercado brasileiro, mas é preciso cautela.

“Nossos clientes brasileiros se dividem em dois: os que tinham e os que não tinham passaporte europeu. Isso já era um primeiro nível de 'peneira'. Além disso, o mercado inglês já tinha outras formas de proteção do seu mercado interno, a questão de os jogadores terem pressupostos técnicos, como atuação pela seleção nacional", afirma.

Motta, que teve entre seus clientes o zagueiro Thiago Silva, do Chelsea, destaca a queda de uma dessas camadas de proteção, o passaporte europeu, a partir do próximo ano.

"Há uma igualdade, numa primeira análise, entre jogadores europeus e brasileiros no que tange à nacionalidade, porque todos estarão sob as mesmas regras. Mas continua sendo um mercado extremamente exigente e que agora vai poder traçar suas próprias regras”, diz.

“O mercado inglês sempre atraiu um jogador já estabelecido, que já jogou em outras ligas europeias e é transferido para a Inglaterra, então geralmente já tinha passagem por seleção brasileira e se enquadrava nas exigências anteriores. Temos que tomar muito cuidado com essa euforia do Brexit, porque ela pode ser falsa”, completa.

Com o Brexit, a Inglaterra perderá o direito de realizar transferências de atletas a partir dos 16 anos com os países da União Europeia. Clubes ingleses só poderão contratar estrangeiros a partir dos 18 anos.

Contratações como a do francês Paul Pogba, que foi pela primeira vez para o Manchester United em 2009, aos 16 anos, estarão proibidas.

Homem de vermelho pula para pegar bola amarela, em gramado
O meia-atacante brasileiro Willian, que chegou à Inglaterra em 2013 para defender o Chelsea, está desde agosto no Arsenal; na foto, atua em partida contra o Burnley, pela Premier League - Catherine Ivill - 13.dez.2020/Reuters

Para Douglas Pedron-Manasseh, chefe de futebol sul-americano da ICM Stellar Sports, agência que administra a carreira do galês Gareth Bale, a restrição pode deixar a Premier League em desvantagem com relação a grandes ligas da Europa.

“Acredito que essa é a regra mais definitiva em termos da diferença do talento que vai estar disponível para a liga inglesa. Jogadores com 16 anos que não tenham um grande valor de mercado são sempre bem vistos e são uma grande oportunidade para qualquer time do mundo. Então eles não estarem disponíveis é uma perda para a Premier League.”

As novas regras são o resultado de meses de discussões entre a FA, a Premier League e o governo britânico. A federação tenta proteger jovens ingleses que um dia possam se destacar na seleção nacional. Já a liga quer preservar seu status internacional.

Outro novo critério restringe a contratação de estrangeiros menores de 21 anos: no máximo três por clube na janela de transferências de janeiro e, dali em diante, seis por temporada.

“Deve haver uma proteção dos talentos nacionais da Inglaterra pelo fato de a liga ser inglesa. Mas um jogador de grande talento deveria ser competitivo o suficiente para competir com um atleta de qualquer outro lugar, em teoria”, diz Pedron-Manasseh. “É correto ter um nível de proteção, mas sem ser restritivo demais.”

Treinadores também vão precisar de visto de trabalho. Será preciso ter sido técnico durante três dos últimos cinco anos em uma das 33 ligas da lista. O Campeonato Brasileiro consta, mas não o norueguês.

Nesse novo formato, Ole Gunnar Solskjaer, ex-técnico do Molde, da primeira divisão da Noruega, não poderia ter sido contratado pelo Manchester United, clube que também defendeu como jogador.

O impacto das mudanças não aparecerá no curto prazo. A pandemia pode afetar a próxima janela de transferências, diminuindo contratações e valores gastos pelos clubes. Enquanto isso, segundo Motta, o mundo do futebol observa com atenção.

“O mercado está ansioso. Como é o mercado mais rico do futebol, qualquer mudança gera uma fricção. O mercado está cauteloso para entender como as novas regras vão funcionar.”

Willian, segundo brasileiro com mais jogos na história da Premier League (246, um a menos que Lucas Leiva), diz que ao menos por enquanto o Brexit não é assunto no vestiário do Arsenal.

“É o melhor campeonato do mundo, eles [a liga] não vão querer perder essa visibilidade. Se você perguntar para a maioria dos jogadores, eles vão falar que têm o desejo de jogar na Premier League”, afirma.

Jürgen Klopp, treinador do atual campeão Liverpool, já criticou publicamente diversas vezes o divórcio dos britânicos da União Europeia. "A história nos mostra que, se você está sozinho, você é mais fraco do que quando está em grupo”, disse o alemão em uma entrevista à BBC em 2019.

O Reino Unido preferiu seguir sozinho, e o Brexit despertou discussões sobre nacionalismo e a identidade do futebol inglês. A partir de 2021, caberá à Premier League mostrar que, apesar de a Inglaterra estar em uma ilha, pelo menos no futebol não quer se isolar do resto do mundo.

*

Os 25 brasileiros na Premier League

Arsenal 
David Luiz
Gabriel
Gabriel Martinelli
Willian

Aston Villa 
Wesley
Douglas Luiz

Brighton 
Bernardo

Chelsea 
Thiago Silva

Everton 
Allan
Bernard
Richarlison

Leeds
Raphinha

Liverpool 
Alisson
Fabinho
Roberto Firmino

Manchester City 
Ederson
Fernandinho
Gabriel Jesus

Manchester United 
Alex Telles
Fred

Newcastle
Joelinton

Tottenham 
Carlos Vinícius
Lucas Moura

West Bromwich 
Matheus Pereira

Wolverhampton 
Marçal

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