Desde que o Campeonato Brasileiro de 2020 começou, em agosto do ano passado, a trajetória do São Paulo de Fernando Diniz é discutida, basicamente, pelo estilo. Para o bem e para o mal.
A ideia de jogo que levou a equipe a liderar a competição com sete pontos de vantagem é também, na opinião de muitos, a escolha responsável pela perda da liderança no Nacional e a queda na Copa do Brasil. Insistir na saída de jogo curta, desde o fundo, virou motivo de desespero para o torcedor são-paulino, que cobra uma mudança significativa na forma de jogar.
Mas dentro de uma ideia ampla como ter a bola e sair jogando existem nuances, padrões e movimentações que vão colocar essa ideia em prática e fazer com que ela funcione e melhore.
Os últimos jogos do São Paulo escancararam um problema: o time de Diniz virou um samba de uma nota só. É preciso variar as notas, não necessariamente abandonar o samba.
Adversários estudaram o então líder do campeonato e se prepararam para anular suas qualidades.
Red Bull Bragantino e Internacional, que imprimiram vitórias contundentes sobre o clube do Morumbi nas últimas semanas, entenderam que o caminho era pressionar forte a saída de bola e superar o São Paulo no físico. Funcionou.
Em Bragança, Daniel Alves foi pressionado por trás e perdeu a bola na entrada da área. Roubada, passe entre os zagueiros, gol de Claudinho. Diante do Inter, foi Vitor Bueno quem recebeu, de frente e apertado por dois colorados, mas errou um passe na intermediária tricolor. Bola recuperada, Yuri Alberto recebeu entre os zagueiros, gol.
São erros individuais, mas também de padrão, que passaram a ser questionados. Dentro da ideia de sair jogando desde o fundo, por exemplo, ter Daniel Alves de costas para os marcadores, pressionado, é a melhor alternativa para potencializar o jogo do camisa 10?
As melhores versões de Daniel Alves, seja como lateral, ala ou lateral construtor na seleção, o tiveram recebendo a bola com o corpo posicionado para olhar o ataque de frente, podendo progredir com a bola no pé, não limitando o seu campo de ação.
A solução para ter o melhor Daniel também não se mostrou ser o que Fernando Diniz tentou em Curitiba, contra o Athletico, escalando-o como um segundo atacante para se aproximar da referência.
O jogo com os paranaenses, inclusive, obrigou o São Paulo a enfrentar problema semelhante ao que viveu contra o Grêmio, no jogo de volta da semifinal da Copa do Brasil.
Ao contrário de Bragantino e Internacional, não houve pressão forte na saída. Com os times mais retraídos e esperando na linha do meio de campo, os adversários deram a bola aos são-paulinos, mas fecharam as linhas de passe, forçando o time de Diniz a manter uma posse estéril.
Na Arena da Baixada, o São Paulo por vezes teve Juanfran, Arboleda, Tchê Tchê e Gabriel Sara, todos do lado direito da defesa, trocando passes entre si. Passes verticais poderiam quebrar essas linhas e fazer com que a equipe progredisse, ganhasse campo para jogar. Não aconteceu.
Terceiro artilheiro e segundo melhor assistente são-paulino no Brasileiro, Sara passou praticamente todo o primeiro tempo mais perto de seu próprio gol do que da meta defendida pelo goleiro Santos.
Sintomático que o São Paulo tenha feito duas de suas melhores apresentações na temporada contra fortes concorrentes ao título, como Flamengo e Atlético-MG. Times que, assim como o tricolor, querem a bola e são propositivos, mas que acabaram deixando espaços para o jogo do rival fluir. Os adversários recentes não deixaram, pois se prepararam para isso.
Não se trata de dizer que a equipe de Fernando Diniz virou refém do próprio sucesso. Grandes times sabem se adaptar aos adversários e isso é responsabilidade, claro, do trabalho da comissão técnica, que tem a missão de oferecer aos seus jogadores as ferramentas para sair da imprevisibilidade e ampliar o leque.
A sequência ruim no Campeonato Brasileiro e a consequente perda da liderança precisam levar o São Paulo a uma reflexão. Ela não passa pela mudança radical do estilo, o mesmo que levou o clube até aqui, em condições de ser campeão.
Apostar no chutão, na segunda bola, recuperada depois de lançar o esférico a esmo para frente, seria entregar o jogo ao acaso, um atestado da pobreza de ideias. O desafio do São Paulo é justamente trabalhar a sua ideia. Refinar o samba, para que ele não tenha uma nota só.
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