Descrição de chapéu Copa Libertadores 2020

Santista de arquibancada, Lucas Braga realiza sonho dos tempos de várzea

Atacante de 24 anos demorou a ter sua chance, mas agora está na final da Libertadores

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Santos

Lucas Braga, 24, conta ter herdado do avô João e da mãe, Nilza, um amor quase umbilical pelo Santos. Quando criança, eram recorrentes os sonhos em que ele estava na Vila Belmiro jogando pelo clube.

O atacante, hoje um dos responsáveis pela ascensão surpreendente do time do técnico Cuca, frequentava até 2017 os jogos do time no estádio, principalmente no tobogã do Pacaembu.

O maior orgulho até ali era ter entrado de mãos dadas com o goleiro Fábio Costa, em um jogo em 2004, quando tinha 11 anos. O sonho de criança, porém, ainda estava bem distante da realidade.

Lucas Braga, do Santos, salta e soca o ar para comemorar seu gol contra o Boca Juniors pela semifinal da Libertadores
Lucas Braga comemora seu gol contra o Boca Juniors pela semifinal da Libertadores - Andre Penner - 13.jan.21/Reuters

Criado na zona oeste de São Paulo, no bairro Jardim São Jorge, Braga acumulou reprovações por todos os clubes em que fez avaliações –Portuguesa, São Paulo e Corinthians foram alguns deles. Acabou lapidado no Ajax, tradicional clube da várzea paulistana, e em times de projetos sociais.

“Não desistir do futebol foi uma coisa de fé mesmo. Se pegar a porcentagem de atletas que dão certo, ela é mínima. Essa vida [no esporte] não é um mar de rosas. Tentei todos os clubes que se possa imaginar, já tinha pensado em parar, mas a família sempre me pedia para seguir tentando”, conta à Folha.

Lucas Braga saltou da várzea direto para o futebol profissional, sem escala em categorias de base. Começou no JMalucelli (PR), em 2017, onde fez apenas um jogo pelo Paranaense. Dias depois da estreia, o clube anunciou que fecharia as portas devido a imbróglios judiciais.

“Fiquei quatro meses desempregado, quando o antigo treinador do sub-19 do Malucelli, o Milton do Ó, me disse que assumiria o Batel [time da cidade de Guarapuava]. Ele falou: quer vir? É só pela vitrine, viu, aqui não vai receber um centavo”, lembra.

Apoiado pela esposa, Jennifer, o atacante pegou os R$ 1.500 que sobraram da rescisão do contrato para viajar e tentar viver o sonho novamente, agora na terceira divisão paranaense. O rumo mudou quando conheceu em um jogo com apenas 25 torcedores, contra o Campo Mourão (PR), o seu atual empresário, Miguel Calluf.

“Fazia um bom campeonato lá e ele se ofereceu para começar a divulgar o meu material. Passaram uns dias e o Luverdense (MT) viu. Chamaram para fazer testes”, relata.

O destino, enfim, parecia sorrir para Lucas Braga no início de 2018. Pela Copa do Brasil, o sorteio definiu que o seu novo time enfrentaria o Santos, pelas oitavas de final. O sonho de jogar na Vila, enfim, aconteceria. Destaque da equipe de Mato Grosso, ele despertou a atenção do clube paulista e acabou contratado para a equipe sub-23.

Assim que chegou, foi emprestado ao Cuiabá, em 2019, e mais tarde à Inter de Limeira, após receber uma ligação de Elano, então técnico da equipe do interior paulista.

“Tenho dificuldades com a parte técnica. Esse pulo que dei [da várzea para o profissional] me atrapalha até hoje. O Elano mudou tudo isso em mim, me orientava a trabalhar antes e depois dos treinos, me ensinou a entender o jogo, como me posicionar melhor”, conta.

A principal alteração de Elano foi conduzir o jogador, então acostumado a atuar durante toda a carreira aberto pela esquerda, para o lado oposto. O ídolo do Santos convenceu Braga contando como inspiração sua própria trajetória, dizendo que conseguiu, por causa da eficiência tática, ser titular na seleção brasileira em um meio-campo ao lado de Kaká e Ronaldinho Gaúcho.

“Ele me fez entender a importância de cumprir um papel tático. Hoje sinto facilidade em me posicionar. Quando cheguei ao Santos tinha muita dificuldade mesmo, nos times menores há outras preocupações, tinha jogado muito pouco na carreira”, constata.

De volta ao Santos em 2020, mas fora dos planos do técnico português Jesualdo Ferreira, ele viu tudo mudar com a chegada de Cuca. O novo treinador havia idealizado a retomada do Santos com a escalação de Copete, mas a inscrição do colombiano foi impossibilitada devido a uma punição sofrida pelo clube na Fifa, pelo não cumprimento no pagamento de transações.

Abriu-se uma oportunidade. “Lucas Braga é muito participativo, tático e regular. É um titular entre 13 ou 14 que tenho”, disse Cuca em entrevista coletiva neste mês de janeiro.

O jogador foi muito além disso. Antes de o comandante poupar todos os titulares, ele jogou 14 partidas consecutivas iniciando entre os 11, 7 delas sem ser substituído. Tem dois gols (marcou o terceiro no 3 a 0 diante do Boca Juniors pela semifinal) e duas assistências diretas para gol na Libertadores.

“Acho que a nossa relação foi de confiança, pelo fato de pensar primeiro no coletivo. Ele me pede muita participação na parte tática, e cumpro isso”, afirma.

Lucas Braga vive, enfim, tudo aquilo que tanto esperou. Diz ter sofrido para dormir nestes dias que antecedem o grande jogo e não faz projeções maiores do que a final marcada para sábado (30), às 17h, no Maracanã.

Dessa vez, ele estará em campo, mas na arquibancada a maior prova de amor pelo Santos foi dada em 10 de fevereiro de 2013, em um jogo contra o Paulista de Jundiaí, pelo Estadual. O torcedor tomou chuva de granizo antes e durante todo jogo. No fim, ainda viu o Santos sair derrotado por 3 a 1, mas não parava de cantar um só minuto.

Dois anos antes, na final da Libertadores contra o Peñarol, não conseguiu ingressos entre os 31.500 torcedores presentes no Pacaembu. Viu de casa o Santos de Neymar ser campeão.

“Por incrível que pareça, sonho com poucas coisas agora. Queria chegar ao Santos e, quem sabe, conquistar um título importante. Meus sonhos iam até aí. Quando orava dizia para Deus que já havia realizado todos os meus sonhos e que o que viesse pela frente só agradeceria."

Torcedor dentro de campo, Lucas Braga tentará representar da melhor forma seus pares santistas que não poderão estar na arquibancada do Maracanã por causa da pandemia da Covid-19.

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