Superliga de clubes europeus vai à Justiça para garantir sua existência

Grupo diz à Fifa e à Uefa que se antecipou para evitar ter suas intenções bloqueadas

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Tariq Panja
Londres | The New York Times

O grupo por trás de uma nova e multibilionária liga de futebol que organizaria competições entre clubes europeus de elite alertou os dirigentes do esporte de que já havia tomado medidas judiciais a fim de rebater os esforços para bloquear um projeto que atraiu condenação generalizada.

Ao anunciarem publicamente no domingo (18) os seus planos para a Superliga europeia, os proponentes da ideia escreveram ao presidente da Fifa, a organização que comanda o futebol mundial, e ao presidente da Uefa, a confederação de futebol da Europa, para afirmar que gostariam de trabalhar com suas organizações, mas que também tomaram providências para impedir que qualquer coisa bloqueie o avanço de seu projeto.

Até agora, 12 clubes, da Inglaterra, Espanha e Itália —entre os quais Manchester United, Liverpool, Real Madrid e Juventus— aderiram à nova liga.

Os rumores sobre a criação de uma competição separada, que espera atrair pelo menos mais três clubes como membros fundadores, levaram a Fifa a ceder à pressão da Uefa em janeiro e divulgar uma declaração na qual ameaçava severas repercussões para os jogadores e clubes envolvidos em qualquer torneio não autorizado.

A Uefa, as principais ligas de futebol da Europa e as federações nacionais dos três países que têm times envolvidos na nova competição divulgaram um comunicado no domingo condenando o projeto.

A Fifa advertiu em janeiro que jogadores que tomem parte na competição separatista corriam o risco de ser excluídos de eventos como a Copa do Mundo, e que os clubes participantes perderiam acesso a torneios nacionais como a imensamente popular Premier League, na Inglaterra.

Diante dessa ameaça, a companhia criada para controlar a nova liga disse a Gianni Infantino, presidente da Fifa, e a Aleksander Ceferin, presidente da Uefa, em uma carta enviada no domingo, que petições já haviam sido apresentadas a múltiplos tribunais para bloquear qualquer ação que ameace o projeto, que conta com US$ 4 bilhões em financiamento já acertado com o JP Morgan.

A companhia afirmou ter “tomado as medidas apropriadas para contestar a legalidade das restrições à formação da competição, junto aos tribunais relevantes e às autoridades europeias, diante da necessidade de salvaguardar seu futuro”, afirma a carta, da qual o The New York Times obteve uma cópia.

A liga que os clubes concordaram em formar —uma aliança de grandes clubes de futebol mais próxima em termos conceituais de ligas fechadas como a NFL e a NBA do que do modelo atual do futebol– traria a mais significativa reestruturação entre os clubes de elite do futebol europeu desde a década de 1950, e poderia prenunciar a maior transferência de riqueza a um pequeno conjunto de times na história moderna do esporte.

Mural com desenhos dos jogadores ao lado de estádio
Mural com desenhos dos jogadores Lukaku, da Inter de Milão, e Ibrahimovic, do Milan, em frente ao San Siro; rivais estão juntos na criação da Superliga - Daniele Mascolo/Reuters

Ao discutir as medidas judiciais, a carta de seis páginas também convidava os líderes do futebol a realizar negociações “urgentes” a fim de encontrar um caminho comum para o avanço de um projeto que os clubes dizem beneficiará o futebol como um todo, e não apenas o pequeno grupo de clubes que desfrutaria de riquezas sem paralelo caso o novo torneio vá adiante.

Segundo o plano, os 15 membros fundadores da Superliga receberiam uma cota inicial de 3,5 bilhões de euros, ou cerca de US$ 4,2 bilhões, o equivalente a cerca de US$ 400 milhões por clube.

A quantia é mais de quatro vezes superior ao valor que o ganhador do maior torneio europeu de futebol, a Champions League, faturou em 2020. Na carta, os fundadores da Superliga disseram que não desejam substituir a Champions League, mas sim criar um torneio paralelo a ela.

O dano ao prestígio e ao valor da Champions League, no entanto, seria imediato e duradouro, transformando aquela que há décadas é a competição interclubes de elite do futebol mundial em um evento secundário e que dificilmente seria capaz de manter seu atual apelo comercial.

A Uefa ratificou as maiores mudanças no formato do torneio desde 1992 em uma reunião do seu conselho executivo nesta segunda-feira. Elas passarão a valer em 2024.

Nasser al-Khelaifi, presidente do Paris Saint-Germain, estava ente os dirigentes que votaram a favor das mudanças. Ele até agora resistiu aos esforços da nova liga para atrair o PSG, um clube que conta com alguns dos melhores jogadores do planeta.

Os times da Alemanha, entre os quais o Bayern de Munique, campeão da Champions League na temporada passada, também se recusaram a aderir à nova empreitada.

As mudanças substanciais na Champions League agora podem se tornar irrelevantes, caso os clubes que optaram pela nova competição consigam o que querem e entrem em campo para o novo campeonato que esperam possa ser iniciado já na segunda metade deste ano.

Na carta, a organização afirmava que a urgência de sua decisão derivava dos imensos prejuízos acumulados como resultado do coronavírus. Jogos disputados em estádios imensos e vazios se tornaram a norma, e restrições a eventos públicos significam que os clubes estão perdendo centenas de milhões de dólares em receitas de bilheteria, enquanto os parceiros televisivos do futebol solicitaram a restituição pelas ligas e federações futebolísticas de vastas quantias pagas por direitos de transmissão.

A Uefa e outras organizações se reuniram no final de semana para discutir suas opções judiciais e iniciaram negociações com governos de toda a Europa e com a União Europeia. Isso levou a declarações imediatas de condenação por parte de figuras como o primeiro-ministro britânico Boris Johnson e o presidente Emmanuel Macron, da França.

Diante da possibilidade de verem seus torneios desvalorizados no futuro e da perspectiva de que os atuais parceiros televisivos e comerciais exijam uma redução nos valores que pagam, a Uefa está considerando processar os 12 clubes que formaram a organização separada, e alguns de seus dirigentes, em busca de indenização.

Os maiores clubes europeus se sentem insatisfeitos há muito tempo com a divisão de receita dos torneios nos quais são a maior atração, e conversas sobre uma nova liga já tinham começado bem antes da pandemia. Documentos vazados em 2019 mostram que Florentino Pérez, o presidente do Real Madrid, um dos arquitetos do atual plano, já havia buscado desenvolver uma versão anterior de um torneio envolvendo os maiores clubes.

O papel da Fifa na questão também é curioso. Infantino, seu presidente, vem falando nos últimos anos de criar novos torneios para aumentar o interesse pelo futebol no planeta. Como parte desse esforço, ele apoiou a criação da Superliga da África, com 20 clubes.

A Fifa divulgou um comunicado na noite de domingo reiterando que não apoiaria uma competição fechada entre os clubes separatistas. Os fundadores da Superliga europeia insistem, porém, em que seu torneio não seria completamente fechado e que haveria acesso a cada temporada para cinco times além dos 15 membros fundadores que eles antecipam ter.

“A competição pretende incluir alguns dos maiores clubes da Europa, com rotas de acesso aberto para qualificação baseada em mérito esportivo”, a carta afirma.

Tradução de Paulo Migliacci

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