Descrição de chapéu Tóquio 2020

Atletas do caratê buscam vaga na primeira e talvez única Olimpíada da modalidade

Esporte estreia em Tóquio-2020, mas não está na programação para Paris-2024

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São Paulo

Na sua primeira aula de caratê, aos 16 anos, Valéria Kumizaki ouviu do professor uma pergunta que jamais esqueceu.

"Ele me questionou se eu sabia que com aquele esporte eu poderia ir para o Pan-Americano ou até, um dia, para a Olimpíada. Eu não tinha ideia", afirma ela, hoje com 36 anos.

Douglas Brose durante luta do Pan-Americano disputado em Lima, em 2019
Douglas Brose durante luta do Pan-Americano disputado em Lima, em 2019 - Abelardo Mendes Jr-11.ago.19/ rededoesporte.gov.br

Quando isso aconteceu, Douglas Brose, 35, já estava na seleção brasileira e sofria para financiar suas viagens para competir. "Todos os dias acordo pensando na Olimpíada", confessa.

Pela primeira vez, em Tóquio, o caratê fará parte dos Jogos. E pode ser a última. A modalidade não está no programa para Paris-2024 e não se sabe se voltará para Los Angeles-2028. Isso deixa os atletas brasileiros com o sentimento de que esta pode ser a única oportunidade de suas vidas.

"Meu pensamento é de agora ou nunca. Mas ao mesmo tempo eu tenho uma chance que as gerações anteriores não tiveram. Muita gente do caratê queria ir para uma Olimpíada e não pôde", analisa Valéria, que está na Sérvia em período de treinamentos antes do pré-olímpico, que será realizado a partir de 11 de junho.

"Eu concordo. É agora ou nunca. Tenho doado a minha vida para tentar estar lá. Porque sabemos ser a única chance que temos, de fazer história para o nosso esporte, de chegar lá e buscar, quem sabe, uma medalha", diz Brose, que passou duas semanas em Paris e retornou ao Brasil na semana passada.

A dificuldade não é apenas essa. Não se trata somente da barreira psicológica de entrar em uma competição com a consciência de que, se falhar, pode nunca mais ter chance de ir ao evento máximo do esporte.

Para ajustar a modalidade ao programa olímpico e por causa da pandemia de Covid-19, que limitou o número de competições, houve uma readequação e isso restringiu o número de vagas. Diferentes categorias foram unificadas. Como as de até 60 kg e até 67 kg, por exemplo. As quatro vagas que seriam destinadas a elas se tornaram duas. Isso aconteceu também com caratecas de outros pesos.

A mudança mexeu com a situação de Vinicius Figueira. Em março do ano passado, o COB (Comitê Olímpico do Brasil), por causa de informações passadas pela WKF (Federação Internacional de Caratê), confirmou a vaga dele na Olimpíada depois do cancelamento de duas etapas do circuito mundial, na Espanha e em Marrocos. Mas a entidade depois resolveu que os torneios seriam disputados em 2021, o que tirou a classificação do brasileiro pelo ranking.

"Foi um método que eles criaram para ter caratê na Olimpíada. Mas a gente fica no meio desse tiroteio", afirma Brose.

Valéria Kumizaki, carateca brasileira que tenta vaga para a Olimpíada de Tóquio
Valéria Kumizaki, carateca brasileira que tenta vaga para a Olimpíada de Tóquio - Divulgação

De acordo com os atletas, há quatro possibilidades de obter um lugar nos Jogos. Duas delas são por ranking, o europeu e o das Américas. Essas dependem de pontuações em torneios. Nenhum nome brasileiro tem resultados para isso. A última chance para Brose e Figueira será o pré-olímpico. Como medalhista de ouro no Pan-Americano de 2019, em Lima, Valéria pode também receber uma carta-convite para a Olimpíada.

A complexidade do sistema de classificação, as mudanças de categorias e a incerteza causam nervosismo.

"Eu sinto bastante ansiedade, mas sem ficar apavorada. Eu trabalhei a minha carreira toda por isso. Quero muito que aconteça porque é algo [o caratê nos Jogos] que a gente nem sabia se ocorreria. Não deixo a ansiedade tomar conta, mas ela existe", diz Valéria.

Há também a questão do apoio recebido pelos atletas com chances reais de qualificação. Os caratecas constataram a diferença. Valéria, quando começou a competir, contou com a ajuda dos pais, mas também confessa ter feito uma "dívida enorme" para as viagens. Ela afirma estar tudo pago hoje em dia.

Brose vendia rifas, bolos, fazia vaquinhas e tinha ajuda familiar no que era possível. Ele tem viva na memória a lembrança de competições internacionais para as quais se classificou mas não pôde viajar por falta de dinheiro.

Esportistas olímpicos têm maiores chances de obter verbas públicas ou privadas. Podem receber diferentes bolsas do governo federal, que variam de R$ 5 mil a R$ 15 mil mensais. Valéria e Brose são patrocinados pela Ajinomoto.

Se a modalidade não está no programa dos Jogos, tudo muda. A visibilidade é menor.

"Eu não fico com gosto amargo [de ser a única chance de ir para Olimpíada] . Fico com gosto de que chegou a nossa vez. Muda muito. Eu tive a chance de vivenciar esse ciclo olímpico. O suporte e o apoio recebido são outros. A gente tinha muito pouco incentivo. Há um pouco de sofrimento também porque sabemos que depois, se não tiver mais [presença nos Jogos], vai perder um pouco disso", constata Douglas Brose.

A intenção dos organizadores de Paris-2024 é dar um foco maior à juventude e a eventos urbanos. A maior novidade será o breakdance, na esteira do sucesso da modalidade nos Jogos Olímpicos da Juventude em Buenos Aires, em 2018.

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