Petrovic abre caminho para volta de Varejão à seleção no Pré-Olímpico de basquete

Técnico inclui veterano em lista inicial da equipe após retorno do jogador à NBA

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São Paulo

três anos e meio no comando da seleção brasileira masculina de basquete, o croata Aleksandar Petrovic, 62, olha tanto para o futuro a médio e longo prazo da equipe quanto para uma missão imediata: classificar o Brasil aos Jogos Olímpicos de Tóquio.

A definição das últimas quatro vagas no Japão será em quatro torneios Pré-Olímpicos. Em cada um deles, apenas o vencedor avançará.

O time verde-amarelo jogará em Split, na Croácia. Em 29 de junho, estreará contra a Tunísia, e no dia seguinte pegará os donos da casa —possivelmente com público parcialmente liberado na arena.

Como os dois primeiros colocados do grupo avançam às semifinais, Petrovic quer foco total nos africanos para só se preocupar de verdade com seus compatriotas, considerados favoritos, em uma eventual decisão. A outra chave tem Alemanha, Rússia e México.

Até o início de junho, o treinador fará uma convocação inicial com 16 nomes de uma lista de 24 previamente entregue à Federação Internacional (Fiba). O grupo se reunirá na Europa, onde terá duas semanas de treinos e fará amistosos. Após novos cortes, 12 atletas formarão o elenco final.

Petrovic não crava, mas indica em entrevista à Folha que Anderson Varejão, 38, possui boas chances de integrar esse conjunto após ter assinado contrato com o Cleveland Cavaliers e participado dos últimos jogos da temporada regular da NBA, encerrada no último fim de semana.

O treinador conta ainda com outros veteranos, como Alex Garcia, 41, Marcelinho Huertas, 37, e Marquinhos, 36. Todos estavam no Mundial de 2019, quando o Brasil surpreendeu ao bater a Grécia, mas terminou na 13ª posição. Leandrinho Barbosa, 38, presente na ocasião, deixou as quadras no ano passado.

Recém-chegado à NBA, Didi Louzada, 21, do New Orleans Pelicans, representa a renovação na espinha dorsal do grupo. Raulzinho, 28, em ação no play-in da NBA pelo Washington Wizards, além de Vítor Benite, 31, e Bruno Caboclo, 25, ambos no basquete europeu, também são peças de destaque.

Após o retorno da Anderson Varejão à NBA, o senhor pretende convocá-lo para o Pré-Olímpico? Nos últimos seis meses, pedi a ele que assinasse um contrato com algum clube para que tivesse ritmo de jogo. Ele estava treinando havia dois anos, mas uma coisa é só treinar e outra é jogar. Por razões específicas, como o coronavírus e ele ter uma filha de um ano, não poderia sair e jogar em qualquer lugar do mundo. Mas, para surpresa, ele fechou com o Cleveland, e recebi como uma mensagem por parte dele de que quer estar em Split. Agora posso falar que ele está na lista de 24 e por isso pode ser escolhido para o Pré-Olímpico. Ele e outros veteranos, como Marcelinho, Alex, Marquinhos, querem uma última oportunidade de essa grande geração chegar outra vez aos Jogos Olímpicos. Vamos avaliar os últimos jogos no Cleveland, como ele se sente, como os demais jogadores estão participando e no fim de maio ou começo de junho vamos tomar decisões.

O Anderson jogou em média sete minutos nas cinco partidas que fez pelo Cleveland. Já é suficiente para garantir que ele estará com ritmo de jogo? Não podemos misturar Anderson com outros jogadores que podem entrar nessa dinâmica [de avaliação]. Anderson é um jogador muito específico. Não tem nenhum quilo a mais e estava treinando bem. É o único jogador do Brasil que pode jogar de costas no poste baixo [área do garrafão mais próxima à cesta] de uma maneira impressionante. Para formar um jogo bem compacto é necessário ter esse tipo de jogador. Eu tenho um sentimento de que, caso ele chegue bem, sem nenhum tipo de lesão, pode ganhar ritmo em duas semanas. Vamos jogar dois amistosos contra a Polônia, dias 22 e 23 de junho, e penso que será suficiente. Podemos preparar bem o jogo contra a Tunísia e depois para as semifinais. Isso significa que poderá ser um pouco mais fácil para um jogador veterano como é Anderson, caso ele seja chamado. Todavia, não está tomada a decisão.

Varejão disputa a bola com atleta adversário
Anderson Varejão em ação pelo Cleveland Cavaliers na NBA, contra o Boston Celtics - Emilee Chinn - 12.mai.21/AFP

Quais nomes que, se não houver problemas de lesão ou doença, já estão garantidos entre os 12? Ou pelo menos entre os 16? Dois armadores que agora estão nos melhores dias de suas carreiras, como Raulzinho e Marcelinho. Temos outros jogadores nessa posição, mas posso levar só três, não oito. Agora o problema maior é escolher o terceiro armador, porque há Georginho, Yago, Scott Machado, Rafa Luz, Alexey.

Com Vítor [Benite] acontece uma coisa muito boa. É impressionante como melhorou muito em vários aspectos de jogo e defensivamente. Não posso dizer que Vítor não vai estar dentro. Também Alex, Marquinhos, não vou cortá-los.

Para mim foi uma vitória enorme fazer um trabalho muito diplomático com Bruno Caboclo. Você lembra a situação em 2017, quando ele saiu da seleção [após se recusar a entrar em um jogo]. Bruno voltou ao Mundial [de 2019] para defender o Brasil e agora estou muito contente como ele está jogando na França. Eu lhe pedi: "por favor, deixe a NBA [onde não vinha sendo utilizado] e recomece a jogar". Está jogando muito melhor do que há quase dois anos, quando o vi pela primeira vez. Está com muito mais espaço, lê muito melhor o jogo e será importante para o Brasil nos próximos dez anos.

Como se deu o processo de estreitar as relações e ganhar a confiança do grupo ao longo destes mais de três anos de trabalho na seleção? Você não pode chegar para jogadores como Marcelinho, Marquinhos, Alex, Leandro, Anderson e vender fumaça. Porque esse tipo de jogador o desnuda e você já está totalmente fora. São 30 anos [como técnico de basquete], então há que saber as regras. Mas também quero ser amigo de meus jogadores, por isso estou presente na vida de cada um deles. Em alguns momentos mando mensagem pelas minhas redes sociais, como “vamos defender até a morte”. Também uma foto minha na Croácia com a camiseta do Brasil. Isso significa muito para criar uma química. Mas também estou com cada um deles em mensagens a cada um ou dois dias.

Muita gente pergunta o que aconteceu com Léo Meindl há dois anos. Em quatro janelas, ele fez oito jogos de quinteto [como titular]. Mas em uma janela se apresentou com 5 kg a mais, não estava concentrado. Falei com ele: "Léo, assim não vai". E não foi convocado [para o Mundial]. Mas quando ele saiu do Brasil para a Espanha mudou sua forma de pensar o basquete. No último ano, estou em contato com o Léo, comentando tudo, e agora posso confirmar que ele vai estar entre os 16, porque merece a oportunidade. Gosto quando o jogador recebe a mensagem, aceita e melhora. Não tenho uma regra específica. Alguns jogadores precisam de mais carinho, outros não.

Seu lema para a seleção no Pré-Olímpico é “defender até sangrar”. O senhor gosta de frases fortes, como quando afirmou que saberia parar Giannis Antetokounmpo no Mundial. Estava certo, mas depois daquela vitória heroica o Brasil perdeu um jogo teoricamente mais fácil contra a República Tcheca. Como manter o equilíbrio entre empolgação e concentração? A única coisa importante no grupo é ganhar da Tunísia. Não quero mostrar todas as cartas contra a Croácia, porque podemos hipoteticamente jogar contra eles de novo. Tenho na cabeça, junto com meus assistentes, todos os cenários contra a Tunísia. Há um quinteto muito forte, mas o sexto e o sétimo jogadores estão bem abaixo do quinteto inicial. Depois vemos contra quem jogar a semifinal. Agora sabemos todos os cenários possíveis.

No Mundial, sabíamos seis meses antes que jogaríamos contra Nova Zelândia, Grécia e Montenegro. Ganhamos as três. No outro grupo todo mundo pensava que a Turquia passaria junto com os EUA. No último momento saiu a Turquia e veio a República Tcheca. Não se preparar bem para a República Tcheca foi o único dia em 44 dessa concentração em que falhamos.

Anderson Varejão marca Giannis Antetokounmpo na vitória brasileira sobre a Grécia em 2019
Anderson Varejão marca Giannis Antetokounmpo na vitória brasileira sobre a Grécia em 2019 - Han Yuqing - 3.set.19/Xinhua

Agora não podemos cometer esse tipo de erro. Quarenta minutos é muito pouco tempo, num jogo em que todo mundo joga a vida e a morte, para ficar só no ataque. Eu posso não meter nenhuma bola de três, mas defendendo até sangar sempre podemos ganhar o jogo. Com Raulzinho, Marcelinho, Vítor, não me preocupo tanto em produzir os pontos. Nós vamos produzir muitos pontos. Meu trabalho nestas duas semanas é investir na defesa. Eu estou preparado.

Para ir à Olimpíada poderá ser necessário ganhar da Croácia na casa deles, que também é sua casa. Está preparado para essa experiência também? Para mim não é novo. Quando fui treinador da Bósnia e Herzegovina enfrentei a Croácia, mas num nível não tão importante quanto agora. Somos profissionais, e esse é meu quarto ano no Brasil. Mas também não me sinto só como um profissional. Vou defender as cores do Brasil com uma paixão muito forte.

Será mais difícil se houver presença de torcida? É bom [ter torcida ao seu lado] quando tudo sai bem, mas se não entra no jogo e encontra dificuldades, essa torcida tem muito peso em cima. Eu prefiro porque, como um esportista, é mais natural jogar perante a torcida. Para mim será mais complicado por ser croata e ter sido treinador da seleção. O único que precisa se preparar mais sou eu.

O senhor fala sobre desenvolver o basquete brasileiro para os próximos 10, 15 anos. Gostaria de permanecer no cargo por mais quanto tempo? A princípio eu teria um contrato até os Jogos Olímpicos de 2020. Quando acabou o Mundial, na mesma noite do jogo contra os EUA, o presidente da CBB [confederação brasileira] e o diretor esportivo me disseram: "coach, nós queremos que você continue". Não firmamos nada e aqui estamos em mútuo acordo. Posso sair depois do Pré-Olímpico, dos Jogos, ou em três ou quatro anos. Quando a CBB pensar que é preciso trocar ou acabou o trabalho, nenhum tipo de problema. Eu estou aqui porque acredito que possamos fazer muitas coisas boas. Ninguém no Brasil poderá ignorar Yago, Gui Santos, Didi Louzada, todo mundo que chegou [à seleção na sua gestão]. Ninguém pode falar que o futuro do Brasil não é muito lindo, e isso para mim é como uma medalha de ouro.

Didi e LeBron disputam a bola no meio da quadra
Didi Louzada chegou à NBA no fim da temporada e já encarou LeBron James - Stephen Lew - 16.mai.21/USA TODAY Sports

O senhor se sentiu bem recebido pelos treinadores brasileiros de ponta, além daqueles que fazem parte da sua comissão técnica? Quando cheguei, disse que não conhecia ninguém no Brasil e pedi que a CBB me desse os assistentes. Primeiro foi [Bruno] Savignani e [César] Guidetti, depois chegou Léo Figueiró. Estou com eles diariamente, falando de muitas coisas. E o preparador atlético Bruno Nicolaci, um monstro de preparação, um dos melhores que já vi. Estou muito contente com a química entre nós. Com os demais entro em contato quando estou no Brasil e visitando os jogos. Esses três treinadores são a janela em que vejo os treinadores brasileiros. Falo com os três e significa que falo com os demais. A pandemia prejudicou, porque não posso estar mais tempo no Brasil. Aqui na Croácia vejo todos os jogos e estou consciente de todos, mas me falta mais contato físico com treinadores brasileiros.

O senhor teve uma experiência incômoda no início do ano, de viajar da Croácia para jogos na Colômbia e os jogadores brasileiros não poderem entrar no país por causa da pandemia. Como o senhor tem acompanhado a distância essa situação dramática do país? Sempre prefiro viajar um dia antes dos atletas, e por isso fui prejudicado. Depois de 30 horas de viagem, chego a Cáli e no aeroporto escuto a notícia que brasileiros não podem entrar em Colômbia. Mas penso que situação vai melhorar agora com as vacinas.

Além das pessoas a que sou conectado profissionalmente, tenho amigos onde moro, em Campinas. Quando estou em contato com eles, a primeira coisa que pergunto é como está a situação. Quatro mil mortos pela pandemia diariamente foi um golpe muito duro.

Aleksandar Petrovic, 62

Nascido em Sibenik, o croata jogou basquete até o início dos anos 1990, conquistando a medalha olímpica de bronze em Los Angeles-1984 e nos Mundiais de 1982 e 1986 pela Iugoslávia. Como treinador, além de clubes europeus, teve três passagens pela seleção da Croácia (inclusive na Rio-2016) e uma pela da Bósnia e Herzegovina. Comanda o Brasil desde 2017. É irmão de Drazen Petrovic, lendário jogador de basquete croata que chegou à NBA e morreu em acidente de carro em 1993.

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