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Novak Djokovic pode fazer história neste ano; não revire os olhos

Momento do tenista sérvio, favorito em Wimbledon, cria um problema para seus detratores

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Kurt Streeter
The New York Times

À primeira vista, o torneio de Wimbledon deste ano, de volta depois que a pandemia impediu a realização do evento de tênis mais famoso do planeta em 2020, parece diminuído.

Rafael Nadal está fora. Depois de uma derrota dolorosa diante de Novak Djokovic nas semifinais de Roland Garros, o espanhol decidiu não jogar em Wimbledon, afirmando que precisa se recuperar.

Naomi Osaka está fora. Ela anunciou na semana passada que continuaria seu hiato, para cuidar de sua saúde mental.

Roger Federer voltará a pisar na quadra central, mas ele tem quase 40 anos e continua batalhando para superar os efeitos de uma lesão no joelho. Com a passagem do tempo, a probabilidade de que Serena Williams consiga uma nova campanha vitoriosa se reduz.

Mas Djokovic estará lá, depois do título em Roland Garros, e de olho em um recorde. Uma vitória em Wimbledon, que começa em de 21 de junho, lhe daria seu 20º título de Grand Slam, o que por fim o conduziria a um empate com Federer e Nadal.

Também manteria viva sua busca por fazer o Grand Slam, ganhando os quatro grandes torneios no mesmo ano, uma façanha que nenhum tenista consegue há 52 anos na categoria de simples masculina.

Ele está à beira de um momento histórico, o que cria um problema para seus numerosos detratores: ignorar e apequenar sua marcha histórica rumo aos recordes ou enfim reconhecer os méritos do aguerrido e eficiente tenista sérvio?

Eis alguns motivos para que aqueles que odeiam Djokovic, ou não se deixam impressionar por sua ascensão, reconsiderem.

Sua abordagem minimalista redefine o significado de “maestria” no tênis

Em um esporte muito preocupado com a estética, que vive de pontos inspiradores e do movimento bailarino de seus praticantes mais notáveis, a abordagem enxuta de Djokovic é tão divisiva quando os blocos de cor de Mark Rothko.

Federer tem a graça de uma pintura de Rembrandt: os “swings” barrocos, a abordagem graciosamente artística. As bolas rasteiras e o jogo físico de Nadal fazem lembrar um boxeador peso pesado dotado de um gancho de esquerda irresistível.

Mas o jogo de Djokovic tem sua beleza; nenhum dos grandes jogadores foi tão flexível, e tão capaz, em qualquer piso, de se retorcer e revirar em uma corrida defensiva alucinada que se transforma em ataque repentino. Mais do que talvez qualquer outro atleta na história do tênis, Djokovic refinou os fundamentos do esporte: preparação, balanço, transferência de peso, trabalho de pés.

Sua abordagem é minimalista, seca, e não é influenciada por uma necessidade de exibir talento. Será que isso basta para criar uma estética que capture o olhar? Pode apostar que sim.

Djokovic se joga para alcançar uma bola na quadra de grama, observado pelo público
Novak Djokovic em ação na quadra central de Wimbledon na edição de 2019 - Carl Recine - 12.jul.19/Reuters

Ele não é um robô, ele é Houdini

O número de insultos a Djokovic na internet é grande demais para contar. Dizem que ele é uma máquina. Um robô. Ou a parede de squash mais cara do planeta.

Bobagem.

Sim, ele vence... e vence, e vence. Nos últimos 10 anos, ninguém venceu mais no tênis. Mas não há nada de previsível na forma pela qual Djokovic conquista suas vitórias. Há demolições escancaradas e percussivas –momentos fugazes de brilho que combinam força, defesa e agilidade–, como sua vitória sobre Nadal por 3 sets a 0 na final do Australian Open de 2019.

Também há exemplos vívidos de garra, persistência e resistência. Seu título mais recente em Roland Garros mostrou tudo isso. Mas recorde, também, a maratona de cinco sets e seis horas de duração contra Nadal na final do Australian Open de 2012. E a virada, depois de reverter dois match points para o adversário, que lhe valeu o título de Wimbledon em uma final épica contra Federer em 2019.

Se você acredita que um talento imenso para escapadas parecidas com as de Houdini é entediante, bem, talvez não haja coisa alguma que eu possa escrever para convencê-lo do contrário.

As falhas de Djokovic o redimem

Sim, ele às vezes estoura, quebrando raquetes, latindo como uma criança petulante contra si mesmo, seus treinadores, árbitros e colegas. No episódio temperamental mais incômodo de sua carreira, no US Open em 2020, ele disparou uma bola com raiva e atingiu uma fiscal de linha, o que levou à sua exclusão do torneio.

Em um de seus momentos mais insensatos, ele tentou realizar torneios na Sérvia e na Croácia no ano passado em meio a um dos piores períodos da pandemia. Os torneios foram cancelados depois que ele e outros jogadores importantes foram contagiados pelo coronavírus.

Djokovic provou ser muito humano de todas as maneiras –as melhores, as piores e as que envolvem os momentos de busca mais intensa. A despeito dos numerosos vídeos que o mostram tendo ataques de raiva na quadra ou cometendo deslizes fora dela –como em abril, quando ele declarou que a vacinação contra o coronavírus não deveria ser obrigatória no circuito—, sua jornada sempre aconteceu aos olhos do público.

Suas falhas, e a abertura com que ele revela sua vida interior, o tornam mais interessante do que seus colegas, quase perfeitos e muito mais contidos.

Sem Djokovic, o tênis seria um duopólio monótono

Por anos, o tênis masculino parecia definido por uma única rivalidade: Federer versus Nadal, dois grandes campeões, dois estilos contrastantes.

A conexão duradoura entre eles veio a definir aquela era do esporte. Mas Djokovic conquistou seu espaço, abrindo caminho à força. Ele é a terceira roda, diferente de Federer e Nadal de quase todas as maneiras, inclusive o fato de não vir de um país próspero como a Suíça e a Espanha, mas de um país no leste da Europa que muitos fãs do tênis nem conseguiriam encontrar no mapa.

Para aqueles que o odeiam, essa é uma pílula amarga, que eles precisam engolir com frequência.

Se um Federer descansado for capaz de reviver sua velha magia na quadra de grama, talvez vejamos a disputa de título com que todo mundo sonha: uma revanche da empolgante final de 2019 no All England Club.

Djokovic estará em uma posição que conhece bem, diante de uma torcida ruidosa e interessada tanto em ver a vitória de Federer quanto em testemunhar a derrota do sérvio.

Se a história recente se confirmar, Djokovic voltará a erguer o troféu, em mais uma prova de que aqueles que se recusam a admirar um dos mais empolgantes campeões de qualquer esporte estão errados.

Wimbledon diminuído? Na verdade não.

Tradução de Paulo Migliacci

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