Descrição de chapéu Tóquio 2020

Às vésperas da abertura, ativistas ainda buscam cancelamento da Olimpíada

Advogado japonês e professor americano capitalizam raiva crescente da população local contra evento esportivo

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Tóquio

Separados por 7.800 km, o professor Jules Boykoff e o advogado Kenji Utsunomiya partilham o mesmo objetivo: parar a Olimpíada. Pouco importa que a abertura oficial dos Jogos esteja marcada para esta sexta-feira (23) e a primeira competição aconteça antes disso, na terça (20, quarta-feira em Tóquio).

“Temos de questionar tudo: o desperdício de recursos, o problema da saúde pública e os japoneses que não estão sendo vacinados enquanto atletas estrangeiros estão”, afirma Utsunomiya, 74, candidato derrotado ao governo da capital nas últimas eleições e ex-presidente da Associação de Bares do Japão.

De seu escritório no centro da cidade ele comanda a campanha “Cancele a Olimpíada de Tóquio para proteger nossas vidas”, cujo abaixo-assinado já havia recebido 456.478 assinaturas até domingo (18).

Utsunomiya capitaliza a raiva crescente da população contra o evento esportivo. Pesquisa de opinião realizada em maio pelo Asahi Shimbun aponta que cerca de 80% dos japoneses desejam que o evento, programado para acontecer inicialmente em julho de 2020, seja cancelado ou adiado por mais um ano.

Pessoa ao lado de placa com pedido de cancelamento da Olimpíada
Pessoas pedem cancelamento da Olimpíada de Tóquio durante visita do presidente do COI, Thomas Bach, a Hiroshima - Kai Pfaffenbach-16.jul.2021/Reuters

“A decisão do governo de insistir com os Jogos desafia a lógica e desperdiça todo o esforço já feito pela população para conter a pandemia”, afirma o advogado, que iniciou a campanha no ano passado, mesma época em que o americano Boykoff, professor de política na Universidade Pacific, no estado do Oregon, escreveu artigos pedindo o cancelamento da Olimpíada.

Mesmo agora, às vésperas do início do evento, ele segue com a postura, já que o "COI [Comitê Olímpico Internacional] deseja apostar com as vidas dos atletas e da população japonesa". “Se começarmos a ver um aumento exponencial nos casos, a decisão mais responsável seria cancelar. A Olimpíada é opcional, na verdade. Não é um serviço essencial para a humanidade”, defende o professor, um ex-jogador de futebol da seleção olímpica dos EUA que, em seu primeiro jogo, marcou Cafu em amistoso contra o Brasil.

Boykoff e Utsunomiya promoveram um encontro virtual no último dia 21 para discutir a realização dos Jogos e em que situação eles poderiam ser cancelados. Segundo a Universidade Johns Hopkins, 3.065 novos casos de Covid foram registrados no Japão no domingo (18) —há um mês, eram 1.636 infecções em 24 horas.

Ainda que o professor e o advogado sejam as faces mais visíveis e barulhentas da oposição à Olimpíada, eles não são os únicos. No mês passado, o sindicato de médicos, liderado pela Associação Médica de Tóquio, divulgou um documento pedindo que o governo do país considerasse a possibilidade de cancelar.

“Há um claro sinal de aumento de casos na capital. O sistema de saúde será colocado sob um estresse muito grande. Não podemos esperar que a população aceite restrições de movimento em um evento que vai receber milhares de pessoas do exterior”, queixava-se Haruo Ozaki, presidente da Associação Médica de Tóquio. Duas semanas depois, o comitê organizador anunciou que as competições não teriam público.

Ativistas como Boykoff e Utsunomiya dizem que fazer a Olimpíada com ou sem espectadores não faz diferença nenhuma para o COI, já que a entidade vai receber o dinheiro dos direitos de transmissão de TV de qualquer maneira. O maior perdedor é o comitê organizador e as cidades que vão receber as competições. Elas deixarão de faturar US$ 800 milhões (cerca de R$ 4,2 bilhões) na venda de ingressos.

Na última quinta (15), o presidente do COI, Thomas Bach, defendeu que o risco de a Olimpíada espalhar casos de Covid-19 pelo Japão é “zero”. Boykoff, que afirma não escutar o que o comitê olímpico diz sobre coronavírus, discorda. "Na vida, você precisa saber abrir mão de algumas coisas em nome da vida das pessoas. Os Jogos são uma delas. Eu escuto o que os médicos e a comunidade científica dizem.”

Mas ele, Utsunomiya e outros ativistas sabem que, por contrato, a única entidade que tem a prerrogativa de adiar ou cancelar o evento é o COI, e não o governo japonês. “A lição que fica para outras cidades é perceber que o COI olha para si antes de tudo. Paris [sede em 2024], Los Angeles [2028] e Brisbane [possível escolhida para 2032] deveriam estar muito preocupadas com o que acontece em Tóquio.”

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