Descrição de chapéu Tóquio 2020

Judoca capixaba será porta-bandeira do Líbano na abertura dos Jogos

Nacif Elias iniciou carreira no Brasil, naturalizou-se libanês e carregou estandarte na Rio-2016

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Washington

O capixaba Nacif Elias chamou a atenção quando disputou o Grand Slam de judô de 2009 no Rio. Não apenas devido ao bom desempenho —ficou em segundo lugar na sua categoria— mas também pelo nome. “Representantes do Líbano me viram e falaram 'poxa, esse cara deve ser libanês!'”, diz Elias.

Não era, mas virou. Naturalizado, o judoca é um dos seis integrantes da delegação do Líbano nas Olimpíadas de Tóquio e uma das apostas do país para garimpar o ouro. Ele será o porta-bandeira da seleção libanesa na cerimônia de abertura que acontece nesta sexta-feira (23), carregando o estandarte do cedro.

 Nacif Elias, do Líbano, durante luta com o argentino Emmanuel Lucenti na Rio-2016
Nacif Elias, do Líbano, durante luta com o argentino Emmanuel Lucenti na Rio-2016 - Jack Guez - 9.ago.2016/AFP

Elias nasceu em Vitória em uma família de origem libanesa. Seus bisavós tinham migrado daquele país havia tanto tempo que o judoca não sabe dizer de que cidade vieram nem quando. A imigração em massa de sírios e libaneses para o Brasil foi particularmente intensa de 1870 a 1930, quando pessoas como os antepassados de Elias buscavam melhores condições de vida.

O atleta fez carreira no seu Brasil natal. “Fiz parte da seleção desde o infantil e passei por todas as categorias”, diz em uma ligação de vídeo, dentro de seu alojamento no Japão. Com um jeitão informal, visivelmente entusiasmado com o campeonato, ele não veste camiseta durante toda a entrevista.

Elias conta que, depois de ter sido identificado como descendente do país árabe, foi convidado para representar o Líbano em competições internacionais. Começou nos Jogos da Francofonia de 2009, em que conseguiu a medalha de prata. “Fui recebido como herói no Líbano. É um povo bastante receptivo que me fez sentir em casa."

O atleta atuou pelo país em diversos torneios que, sem ligação com a federação, não exigiam que o judoca tivesse a nacionalidade para vestir o quimono. Em 2013, no entanto, recebeu um convite para se naturalizar e participar de todas as competições, inclusive as Olimpíadas.

“Ofereceram-me salário, viagens e treinamento”, diz. Ele explica que o judô libanês é menos competitivo do que o brasileiro e, assim, oferece mais oportunidades para um atleta se destacar entre os seus colegas.

O judoca elenca suas medalhas enquanto fala com a reportagem, na madrugada japonesa. Ganhou ouro nos Jogos da Francofonia de 2013, prata nos Jogos Asiáticos de 2014 e bronze no Grand Prix de Cancún de 2018, entre outras condecorações. Foi eleito o melhor atleta libanês em dois anos diferentes e também considerado o melhor judoca da história do país.

Esta é a sua segunda passagem pelas Olimpíadas. Em 2016, lutou pelo Líbano e carregou a bandeira do país na abertura, como fará novamente neste ano. Foi eliminado, porém, pelo argentino Emmanuel Lucenti. Àquela ocasião, discursou revoltado contra o resultado. Depois, voltou ao tatame e pediu desculpas. Desta vez, diz, espera realizar o sonho da medalha olímpica.

A vitória chegaria em boa hora para o Líbano. O país não conquista nenhuma medalha desde o bronze de Hassan Bishara em 1980 na luta greco-romana. Além de Elias, a outra aposta libanesa em Tóquio é a atiradora Ray Bassil, que será porta-bandeira ao lado do judoca.

Nacif Elias carregou a bandeira do Líbano na cerimônia de abertura dos Jogos do Rio
Nacif Elias carregou a bandeira do Líbano na cerimônia de abertura dos Jogos do Rio - Kai Pfaffenbach - 5.ago.2016/Reuters

Um ouro no judô seria um alento para um país que vive uma das piores crises de sua história. O colapso econômico fez a moeda nacional perder 90% de seu valor em relação ao dólar em dois anos. Metade da população do Líbano vive abaixo da linha da pobreza. “Minha intenção é ajudar o povo libanês, que vive um momento difícil”, diz Elias sobre sua performance nos tatames.

Mas o judoca vive também suas próprias lutas. O judô libanês tem poucos recursos, ainda mais nas atuais circunstâncias, com a pandemia. Depois de meses sem salário, chegou a buscar empregos paralelos e fez uma vaquinha online para se financiar. Cogitou, inclusive, deixar o esporte.

Depois das Olimpíadas, quer concluir a faculdade em gestão pública, melhorar o inglês e –quiçá– aprender o árabe, que ainda não fala, apesar da naturalização. “A rotina de atleta de alto rendimento é complicada, então não consegui estudar muito a língua.” Sabe alguns cumprimentos. Conhece também palavras como “habibi”, que quer dizer “querido”. Justamente como ele diz se sentir no Líbano. “Eles fazem eu me sentir amado, querido, e querer continuar a luta.”

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