Descrição de chapéu Tóquio 2020 Judô

Preparação de 5 anos para as Olimpíadas acaba em luta de 14 segundos para judoca do Maláui

Harriet Bonface perdeu para brasileira na estreia e é imagem de que chegar aos Jogos já é vitória

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Tóquio

Harriet Bonface, 28, não estava com a expressão abatida e nem falava com tristeza. Ainda vestida com seu quimono azul que não tinha a sigla de Maláui às costas, ela demorou mais do que o esperado para passar pela zona mista, a área de entrevistas após as lutas onde ficam os jornalistas.

A africana carrega a imagem de que o ato de chegar às Olimpíadas é uma vitória por si só. Ela fez a primeira luta do dia inaugural do judô. Perdeu para a brasileira Gabriela Chibana. Seu ciclo olímpico de cinco anos de treinamentos acabou em 14 segundos.

Gabriela Chibana (de branco) levou 14 segundos para vencer Harriet Bonface, do Maláui
Gabriela Chibana (de branco) levou 14 segundos para vencer Harriet Bonface, do Maláui - Jack Guez/AFP

Foi o tempo em que levou um ippon, o golpe decisivo da modalidade.

“Eu estava preparada e concentrada, mas ela [Gabriela] me surpreendeu. São coisas que acontecem, nem sei o que dizer. Você se prepara tanto, atravessa o mundo para chegar aqui e lutar por apenas alguns segundos. Mas eu estou orgulhosa de ter chegado até este momento para representar o meu país”, disse ela antes de ir embora do Nippon Budokan.

Como a política do COI (Comitê Olímpico Internacional) e do governo japonês é despachar os atletas para seus países de origem assim que acabarem suas participações olímpicas, Harriet deve embarcar já neste domingo (25) ou segunda-feira (26) de volta para casa.

Esportes de combate, que são eliminatórios, oferecem um dos aspectos mais cruéis dos Jogos. Uma longa preparação pode ir para o lixo em um piscar de olhos.

“Se você está em um esporte como o judô, sabe que algo assim pode acontecer. Prepara-se para que não ocorra, mas pode enfrentar um adversário mais forte e perder. As Olimpíadas são diferentes. Poder dizer que é um atleta olímpico é um orgulho por si só”, diz o guatemalteco José Ramos, derrotado na estreia pelo ucraniano Artem Leziuk após 2 minutos e 28 segundos, tempo suficiente para sofrer dois waza-ari.

Ou como definiu o brasileiro Eric Takabatake, eliminado na segunda rodada pelo coreano Won Jin Kim, as Olimpíadas podem ser encaradas como um sonho, um parque de diversões para os atletas. Essa expressão é válida especialmente para Harriet, que enfrentou resistência para praticar judô em um país no qual esportes de luta são quase sempre masculinos.

“O que vou levar foi toda a experiência. Não é apenas a luta. Os dias que passei na Vila Olímpica, o clima do evento... Isso tudo não vou esquecer. Queria ter lutado mais tempo, mas não foi possível”, completa a judoca.

 Eric Takabatake perdeu na segunda rodada e foi eliminado da disputa por medalha no judô
Eric Takabatake perdeu na segunda rodada e foi eliminado da disputa por medalha no judô - Hannah Mckay/Reuters

Ela se classificou para os Jogos apesar de ter perdido as qualificatórias e ter competido pouco nos últimos dois anos. A atleta não conseguiu viajar por causa de problemas de visto e pela pandemia. Classificou-se para ir ao Japão por causa da quota reservada pelo COI para incentivar países a desenvolverem seus esportes.

Com cinco irmãos, foi criada pelos avós, pois seus pais não teriam como alimentar todos os filhos. Antes de embarcar, Harriet deu entrevistas à imprensa de Maláuiafirmando que seria a primeira atleta do judô africano a conquistar uma medalha de ouro. Uma promessa difícil de ser cumprida. E não foi.

“Quero voltar. Posso tentar de novo”, sugeriu, antes de ir embora.

Ela pode usar o exemplo da israelense Shira Rishony, 30. Sua estreia olímpica aconteceu na Rio-2016 e durou poucos segundos. Foi desqualificada por ter usado o cotovelo de forma ilegal na ucraniana Maryna Cherniak e deixou o tatame chorando copiosamente. Disse não ter entendido a eliminação e que aquela tinha sido uma experiência traumática.

Classificada para Tóquio-2020, ela venceu seus dois primeiros combates, antes de perder para Urantsetseg Munkhbat, da Mongólia. O resultado aconteceu nas quartas de final e isso lhe dá a chance de disputar, na manhã deste sábado (24), a medalha de bronze.

“Você coloca sua vida para chegar até aqui. Dói. Caramba, como dói”, disse Gabriela Chibana, a brasileira que derrotou Harriet, às lágrimas, após perder o segundo combate e ser eliminada.

Participações curtas são fatos da vida nas Olimpíadas, o que não elimina o aspecto humano de treinar por quatro anos (cinco, no caso de Tóquio) por causa de um sonho.

“Em um combate, se você não derrota o seu oponente quando tem chance, vai se arrepender. Foi o que aconteceu”, resumiu a italiana Francesca Milani para a imprensa do seu país. Ela caiu na primeira luta diante de Chen-Hao Lin, de Taipei, após 3 minutos e 44 segundos.

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