Descrição de chapéu
Tóquio 2020

Transmissão da Globo de cerimônia olímpica se dividiu entre merchan e geopolítica

'Os chinelos que fazem sucesso no mundo inteiro estão marcando presença', disse Galvão Bueno

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São Paulo

Como cobertura de esporte não é mais jornalismo na Rede Globo, uma das primeiras cenas da transmissão da cerimônia de abertura dos Jogos de Tóquio foi a de Galvão Bueno numa ação de merchandising de patrocinador, o que antes seria vetado.

Sem público no estádio e com menos aglomeração no palco-gramado, as cerca de quatro horas se concentraram na voz do locutor histórico de futebol e F-1, a partir de um estúdio no Brasil –erguido para dar a sensação de estar no Japão, com imagens da cidade nas paredes ao fundo.

Galvão, que já havia narrado a vitória do Brasil sobre a Alemanha no futebol diante de televisores, no dia anterior, falou sem parar.

A abertura foi "uma cerimônia voltada para a TV", como reconheceu desde logo, respeitando-se assim "o compromisso com televisões do mundo inteiro", Globo inclusive.

Anunciou os "Jogos da esperança", da superação, dizendo que só o esporte para unir o mundo num momento difícil, de pandemia.

Mas o que se seguiu foi mais conflituoso do que prometia, na locução e nos diálogos com o repórter Marcos Uchôa e comentaristas, estes pouco mais que figurantes.

Ao ouvir elogios às bandeiras do Japão, para começar, Galvão fez uma intervenção para enfatizar que uma delas, com os raios de Sol, remete ao imperialismo japonês –isso, no momento em que o representante das Forças Armadas fazia o hasteamento oficial.

Posteriormente, já no desfile das delegações, não faltaram críticas editorializadas a Cuba, pelo "sistema", e à Argélia, pelo "radicalismo" de não aceitar competir com Israel.

Mais longamente, narrador e colegas se estenderam sobre o conflito na Ásia, questionando a China e chegando perto de defender o "boicote" dos Jogos de Inverno de 2022, mas sobretudo o Japão, pelas atrocidades do domínio de décadas sobre Coreia e a mesma China.

Sobraram sustos, como afirmar que "passado é passado", no caso do militarismo do Japão, ou que as bombas atômicas americanas, que apagaram as populações de Hiroshima e Nagasaki, foram "aprendizado" para os japoneses.

Soaram bem melhor, Galvão, Uchôa e comentaristas, ao especular quantas medalhas a delegação brasileira vai alcançar nas Olimpíadas, com o narrador arriscando mais do que todos, 23. "Sou um otimista por natureza."

Delegação brasileira entrou de chinelos no Estádio Nacional de Tóquio
Delegação brasileira entrou de chinelos no Estádio Nacional de Tóquio - Odd Andersen/AFP

Soou também melhor a propaganda aberta, sem travas, descarada, na passagem da delegação brasileira durante o desfile. Galvão:

"Sabe qual é o uniforme oficial? Repare ali. Uma coisa brasileira. Preste atenção nos pés dos atletas. Os chinelos que fazem sucesso no mundo inteiro estão marcando presença na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos. Muito legal. Bem brasileiro. Bem bacana. Deu para ver ali."

Na verdade, mal deu para ver as Havaianas. Não se viu, por exemplo, que os porta-bandeiras, pagos ou não para isso, ensaiaram passos de samba.

Foi então que apareceu a "câmera exclusiva da Globo" –que a própria transmissão havia anunciado que não haveria. Do locutor, cortando comentarista para trazer o merchan às pressas:

"Vamos ver se teve o passinho de samba? Ah lá! Os dois. Cá para nós, ela bem melhor do que ele. A porta-bandeira, 10. O mestre sala, 9,9." (risos falsos)

Galvão tratou de elogiar ainda o Comitê Olímpico Brasileiro, que optou por um número reduzido de atletas no desfile, por segurança.

No final: "Bem, amigos da Rede Globo... As palavras faltam um pouco, porque eu estou emocionado".

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